sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

A Historiografia da Conquista II - Mestiços e Indígenas na América Espanhola

Cena da primeira página do Códice Mendoza, representando a fundação da cidade de Tenochtitlan.

No primeiro texto, vimos como portugueses e, em especial os espanhóis, produziam historiografia sobre o Novo Mundo. Agora, nessa segunda parte, vamos entender como mestiços e indígenas passaram a escrever suas histórias após o contato com os espanhóis.

Os nativos, ao contrário do que alguns historiadores espanhóis acreditavam, tinham consciência de seu passado histórico e sabiam ordená-lo: dividiam seus escritos entre os destinados à realeza e os destinados à população comum; separavam fontes orais de escritas e pictóricas; e cronistas de historiadores. Dos espanhóis, os mestiços e indígenas utilizaram a língua, os gêneros de escrita e a cronologia cristã.

Um dos primeiros autores nativos a mesclar tanto conhecimentos históricos indígenas com europeus foi o nobre asteca Chimalpahín, autor de Relaciones ou Anais. Em seu livro, ele usa tanto a datação do calendário cíclico asteca quanto a datação cristã Anno Domini. Ele cobre períodos anteriores e posteriores à conquista espanhola, reis antigos do México, Listas de arcebispos, etc; consultando para tal os testemunhos de anciãos. Ele também aborda eventos ocorridos na Europa, como o assassinato do Rei Henrique IV da França, em 1610. A escrita de Chimalpahín era em Nahuatl, com o uso de algumas palavras em espanhol.

O mestiço Alva Ixtlixóchitl escrevia tanto em espanhol quanto em Nahuatl. Criticou os excessos espanhóis contra os nativos e elogiou a introdução do Cristianismo na região. Como fontes, usa os códices indígenas e os relatos dos anciãos. Sua história, além de abordar a conquista, também cobre o período antigo do México, como o governo dos olmecas.

O aristocrata mestiço Garcilaso de la Vega e o nativo andino Felipe Guaman Poma de Ayala são os dois maiores exemplos da nova geração de historiadores da América Espanhola (séculos 16 e 17), que passaram a utilizar conhecimentos europeus e nativos para produzir suas obras. Garcilaso, que passou boa parte de sua vida na Europa, escrevia seus trabalhos em forma de prosa e em castelhano. 

Garcilaso usava discursos inventados (afirmava que os nativos tinham se convertido voluntariamente ao Cristianismo) e informações de historiadores espanhóis antigos como Gómara, José de Acosta e Cieza de León. Apesar de criticar as ações espanholas no Peru, Garcilaso tenta conciliar esses dois povos, dizendo que estes tem muito em comum. Da sua origem inca, teve muitas informações orais a sua disposição, bem como materiais escritos. Escreveu Comentários Reais (1609); a Flórida de Inca (1605), relato sobre uma expedição espanhola no que é a atual região da Flórida e a Costa do Golfo; e História Geral do Peru (1617).

Guaman Poma de Ayala, nativo andino de origem humilde, dominava o quíchua e o castelhano. Escreveu Primeira Nova Crônica e bom governo, utilizando informações de historiadores antigos como Las Casas, Acosta e Zárate. Seu livro traz muitos elementos da cultura nativa. O índice de conteúdos e dividido de acordo com o sistema decimal andino;e a narrativa é empregada para explicar as figuras. Seu livro inicia com uma descrição do Peru, depois uma história bíblica sobre os incas; passando para o governo espanhol no Peru, no qual temos críticas ao governo, aos clérigos e aos pecados de nativos e estrangeiros

Em síntese, temos como características da historiografia nativa e mestiça: uso de conhecimentos europeus como a língua espanhola, a cronologia cristã e os gêneros de escrita (anais, crônicas e histórias); uso de conhecimentos indígenas (códices, relatos de anciãos e cronologia como o quipo ou o calendário cíclico) e defesa do ponto de vista do conquistado.


FONTES:

WOOLF, Daniel. Uma História Global da História. Tradução de Caesar Souza. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.


CRÉDITO DA IMAGEM:

commons.wikimedia.org

Nenhum comentário:

Postar um comentário