quarta-feira, 8 de julho de 2020

Trajetória das obras que contam a História do Trabalho no Amazonas é apresentada pelo historiador Luís Balkar Pinheiro

O texto a seguir é de autoria da jornalista e acadêmica de História (UFAM) Betsy Bell. Nele nos é apresentado de forma didática o primeiro episódio de uma série de vídeos sobre História Social do Trabalho e Movimentos Sociais na Amazônia, apresentado pelo historiador Luís Balkar Sá Peixoto Pinheiro.


Betsy Bell*

Vendedor ambulante na Avenida Sete de Setembro, no Centro de Manaus. Foto de 1927. Autor: James Dearden Holmes (1873-1937).

Doutor em História Social, o historiador amazonense Luís Balkar Sá Peixoto Pinheiro estreou o primeiro episódio de vídeos sobre História Social do Trabalho e Movimentos Sociais na Amazônia, iniciativa do GT Mundos dos Trabalho, grupo de estudos da Faculdade de Licenciatura em História, da Universidade Federal do Amazonas, que lançou o projeto no canal da plataforma digital YouTube, no último dia 30 de junho.

Com 20 anos de trabalho na área, Luís Balkar faz um panorama sobre a trajetória de pesquisas e de obras da história do trabalho no Estado do Amazonas. Na linha de tempo que ele traça, além de citar autores de obras referendadas sobre o assunto ou mesmo dissertações, o historiador apresenta uma análise pertinente sobre os motivos que despertaram o interesse pela história social do trabalho no Estado desde os anos 1980 e o que se segue até os dias de hoje.

Foi uma pena - contudo compreensível, pois poderia ser confundido com presunção -, Balkar excluir da palestra online referência às suas próprias obras sobre o tema: os livros “Vozes Operárias: Fontes para a História do proletariado amazonense” e “Mundos do Trabalho na Cidade da Borracha – Trabalhadores, lideranças, associações e greves operárias em Manaus (1880-1930)”, este último uma produção em parceria com a também Doutora em História Social, a historiadora Maria Luíza Ugarte Pinheiro.

Mas nada que este texto não possa pontuar e fazer justiça. Afinal, a obra dos dois – Luís e Maria Luíza - é um mosaico de várias dissertações que Balkar cita, inclusive, no vídeo do GT Mundos do Trabalho, mas com uma condução encantadora dos que não só leem, orientam e acompanham as pesquisas, mas dominam o tema como poucos. “Mundos do Trabalho na Cidade da Borracha”, assim como “Vozes Operárias” são tão cativantes quanto grandes romances literários. Sem o serem. E seus principais encantos são os trabalhadores, que surgem mais que personagens da trama, mas como protagonistas da cena.

Mundos do Trabalho na Cidade da Borracha, de Luís Balkar Sá Peixoto Pinheiro e Maria Luiza Ugarte Pinheiro.

O COMEÇO

Prof. Dr. Luís Balkar Sá Peixoto Pinheiro.

De acordo com Luís Balkar Pinheiro, o final dos anos 1980 teve o cenário perfeito para o começo das pesquisas sobre a temática da História Social do Trabalho no Amazonas. No vídeo, ele destaca os fatores. Um deles, diz respeito ao País estar às voltas com a abertura política, outro porque explodiam greves e movimentos sociais por todos os lados e também porque várias pesquisas destacavam, justamente, a referida inflexão historiográfica.

“No contexto amazonense, questões importantes também aconteciam como as greves operárias na Zona Franca de Manaus e a profissionalização da História no Estado, diante da abertura do curso de História (na Ufam), onde o currículo direcionava para pesquisa e a própria necessidade da história escrita pelos locais”, relembra o professor.

Nessa perspectiva tão positiva para ressaltar o tema trabalho, o historiador revela que houve ainda uma espécie de simbiose entre as experiências locais e nacionais, principalmente com os historiadores Victor Leonardi e Francisco Foot Hardman, autores de “História da Indústria e do Trabalho no Brasil: das origens aos anos vinte“ (1982) – obra tida como inovadora naquele momento entre os estudiosos.

Ambos, inclusive, vieram para o Amazonas diversas vezes e até Leonardi chegou a ser professor-visitante da Ufam. “Isso tudo foi um espectro de fatores que causou impulso para pesquisadores da área e que acabou refletindo nos seus trabalhos”, declara Pinheiro.


A VEZ DOS EXCLUÍDOS


A trajetória, levantada por Luís Balkar, segue com o relato que destaca o aparecimento da dissertação de Mestrado, na Pontifícia Universidade Católica (PUC), que depois virou o livro “A Ilusão Do Fausto: Manaus (1890-1920)”, de Edinea Mascarenhas Dias.

Não é pra menos. A obra – que completa 21 anos – repensa mesmo todo o processo de formação da cidade de Manaus e, segundo Balkar, “renova a abordagem historiográfica, a partir de uma história social, preocupada com os excluídos e os marginalizados, com o conflito social, com a dominação, mas também com a resistência”.

No entanto, apesar da importância até hoje editorial e histórica da “A Ilusão do Fausto”, Luís Balkar Pinheiro explica que a questão do trabalho, na obra, surge de forma periférica e não como protagonista – o que, realmente, não era o objetivo do livro.

