Velhice. Um estágio, uma etapa. Não tem para onde "correr", ela sempre nos alcança. Não é um bicho de sete cabeças, mas sim uma primavera, como bem expressa a crônica da leitora e amiga Ellza Souza, que trata essa etapa da vida com muito humor e energia. Sobre a História da velhice, recomendo o livro História da Velhice no Ocidente, do historiador francês Georges Minois (edição em português, 1999). Leiam abaixo a crônica de Elza Souza.
Fazia tempo que meu aniversário não "caía" no domingo, um dia que adoro, que é azul, em que o mato é mais verde, em que o mundo é mais calmo. Agora que o Celdo me confirmou que na Amazônia tem sim primavera, posso me regozijar com as minhas também e distribuir com vocês para não ficar tão pesado esse buquê. Convenhamos que mesmo sendo primavera que implica em beleza e flores, que pesa, pesa.
Amanheci com a sensação do peso de tantas primaveras. Com a sensação de quem está mais pra lá do que pra cá. Lógico que é assim e tem que ser assim pois o tempo não para e precisamos subir aos céus para dar lugar a outros, quem sabe nós mesmos em outra configuração.
Ao chegar na 61ª. primavera da minha existência percebo com clareza o que chamam por aí de “melhor idade”. Apesar de estar apenas começando uma nova etapa de vida, todos já te olham como se estivesse no fim. E o pior como se não tivesse mais capacidade de pensar e de ser feliz. Claro que não me refiro aos parentes e amigos mas aos que correm por fora. No ônibus, por exemplo, quando precisamos correr com a carteirinha para provar o que está na cara e no corpo todo. É meus amigos, a pele afrouxa, o bucho cresce, o braço engrossa, as pestanas acho que já eram. O olhar perde a tonalidade, o viço. Aí lascou-se. Vai-se formando todo o jeitinho de uma simpática velhinha bondosa, mas gagá, segundo os “por fora” como disse antes.
As dificuldades são muitas e precisa de grande esforço para continuar. Ao fazer 50 anos escrevi por aí que nunca ia usar uma bata pois achava que era roupa de velha. Mas confesso que tenho reavaliado as ditas vestimentas. E estou olhando-as com outros olhos e dando preferência as de manga longa e gola role. Captou? Não que ache feia a velhice. Acho que existe beleza numas preguinhas bem feitas mas que pesa, pesa e vou me preparar para a minha primeira bata, que ninguém é eterno.
De tudo que vivi até aqui o melhor foi o amor que tenho pelos meus filhos, Suzana e Eduardo, o convívio com meus familiares e esses encontros que de vez quando fazemos com as pessoas que gostamos e admiramos. Vocês. Uns mais outros menos na “melhor idade” e como a melhor idade é a idade que cada um vive vamos mesmo é aproveitar momentos como esse e enriquecer a VIDA de boas histórias.
Desculpem a xaropada...mas é o que gosto de fazer: escrever. E na melhor idade ganhei o direito de fazer o que gosto nem que os que correm por fora achem que “velho não faz isso ou aquilo”. Não faz se não quiser, amigos. Vamos fazer: amor, amizade, solidariedade, bondade. Vamos dançar, rebolar, contar piada, rezar, conversar, ler, ouvir música. Pronto já nem estou sentindo mais o peso das 61 primaveras e sim estou envolvida na leveza das 16. Essa é a leveza que devemos preservar até a primeira bata.
Ellza Maria Pereira Souza é Jornalista formada pela UFAM (Universidade Federal do Amazonas), com vários cursos na área de produção de rádio, Televisão e roteiro para cinemas. É autora do livro São Raimundo: Do "alto" da minha colina - sem os bucheiros o bairro de São Raimundo perdeu o encantamento, publicado em 2008.
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