História, do pintor grego Nikolaos Gysis (1892).
Texto produzido a partir de reflexões feitas durante as aulas de História Medieval I, ministradas pelo professor Sínval Carlos Mello Gonçalves, na UFAM.
A História enquanto ciência, já sabemos, é dividida em períodos que facilitam tanto o trabalho de quem a produz quanto o de quem empreende seu estudo. Nós, ocidentais, a dividimos da seguinte forma: Primeiro, temos a pré-história, período anterior ao surgimento da escrita. Depois, a Antiguidade, que vai do surgimento da escrita em mais ou menos 3.500 a.C. à queda do Império Romano do Ocidente, em 476. Terminada a Antiguidade, o homem passa para a Idade Média, até 1453, quando a tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos é considerado o seu fim. De 1453 à 1789, vive-se na Idade Moderna. De 1789 aos dias de hoje, Idade Contemporânea.
O que determina quando inicia ou acaba um período histórico? Quando um ou mais profissionais da História nomeiam um período, deve-se levar em conta aspectos singulares, marcos significativos que irão diferenciar um período do outro. Em 1469, o bibliotecário do Vaticano e humanista, Giovanni Andrea, cunhou o termo Idade Média (medium aevum, media tempestas, mediae aetas), uma idade do médio, intervalo entre a Antiguidade Clássica, período de esplendor cultural para os humanistas, e a Idade Moderna, tempo em que viviam, marcado por inovações e revalorização da cultura greco-romana.
Algo que nos deixa pensativos, dependendo do nível de reflexão, é que as pessoas que viveram nesses determinados períodos não os nomeavam dessa forma, e até mesmo não sabiam ou percebiam as mudanças ocorridas em sua volta. Apenas lembrando uma fala do professor Sínval, "um homem que dormiu na noite derradeira de 476 e acordou em 477 não sabia que agora vivia na Idade Média". A percepção de passagem de tempo perpassa o campo histórico e adentra na psicologia e na neurociência. O professor de História da UFSM, em entrevista ao Infocampus, afirma que "tempo é um conceito polissêmico, ou seja, ele depende de uma série de definições. Desde Aristóteles, por exemplo, definia-se o tempo como uma espécie de medida do espaço, medida do movimento" (1).
Em um questionamento feito ao professor, perguntei se "um homem que nasceu na Inglaterra em 1750, perceberia, em 1800, que estava vivendo em uma nova época? nesse caso, a Segunda Revolução Industrial"? O professor exclamou que "a resposta para essa pergunta é difícil, e que nos tornamos, de certo modo, reféns de uma periodização".
De fato, nos tornamos reféns dessa periodização da História, pois muitas vezes ela, por sintetizar o período, sem perceber muitas vezes continuidades, mais atrapalha do que ajuda. Um exemplo dessa condição é a obra de Jeróme Baschet, A Civilização Feudal: Do ano mil à colonização da América. Nesse livro, Baschet nos apresenta sua visão de que a Idade Média possui uma longa duração, que sobreviveu por meio de uma visão de mundo, práticas e técnicas oriundas do medievo, deixando heranças até mesmo no México Colonial, por meio de instituições trazidas pelos colonizadores espanhóis, homens que viveram na Idade Média.
Devemos, claro, nos lembrar que as periodizações Idade Antiga, Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea são adotadas pelo Ocidente, com a cronologia delimitada em acontecimentos antes e depois de Cristo. Em outras regiões do mundo, a periodização e a cronologia vão variar bastante, como por exemplo nos países islâmicos, onde o tempo é contado a partir da fuga de Maomé de Meca para Medina, em 16 de julho de 622.
Talvez em 1453, durante a tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos, o marco de fim da Idade Média e início da Idade Moderna, um camponês do interior de Portugal ou da Espanha não tinha noção do que estava acontecendo, estando apenas preocupado com o próximo dia de trabalho, no qual teria que alcançar uma meta de produção. Acredito que as periodizações da História devam ser revistas, analisadas com mais critérios, ver onde existem continuidades de um período sobre o outro e achar novas alternativas para o ordenamento da ciência histórica. Basta nos lembrarmos, por exemplo, sobre as discussões feitas sobre a Idade Contemporânea (a comunidade acadêmica discute se já não estamos em um novo período).
Para concluir, uma observação de outro professor do Departamento de História/ICHL: "Temos que ter compromisso com as datas, mas nossa preocupação contemporânea não é dizer quando ocorreu e onde, mas sim analisar e problematizar os fatos e a sociedade" - Luis Balkar Sá Peixoto Pinheiro, professor de metodologia da História (22/06).
NOTAS:
(1) A percepção da passagem do tempo. Infocampus, UFSM (Universidade Federal de Santa Maria), 09 de dezembro de 2010. Endereço: http://w3.ufsm.br/infocampus/?p=3683
CRÉDITO DA IMAGEM:
commons.wikimedia.org
Em um questionamento feito ao professor, perguntei se "um homem que nasceu na Inglaterra em 1750, perceberia, em 1800, que estava vivendo em uma nova época? nesse caso, a Segunda Revolução Industrial"? O professor exclamou que "a resposta para essa pergunta é difícil, e que nos tornamos, de certo modo, reféns de uma periodização".
De fato, nos tornamos reféns dessa periodização da História, pois muitas vezes ela, por sintetizar o período, sem perceber muitas vezes continuidades, mais atrapalha do que ajuda. Um exemplo dessa condição é a obra de Jeróme Baschet, A Civilização Feudal: Do ano mil à colonização da América. Nesse livro, Baschet nos apresenta sua visão de que a Idade Média possui uma longa duração, que sobreviveu por meio de uma visão de mundo, práticas e técnicas oriundas do medievo, deixando heranças até mesmo no México Colonial, por meio de instituições trazidas pelos colonizadores espanhóis, homens que viveram na Idade Média.
Devemos, claro, nos lembrar que as periodizações Idade Antiga, Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea são adotadas pelo Ocidente, com a cronologia delimitada em acontecimentos antes e depois de Cristo. Em outras regiões do mundo, a periodização e a cronologia vão variar bastante, como por exemplo nos países islâmicos, onde o tempo é contado a partir da fuga de Maomé de Meca para Medina, em 16 de julho de 622.
Talvez em 1453, durante a tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos, o marco de fim da Idade Média e início da Idade Moderna, um camponês do interior de Portugal ou da Espanha não tinha noção do que estava acontecendo, estando apenas preocupado com o próximo dia de trabalho, no qual teria que alcançar uma meta de produção. Acredito que as periodizações da História devam ser revistas, analisadas com mais critérios, ver onde existem continuidades de um período sobre o outro e achar novas alternativas para o ordenamento da ciência histórica. Basta nos lembrarmos, por exemplo, sobre as discussões feitas sobre a Idade Contemporânea (a comunidade acadêmica discute se já não estamos em um novo período).
Para concluir, uma observação de outro professor do Departamento de História/ICHL: "Temos que ter compromisso com as datas, mas nossa preocupação contemporânea não é dizer quando ocorreu e onde, mas sim analisar e problematizar os fatos e a sociedade" - Luis Balkar Sá Peixoto Pinheiro, professor de metodologia da História (22/06).
NOTAS:
(1) A percepção da passagem do tempo. Infocampus, UFSM (Universidade Federal de Santa Maria), 09 de dezembro de 2010. Endereço: http://w3.ufsm.br/infocampus/?p=3683
CRÉDITO DA IMAGEM:
commons.wikimedia.org
Nenhum comentário:
Postar um comentário