Primeira página da Crônica de Peterborough, integrante da Crônica anglo-saxônica, um conjunto de Anais sobre a História dos anglo-saxões.
Na
atual fase do curso de História, na matéria Historiografia Geral
II, estamos estudando as Historiografias do Ocidente Medieval, que
cobre o início da produção historiográfica a partir da queda do
Império Romano do Ocidente até a segunda metade do século 15.
Antes de nos aprofundarmos nas obras e nos perfis historiográficos
de autores como Godofredo de Monmouth (1100-1155), Guilherme de
Malmesbury (1080-1143) e Godofredo de Villehardouin (1150/1160-1212),
é preciso entender as diferentes formas que os historiadores do
medievo tinham de registrar a história: Anais, crônicas e história.
Vou começar pelos Anais, gênero bastante utilizado desde a
Antiguidade Clássica.
Esse
e os outros conceitos nós começamos a analisar através de sua
etimologia. Anais, do latim annales, originado de annus,
significa ano. Temos aí uma forma de registro feita ano por ano, de
forma objetiva, sobre fatos importantes (podem ser locais, nacionais
e universais) como uma colheita, uma batalha, evento astronômico ou
a morte de alguma pessoa ilustre. Não existe uma preocupação com o
estilo literário, nem com a retórica. Os Anais surgem, assim como
os estudos cronológicos da Idade Média, da necessidade de se
estabelecer uma data para a Páscoa, o pontapé inicial das
festividades cristãs.
Em
um dos primeiros textos utilizados nessa matéria, o historiador John
Burrow afirma que podemos perceber, na Crônica anglo-saxônica,
como a escrita vai perdendo seu caráter puramente analítico,
pragmático, e se torna mais extensa, desenvolvida e
com algum grau de preocupação estilística.
Se os calendários antigos se desenvolveram e deram origem aos Anais,
os Anais se desenvolvem e tornam-se crônicas.
Mas,
claro, apesar das diferenças, a escrita de um texto histórico
poderia mesclar mais de um gênero. Um autor pode iniciar um relato
histórico, bem desenvolvido, com estilo literário etc. Ao longo de
seu texto, ele pode nos apresentar passagens analíticas, objetivas.
Se isso acontece atualmente, imaginem há 1000 anos, quando muitas
vezes os autores os faziam se distinção de gênero. O gramático
romano Aulo Gélio, citando o gramático Vérrio Flaco, através de
sua obra
Noites Áticas,
nos apresenta
uma distinção entre os Anais e a História: ele diz que, pela
etimologia, a
História (investigar, averiguar) é um registro de
fatos presenciados pelos próprios autores,
enquanto que os Anais são registros de fatos anteriores, organizados
ano a ano.
Apenas
em nível de informação, a Crônica
anglo-saxônica, que
começou a ser escrita no final século IX, é um conjunto de anais
que cobrem o período de 1 d. C até a segunda metade do século 12.
As informações são apresentadas por ano, sendo que, ao longo
deles, percebemos a mudança na abordagem, que começa a se tornar
realmente uma crônica. Entendemos, com isso, a explicação de
Vérrio Flaco.
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