Na galeria de homens ilustres do Amazonas, que contribuíram de diferentes formas para o seu engrandecimento, tornando-o reconhecido no Brasil e no mundo, figura em destaque Eduardo Gonçalves Ribeiro (1862-1900), personagem marcante na História do Estado no final do século XIX e que até hoje é lembrado pelo empenho que teve em transformar o Estado em um dos mais prósperos do país.
Eduardo Gonçalves Ribeiro (1862-1900) nasceu na cidade de São Luís, na Província do Maranhão, em 18 de setembro de 1862. De origem humilde, fez seus primeiros estudos no Liceu Maranhense, onde fez o curso de Humanidades. Em seu tempo de estudante dirigiu um jornal conhecido como O Pensador, apelido pelo qual ficaria conhecido. Após concluir o ensino secundário, sentou praça no Rio de Janeiro em 1881, na Escola Militar da Praia Vermelha. "Em 1884, Ribeiro foi promovido a alferes-aluno e, em 1886, a 2° tenente de artilharia, bacharelando-se em Matemática e Ciências Físicas e Naturais em janeiro de 1887" (MESQUITA, 2019, p. 24).
Posteriormente foi transferido para o Amazonas, onde exerceu, primeiramente, o cargo de secretário do Comando das Armas. Quando da nomeação da Junta Governativa do Amazonas, em 21 de novembro de 1889, foi nomeado Oficial de Gabinete. No Governo de Augusto Ximeno de Vilerroy, primeiro Governador do Amazonas, foi, além de Oficial de Gabinete, Diretor de Obras Públicas. Com a saída de Vilerroy em 1890, é nomeado Governador do Estado pelo Governo Central, assumindo em 02 de novembro. Essa primeira administração vai até 05 de maio de 1891. Era, até aquele momento, a pessoa mais jovem a governar o Amazonas, tendo apenas 28 anos. Era também o primeiro negro a assumir um cargo tão importante. Em pouco tempo, entre outras coisas, aumentou as rendas públicas, decretou uma constituição provisória e diminuiu pela metade a dívida pública.
O governo central destituiu Eduardo Ribeiro de seu cargo, nomeando para o governo o Coronel Gregório Thaumaturgo de Azevedo, antigo governador do Piauí entre 26/12/1889 e 04/06/1890, que naquele momento encontrava-se em Recife. A notícia da destituição de Eduardo Ribeiro não agradou a população: "O povo, convocado em boletim, reuniu-se à tarde, em frente ao palácio, não consentindo que Eduardo Ribeiro deixasse a governança. Aclamou-o entusiasticamente. Os oradores sucederam-se em vários pontos da cidade, protestando contra o ato dos altos poderes da República, lavrando-se uma ata (1884-1891), que foi assinada por centenas de pessoas de todas as classes sociais" (REIS, 1989, p. 249).
Após a destituição de Gregório Thaumaturgo de Azevedo, em 1892, seu segundo mandato como Governador foi de 1892 a 1896. Nesse período, considerado o melhor da História do Amazonas, aproveitando o aumento das rendas públicas, dotou o Estado e, principalmente, a capital, de moderna infraestrutura. Dentre outras coisas, foi responsável por:
"Nivelamento e embelezamento de dois terrenos na cidade de Manaus; Abertura e nivelamento dos bairros novos da Cachoeira Grande e Cachoeirinha; Pavimentação com paralelepípedo de granito das praças da República e da Constituição; Pavimentação a paralelepípedo das ruas da Instalação, Municipal e plataforma da Catedral; Pavimentação a pedra tosca de várias ruas adjacentes; Construção da avenida Eduardo Ribeiro; Construção do jardim da praça da República; Construção do jardim e gradeamento da Catedral; Levantamento da planta cadastral da cidade; Edifício do Diário Oficial e respectivo jornal; Edifício do Instituto Benjamin Constant para órfãs; Seis escolas públicas primárias em Manacapuru, Humaitá e Lábrea; Reorganização radical do ensino no Ginásio e Escola Normal; ereção não terminada do Instituto dos Educandos; Reorganização da Biblioteca Pública; Criação de um hospício para alienados - Hospício Eduardo Ribeiro - sob direção das irmãs de Santa Ana; Ereção não concluída do Palácio do Governo; Novo edifício do Quartel do Regimento Militar do Estado; Teatro Amazonas; Reservatório de água do Mocó; Contrato de navegação para o Mediterrâneo, com escalas; Distribuição das terras baldias do Estado para cultivo; Abertura da Estrada Manas - Campos Gerais do Rio Branco; Pontes de ferro da Cachoeirinha e Cachoeira Grande; Pontes romanas da rua Municipal; Ponte de madeira no bairro da Cachoeirinha; Fonte monumental da praça 15 de Novembro; Iluminação elétrica a arco voltaico, a primeira implantada no Brasil; Telégrafo subfluvial; Projeto do Código de Processo Criminal" (MONTEIRO, 1990, p. 96-97).
