Amazonas, 1917. O Estado, desde 1912, vinha enfrentando uma de suas piores crises econômicas, ocasionada pela perda do monopólio da borracha. Periodicamente a Associação Comercial do Amazonas (ACA) anunciava a desvalorização do produto regional frente a gigantesca e barata produção asiática. Foi em meio a esse cenário caótico que surgiu em Manaus, no dia 25 de março de 1917, o Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA). Era uma ideia antiga que ganhou forma física naquele ano após algumas reuniões.
Essa, que é uma das instituições culturais mais antigas do Amazonas, criada depois da Universidade Livre de Manáos (1909) e antes da Academia Amazonas de Letras (1918), foi fruto da iniciativa de três renomados intelectuais interessados na produção científica e na preservação de documentos históricos e do patrimônio arqueológico da região: o arqueólogo e numismata Bernardo de Azevedo da Silva Ramos (1858-1931); o geógrafo e historiador Agnello Bittencourt (1876-1975); e o médico, advogado e jornalista Vivaldo Palma Lima (1877-1949). Bernardo Ramos foi seu primeiro Presidente e Agnello Bittencourt e Vivaldo Lima, respectivamente, 1° e 2° Secretários.
A fundação ocorreu no Conselho Municipal de Manaus, sendo a instalação solene realizada em 18 de maio daquele ano. Seus estatutos foram aprovados através do Decreto N° 1.190, de 11 de abril de 1917 e, no dia 18, novo decreto, de N° 1.191, garantiu à organização uma sede própria, concedida pelo Governo do Estado, administrado pelo Dr. Pedro de Alcântara Bacellar, localizada nos prédios n° 19 e 21, entre as ruas de São Vicente – que posteriormente viria a ser conhecida como Rua Bernardo Ramos – e Frei José dos Inocentes. Mesmo em meio às dificuldades financeiras, Bacellar, médico e homem culto, sensibilizado com a determinação do grupo, conseguiu dar o suporte necessário para que o instituto desse seus primeiros passos. Em 10 de julho de 1918, o Governador registrou que "Esta respeitavel Associação scientifica, creada sob os auspicios do Governo do Estado, está definitivamente installada á rua de São Vicente, d'esta cidade, em proprio estadoal" (MENSAGEM DO GOVERNO DO ESTADO DO AMAZONAS, 10/07/1918, p. 88).
Os membros fundadores, sem condições de reformar o prédio concedido, que estava em ruínas, solicitaram ao Governador que fossem feitas reformas e adaptações. Feitos os reparos e mudanças necessárias, recebeu, após proposta dos deputados Adriano Jorge, Jonathas Pedrosa Filho e Coronel Raymundo Neves, a Coleção de Numismática do Amazonas, comprada de Bernardo Ramos pelo Governo do Estado em 1899. Foi, de proposta do Governador Bacellar, que fosse concedido um auxílio financeiro anual para o custeio de pesquisas, manutenção do prédio e publicação de trabalhos (MENSAGEM DO GOVERNO DO ESTADO DO AMAZONAS, 10/08/1918, p. 89). O primeiro número da Revista do IGHA (RIGHA) foi publicado em junho de 1917.
Além de Bernardo Ramos, Agnello Bittencourt e Vivaldo Lima, o instituto contava com outros membros de peso, como o jornalista João Batista de Faria e Souza, exímio pesquisador de nossa História; o médico e escritor Adriano Jorge; o médico e ex-Prefeito da cidade, Jorge de Moraes; o Professor Paulo Eleuthério; o Professor Plácido Serrano Pinto de Andrade; o Comendador Cláudio Mesquita e outros nomes com larga produção intelectual. Parte deles, mais tarde, além da Casa de Bernardo Ramos, passou a fazer parte da Academia Amazonense de Letras. O IGHA, assim como os demais institutos, tinha como molde o IHGB, fundado em 1838 no Rio de Janeiro. Era uma academia ilustrada formada por membros que faziam parte das elites política e intelectual do Amazonas. Ao todo, estima-se em 98 o número de membros fundadores (REVISTA DO IGHA, jan. fev. mar. de 2015).
Ainda em 1917, no mês de julho, novo projeto cedeu ao instituto um belíssimo quadro do Imperador Dom Pedro II localizado na sala de sessões do Conselho Municipal de Manaus. A obra foi alocada no Salão Nobre do IGHA, que recebeu o nome do monarca do antigo Império Brasileiro. O ano de 1917 se encerraria com a visita do renomado historiador paranaense José Francisco da Rocha Pombo (1857-1933), membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, “pai” dos institutos brasileiros. Rocha Pombo chegou em Manaus em 6 de novembro. Estava em viagem pelos Estados brasileiros com o objetivo de fazer pesquisas nos arquivos das capitais, preparando-se para a produção de um livro sobre a História do Brasil que seria publicado em 1922, ano do centenário da Independência. Os membros do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas realizaram, em 12 de novembro, na Assembleia Legislativa do Estado, uma sessão solene em sua homenagem. O historiador ficou na cidade até o dia 15 de novembro, quando partiu para o Sul do país, levando consigo uma ótima impressão do órgão congênere amazonense e de seus membros.
Tempos difíceis, sem dúvidas, foram aqueles do final da década de 1910, marcados por endividamentos, fugas de capitais e empobrecimento. Foram esses tempos difíceis, no entanto, que moldaram na intelectualidade amazonense da época, guiada desde priscas eras por um sentimento de defesa dos interesses regionais, o desejo de erguer uma casa de cultura que congregasse conhecimentos geográficos, históricos e de áreas afins, garantindo a preservação, a pesquisa e a divulgação das grandezas do Amazonas, casa essa que, passados 104 anos, continua firme na defesa de seus ideais.
FONTES:
Mensagem lida perante a Assembléa Legislativa na abertura da Segunda Sessão Ordinaria da Nona Legislatura pelo Exm. Sr. Dr. Pedro de Alcantara Bacellar, Governador do Estado, a 10 de julho de 1918.
Revista do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), jan. fev. mar. de 2015.
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