sábado, 4 de março de 2023

Ferreira Pena, a rua do Conselheiro

Rua Ferreira Pena. Foto: Google Maps.

Na primeira semana de fevereiro fui instado pela produtora cultural Loren Lunière para fazer um levantamento histórico sobre a rua Ferreira Pena, onde será realizado um animado bloco de Carnaval. Com este singelo trabalho buscou-se dar maior relevância cultural às festividades momescas, mostrando como diversão e conhecimento podem andar de mãos dadas.

A rua Ferreira Pena tem início na rua 10 de Julho, atravessando a rua Monsenhor Coutinho, avenida Ramos Ferreira, rua Simon Bolívar, avenida Leonardo Malcher, rua Silva Ramos, rua Tarumã, avenida Japurá, alameda Hortência, rua Barcelos e avenida Ayrão, e termina na avenida Álvaro Maia (Boulevard). No passado, quando a Geografia da cidade era bastante peculiar e com limites bem diferentes dos atuais, a rua Ferreira Pena fazia parte do antigo bairro da Campina. Analisando algumas plantas da cidade chegou-se a conclusão de que sua abertura se deu por volta de 1890.

Quem foi Ferreira Pena? O Conselheiro Herculano Ferreira Pena nasceu em 14 de janeiro de 1811 na cidade de Diamantina, na Província de Minas Gerais, e faleceu em 27 de maio de 1867 no Rio de Janeiro. De acordo com o historiador amazonense Agnello Bittencourt, em seu Dicionário Amazonense de Biografias: Vultos do Passado (1973), pouco se sabe sobre seus primeiros anos de vida. Entre 1830 e 1832 foi Professor de Primeiras Letras na Escola Modelo de Ouro Preto. Junto à carreira docente, trabalhou em periódicos mineiros, como O Novo Argos, onde atuou de 1829 a 1834. Foi nomeado Secretário-Geral da Província de Minas Gerais pelo presidente Manuel Ignácio de Mello e Souza.

Em 1842 foi nomeado Presidente da Província de Minas Gerais. Posteriormente presidiu as províncias do Espírito Santo (1845-1846), Pará (1846-1847 e 1847-1848), Pernambuco (1848), Maranhão (1849), Amazonas (1853-1855), Minas Gerais (1856-1857), Bahia (1859-1860) e Mato Grosso (1862-1863). O Imperador o nomeou Senador pela Província do Amazonas, cargo que desempenhou entre 1855-1856, 1857-1860, 1861-1863, 1864-1866 e 1867-1867. Fez parte do Conselho de Sua Majestade. De acordo com os pesquisadores Vera Lúcia Nogueira e Dalvit Greiner de Paula, autores do artigo De professor público a Presidente de Província: anotações sobre a trajetória política de Herculano Ferreira Pena (1811-1867) (2017), ele foi o político que mais vezes foi nomeado para presidir províncias no Império.

Foi sócio efetivo da Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional, do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) e membro da diretoria do Banco do Brasil. Por sua atuação como destacado político, foi fidalgo da Casa Imperial e dignitário da Ordem da Rosa. Foi casado com Francisca de Paula Freire de Andrade. Da união nasceram Isabel Herculana Ferreira Pena, Herculano Carlos Ferreira Pena, Herculano Velloso Ferreira Pena e Carlos Amazonio Ferreira Pena. Faleceu no Rio de Janeiro em 27 de maio de 1867, aos 56 anos.

Herculano Ferreira Pena (1811-1867). Foto: Acervo do IHGB.

O médico e historiador brasileiro Augusto Victorino Alves Sacramento Blake, no monumental Dicionário Bibliográfico Brasileiro (1970), registra que Ferreira Penna produziu os seguintes discursos e relatórios: Discussão do voto de graças, discurso lido na Câmara dos Deputados no Rio de Janeiro em 23 de janeiro de 1850; Fala dirigida à Assembleia Legislativa Provincial do Amazonas no dia 1° de outubro de 1853; e Exploração dos afluentes do Amazonas, de 1855, disponível na Biblioteca Nacional.

