Conquista de México por Cortes.
“A
maior coisa depois da criação do mundo, tirando a encarnação e a
morte de quem o criou, foi o descobrimento das Índias” - Fernando
López de Gómara, em História General de las Indias (1552)
Podemos
perceber, através dessa frase do
padre e historiador espanhol
Fernando López de Gómara, como a descoberta das Américas,
empreendida por Colombo em 1492, teve um grande impacto na Europa.
Novos povos, costumes e crenças eram apresentados à Europa cristã,
que rapidamente tentou interpretá-los através de uma ótica
clássica, mesmo percebendo, de início, que não seria uma tarefa
fácil. A historiografia do primeiro século de ocupação europeia
seria dominada por autores ligados ao poder eclesiástico e imperial,
surgindo mais tarde escritores mestiços e nativos. Nosso
primeiro foco de análises vão ser os escritores portugueses e
espanhóis.
Portugueses
e Espanhóis
Os
pioneiros nos descobrimentos além-mar foram os portugueses, que
conquistaram Ceuta, cidade do Norte da África, em 1415. Fernão
Lopes é considerado um dos
principais cronistas-historiadores de Portugal. Antigo guarda-mor da
Torre do Tombo e Tabelião do reino, teve farta fonte documental para
a elaboração de seus escritos. Na África, na Ásia e no
subcontinente indiano, os historiadores portugueses, assim
como os espanhóis, na América, se viram frente a frente com novas
formas de contagem de tempo, mitos, lendas e
histórias fundadoras. Com
dificuldades para analisá-las sob a perspectiva
cristã ou sem bases
documentais, muitos desses autores se viram utilizando os
conhecimentos dos nativos em suas obras.
Nas
Américas Andina e Caribenha, áreas de interesse da Coroa Espanhola,
existiam os historiadores ligados ao clero e aqueles relacionados à
máquina administrativa e militar. As primeiras obras sobre a América
foram escritas por autores humanistas que nunca estiveram ou passaram
pela região. Pedro Mártir de Anglería, italiano que viveu boa
parte de sua vida na Espanha, produziu, com conhecimentos geográficos
da Antiguidade, provenientes de Plínio, e a divisão por décadas,
de Tito Lívio, a primeira grande obra sobre o descobrimento da
América, intitulada Décadas sobre o Novo Mundo. Outros
humanistas que se dedicaram a escrever a história do continente,
mesmo sem ter contato com este, foram Antonio de Herrera y
Tordesillas, Pedro Sarmiento de Gamboa e Francisco López de Gómara.
Enquanto alguns historiadores davam uma introdução geral sobre a
origem do mundo e dos povos (segundo a Bíblia), outros preferiam
dividir seus livros em capítulos sobre Geografia, Economia, Religião
e História. Eles saem do marasmo cronológico humanista e abordam
outros conhecimentos, como Heródoto fez em suas Histórias.
O
primeiro historiador a colocar os pés no Novo Mundo foi Gonzalo
Fernández de Oviedo, representante da Coroa. Suas principais obras,
Sobre a História natural das Índias e História Geral das
Índias, foram as primeiras escritas em espanhol. Abordando
história natural e outros aspectos do continente, a história
começava a partir do descobrimento de Colombo, em 1492. De sua
experiência como romancista, Oviedo evoca a figura de Júlio César
em referência ao conquistador espanhol Cortés. Gómara, que como já
foi dito, não esteve na América, escreveu a História da
Conquista do México e História Geral das Índias, através de
relatos de Cortés, a quem serviu como capelão. Cronologicamente, a
obra se inicia com as conquistas de Cortés e termina com sua morte,
em Sevilha, na Espanha.
No
século 17, os historiadores da América Espanhola estavam relutantes
em utilizar fontes orais vindas dos nativos. Isso se deve ao fato de
que as obras eram patrocinadas por particulares e pela Igreja – os
primeiros interessados em informações de fácil acesso e
entendimento, e o segundo em inserir os nativos na cultura cristã.
Com o surgimento de uma nova vertente do Cristianismo, o
Protestantismo, a Igreja Católica se viu incumbida de absorver o
passado desses povos para a religião considerada a correta, o
Catolicismo. Os historiadores ligados à Igreja, escreviam sobre a
história do continente sob a ótica de suas ordens religiosas:
Dominicana, Jesuíta e Franciscana.
Os
historiadores clericais que se destacam são Bartolomé de Las Casas,
José de Acosta e Bernardino de Sahagún. Las Casas se destacou por
sua defesa aos nativos, muitas vezes vistos com inferioridade por
outros autores e, desde sempre, massacrados pelos conquistadores. Seu
livro História das Índias, dividido em décadas, vem com um
prólogo explicando o que é História, a lembrança a historiadores
clássicos e a motivação para a escrita. Analisava os indígenas
americanos em comparação a gregos e romanos. José de Acosta,
Jesuíta, escreveu a História Natural e Moral das Índias, na
qual articulava, como se pensa na teoria moderna, que os nativos
descendiam da Ásia. Acosta, ao narrar a História dos nativos,
afirma que isso é importante para facilitar o processo de
evangelização. Dividia os povos bárbaros em Civilizados,
Semicivilizados e Selvagens. Sahagún foi um proeminente conhecedor
das línguas nativas, bem como um destaque entre os demais
historiadores, pois sua principal obra História geral das Coisas
da Nova Espanha, foi produzida através de muitas informações
orais de seus alunos indígenas, que aprenderam latim com ele. É uma
grande enciclopédia, com diversos assuntos sobre a região. Foi um
escritor bilíngue, escrevendo em Nahuatl, língua geral dos povos da
Mesoamérica, e espanhol, a língua do Império.
Em
síntese, podemos ter como características dos historiadores do Novo
Mundo: Divergências entre autores espanhóis, geralmente em
relação ao uso de fontes e de conhecimentos indígenas; A visão de
mundo era providencialista, sendo que esses autores viam a Espanha
como a realizadora da missão de cristianizar os novos territórios;
As línguas europeias e indígenas se hibridizaram, isto é, passaram
a trocar influências; Autores da Antiguidade eram evocados, tinham o
estilo literário copiado; Por mais que tenha ocorrido algumas
tentativas diferentes, o passado nativo era visto sob a ótica da
cultura europeia; Uso de conhecimentos indígenas para a
produção de livros; Obras controladas politicamente e escritas com
objetivos de informação; Autores ligados ao Clero, particulares e
Monarquia.
FONTES:
WOOLF, Daniel. Uma História global da História. Tradução de Caesar Souza - Petrópolis, RJ, Vozes, 2014.
CRÉDITO DA IMAGEM:
Library of Congress - www.loc.gov
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