De acordo com o historiador Luiz de Miranda Corrêa (1935-2019), Eduardo Ribeiro foi o Governador certo no momento mais próspero do Estado - enriquecido pela exportação da borracha - pois "[...] tinha o élan necessário para realizar a transformação que sonhava. Dos problemas de educação aos de urbanismo e paisagismo, sua presença se fazia sentir-se. Ele e seus auxiliares não se prenderam a soluções rotineiras. Eram do tipo de homens que não se intimidam e ousam inovar" (CORRÊA, 2012, p. 28).
Padecendo há tempos das faculdades mentais, o que fazia com que se consultasse frequentemente com médicos na Europa, faleceu em sua chácara, conhecida como Chácara Pensador, localizada na Estrada de Flores, cometendo suicídio na madrugada do dia 13 de outubro de 1900, sendo declarado morto na manhã de 14 de outubro. Tinha apenas 38 anos.
Conforme pesquisa do jornalista Júlio Benevides Uchôa, o corpo foi recomendado pelo Monsenhor Benedito da Fonseca Coutinho, acompanhado de quatro padres agostinianos. Carregaram o caixão até o carro fúnebre o Coronel Afonso de Carvalho, Presidente da Assembleia; Porfírio Nogueira; Coronel Emídio Pinheiro, Comandante da Polícia; e o Desembargador Joaquim Lisboa. O carro estava ricamente decorado, com veludo preto com franjas prateadas e bordas brancas. Falaram à beira do caixão Porfírio Nogueira, Secretário do Governo, representando o Estado; Major Domingos Andrade, representante da Maçonaria; Alberto Leal, representante da colônia portuguesa; Barbosa Lima, representante do jornal Amazonas, que fazia forte oposição ao falecido; Coronel Afonso de Carvalho, representando o Congresso de Representantes e também opositor de Eduardo Ribeiro; Leonel Mota, representante da Loja Maçônica Esperança e Porvir; e José dos Anjos Traíra, representante da classe operária (UCHÔA, 1949).
O carro fúnebre saiu da chácara às 17:15, chegando ao cemitério às 18 horas. Seu enterro foi de uma grandeza jamais antes vista. Até aquele momento nada de igual tinha ocorrido na História do Estado do Amazonas. Quem recuperou esse momento foi o historiador Mário Ypiranga Monteiro no livro Negritude e Modernidade:
"Foi uma apoteose, ritual menos político do que espontâneo, que alvoroçou a população e levou-a em tumulto à distante Chácara Pensador. O governo pôs à disposição do público dez bondes sem ônus, que ficaram lotados e vieram deixar as centenas de passageiros na curva da via da Vila Municipal, ao lado do Cemitério de São João Batista. Além disso, a multidão que se comprimia nas cercanias da necrópole e de dentro só poderia explicar o grau de simpatia humana que aquele homem desfrutava" (MONTEIRO, 1990, p. 51).
O historiador João Felipe Gonçalves, pesquisador sobre a construção fúnebre de personagens da Primeira República, identificou algumas características que davam o tom cívico a esse tipo de funeral, contribuindo para a consagração de suas trajetórias:
"Longos cortejos com uma rígida ordem hierárquica, a assistência de numerosos populares e a participação de autoridades e pessoas de destaque [...] são os traços mais evidentes. Com maior ou menor concorrência, mas sempre com grande pompa, repetiam-se em todos os casos os luxuosos carros fúnebres, os carros com figuras importantes, as bandas militares tocando marchas fúnebres, os tiros de canhão dos navios e fortalezas, os batalhões militares em trajes de honra, os postes cobertos de crepe negro e as ruas repletas de populares" (GONÇALVES, 2000, p. 149).
O registro mais marcante sobre a consagração de Eduardo Ribeiro como personagem histórico, grande vulto amazonense, foi produzido em 1923 durante uma romaria de membros da colônia maranhense que vivia em Manaus ao Cemitério de São João Batista para visitar seu túmulo. Eduardo Gonçalves Ribeiro conseguiu um feito que poucos alcançaram: o de ser consagrado, ainda em vida, um vulto insigne da História, potencializado após a morte, tornando-se um símbolo da administração pública ideal, da superação e resistência.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
CORRÊA, Luiz de Miranda. O Nascimento de uma Cidade: Manaus 1890 a 1900. 2° Ed. Manaus: Academia Amazonense de Letras/Governo do Estado do Amazonas - Secretaria de Estado de Cultura, 2012.
GONÇALVES, João Felipe. Enterrando Rui Barbosa: um estudo de caso da construção fúnebre de heróis nacionais na Primeira República. Estudos Históricos. Vol. 14, n° 25, p. 135-161, 2000.
MESQUITA, Otoni Moreira de. Eduardo Ribeiro (1862-1900) – O artífice da cidade. In: UGARTE, Auxiliomar Silva (org.). Trajetórias políticas na Amazônia Republicana. Manaus: Editora Valer, 2019.
MONTEIRO, Mário Ypiranga. Negritude e Modernidade: A trajetória de Eduardo Gonçalves Ribeiro. Manaus: Governo do Estado do Amazonas, 1990.
REIS, Arthur Cezar Ferreira. História do Amazonas. 2° Ed. Belo Horizonte: Itatiaia; Manaus: Superintendência Cultural do Amazonas, 1989.
UCHÔA, Júlio Benevides. Eduardo Ribeiro, o Construtor de Manaus. O Jornal, 14/10/1949.
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