Na Ferreira Pena estão localizados alguns prédios de interesse histórico. O primeiro é o Palacete Mourisco, na esquina com a rua Simon Bolívar. Datado de 1908, foi construído em estilo mourisco para ser residência do empresário, engenheiro e arquiteto paraense Carlos de Castro Figueiredo (1865-1927), Gerente e sócio majoritário do antigo Banco Amazonense. Nele também residiu o teatrólogo e escritor paraense Benjamin Lima (1885-1948). O prédio funcionou, posteriormente, como sede de audiências do Juizado Federal do Amazonas; Departamento de Educação e Cultura; Gabinete do Vice-Governador; Reitoria da Universidade do Amazonas, atual UFAM; Secretaria de Estado de Segurança Pública; e, entre 1999 e 2008, Escola Superior de Magistratura do Amazonas (ESMAM). Atualmente pertence à Secretaria de Estado de Cultura, estando sem uso.

Na esquina com a avenida Ramos Ferreira fica o Palacete Afonso de Carvalho, construído entre 1907 e 1908 para ser residência do Coronel da Guarda Nacional Raimundo Afonso de Carvalho, que assumiu o Governo do Estado quando da renúncia de Constantino Nery em 1907. Nele foi instalado, em 1922, a Casa Doutor Fajardo, hospital infantil. O nome é uma homenagem ao médico fluminense Francisco de Paula Fajardo Júnior (1864-1906). Posteriormente funcionou como Faculdade de Engenharia da antiga Universidade do Amazonas, Junta de Alistamento Militar e escritório.

Palacete Mourisco da Praça da Saudade. Foto: Hyago Sena.

Nas proximidades da avenida Ramos Ferreira ergue-se majestoso o casarão da tradicional família Benzecry. Trata-se de um bungalow em estilo missão californiana, construído na primeira metade da década de 1940 por Joaquim José da Cunha para ser residência do Comendador Isaac Jacob Benzecry, um dos empresários mais prósperos da Manaus na época. A família Benzecry residiu nele até a década de 1990. Posteriormente funcionaram em suas dependências a Aliança Francesa, o Consulado da Venezuela, Conselho Tutelar e a Defensoria Pública da União. Ao lado dela fica o Bororó Bar, instalado em um belo solar do início de 1900 construído pela família Câmara.

Perto do prédio da Santa Casa de Misericórdia, na esquina com a rua 10 de Julho, está o antigo Museu Fernando Ferreira da Cruz, instalado em um prédio centenário e dedicado à preservação e divulgação da História do Hospital da Sociedade Beneficente Portuguesa do Amazonas. Foi inaugurado em 31 de outubro de 1997 com o nome Fernando Ferreira da Cruz (1909-1997), antigo sócio da instituição. Na esquina com a rua Monsenhor Coutinho encontra-se o casarão da família Nasser, de origem árabe. Foi construído no início do século XX, tendo funcionado no passado como Consulado do Japão.

Longe dali, no trecho mais “novo” da rua e representando o processo de verticalização do Centro da cidade na década de 1980, situa-se o Edifício São João Del Rey, condomínio de alto padrão construído entre 1987 e 1989 pela conceituada Construtora Rayol Ltda. Na esquina com a Avenida Álvaro Maia fica o deteriorado prédio do antigo Cine Palace, em atividade entre 1965 e 1973. Além dessas construções, ao longo da via encontram-se outras dezenas de casarões e palacetes.

Nos últimos anos a rua vem ganhando novos ares com a abertura de empreendimentos como clínicas, restaurantes e, principalmente, bares, instalados em charmosos prédios de época restaurados e bem cuidados, como é o caso do Jápeto Bar e Restaurante e do Bororó Bar – casa de gente Feliz. Que nesse Carnaval os foliões que passarem pela Ferreira Pena se atentem à grandeza dessa artéria.