E o surgimento de obras que evidenciam, de maneira mais direta, a história social do trabalho e do trabalhador urbano no Amazonas, ocorrerá apenas na década de 1990. Com isso, Balkar menciona tanto “Quando Viver Ameaça a Ordem Urbana: trabalhadores urbanos em Manaus (1890/1915)”, de Francisca Deusa Sena da Costa (1997), quanto “A Cidade Sobre Os Ombros: Trabalho e Conflito no Porto de Manaus, 1899-1925”, de Maria Luiza Ugarte Pinheiro.

Trata-se de duas dissertações de Mestrado em História (PUC-SP) e, ambas, partem do objetivo de contar a história da cidade de Manaus, mas sob a ótica do trabalho. Um outro elemento interessante em comum, destacado pela narração de Balkar, é o fato das duas receberem influências das obras dos historiadores da Escola Inglesa, como Edward Palmer Thompson e Eric Hobsbawn – os dois, marxistas. “No trabalho de Francisca Deusa, que mostra certos cenários da cidade, os atores centrais são os populares, os povos urbanos e o ponto forte no estudo é a questão da moradia”, relata Pinheiro.

No entanto, a obra de Maria Luíza Ugarte, “A cidade sobre os ombros”, é tida como um trabalho mais totalizado, um marco mesmo, diante do tema História Social do Trabalho. Isso porque, segundo Balkar, o estudo se debruça sobre os trabalhadores portuários, os estivadores, e esquematiza tudo a respeito deles, como cotidiano, lazer, moradia, alimentação, além de “avançar na questão das relações de trabalho, com o patronato e, mais importante, no estudo sistemático sobre os processos de associações e de suas lutas, mapeando greves operárias”.


ANOS 2000 – UMA ODISSEIA NO TRABALHO


O adensamento de historiadores amazonenses interessados na História Social do Trabalho, conta o historiador Luís Balkar Pinheiro, teve o ano de 2005, uma divisa. Tudo porque deu-se a montagem do programa de pós-graduação em História da Ufam, com linha de pesquisa específica para o trabalho urbano em Manaus e na própria Amazônia.

Tanto que o número de dissertações e pesquisas, ao longo desses 15 anos, gira em torno de 155 trabalhos, sendo 50 apenas de História Social do Trabalho e 18 específicos sobre a história operária. Nesse contexto, Luís Balkar salienta algumas pesquisas determinantes à temática como a de Luciano Ewerton Teles (“A vida operária em Manaus: imprensa e mundos do trabalho (1920)”), de 2008; a de Alba Barbosa Pessoa, “Infância e Trabalho: Dimensões do Trabalho Infantil na Cidade de Manaus (1890-1930)”, de 2010, e a de Luciane Dantas de Campos (“Trabalho e emancipação: um olhar sobre as mulheres de Manaus (1890-1940), também de 2010.

“Veremos ainda alguns trabalhos sobre a visão do patronato, de Alexandre Avelino, e greves operárias, de Moisés Araújo, que envolve greves durante a Grande Guerra, entre 1914 e 1918, Manaus”, completa Pinheiro. Os trabalhos e autores citados são “O patronato Amazonense e o mundo do trabalho: a Revista da Associação Comercial e as representações acerca do trabalho no Amazonas (1908-1919)”, de Alexandre Avelino e “O grito dos trabalhadores: movimento operário, reivindicações e greves na Manaus da Grande Guerra (1914-1918)”, de Moisés Dias de Araújo.
Luís Balkar dá ênfase ainda, neste período, ao grande número de dissertações, que passaram a acompanhar categorias profissionais, desde caixeiros, tipógrafos, carregadores, carvoeiros até condutores de bonde, carteiros, metalúrgicos e portuários. Para isso, ele cita trabalhos de Kleber Moura, Dhyene Santos, Sérgio Lima e Cláudia Barros.

São eles, “Caixeiros: organização e vivências em Manaus (1906-1929)”, Kleber Barboza de Moura; “Motoristas e Condutores de Bondes em Manaus: Sociabilidade, Cultura Associativa e Greves (1899-1930)”, de Dhyene Vieira dos Santos; “Carvoeiros: trajetória do trabalho e dos trabalhadores da carvoaria em Manaus (1945-1967)”, de Sergio Lima e “Os trabalhadores e o Estado Novo em Manaus: uma história de resistências e conflitos”, de Cláudia Amélia Barros.


OS VANGUARDISTAS


Para Luís Balkar, as pesquisas mais recentes sobre o tema História Social do Trabalho no Amazonas ficaram mais livres do tópico sempre revisitado da expansão e crise da borracha em Manaus e os recortes foram ampliados, seja recuando no tempo, falando na província, ou escapando para os anos 1930 até 2015.

“Nesse caso, tenho que citar o trabalho de Tenner Abreu que estuda a escravidão e mestiçagem na província entre 1850 até 1889 e mesmo a importância da orientação de pesquisa do professor Doutor César Augusto Queirós sobre estudos políticos nos anos 1930 e 1940 e como se relaciona com a emergência do populismo na cidade”, diz o professor.

Balkar se refere, respectivamente a “Grêmio da Sociedade”: racialização e mestiçagem entre os trabalhadores na Província do Amazonas”, de Tenner Abreu e “Trabalho e cidade em Manaus nos anos 30: o patronato e as relações de trabalho”, de Jessica Cristine Duarte, trabalho que está sendo orientado pelo historiador César Augusto Bubolz Queirós.

Das temáticas mais contemporâneas, o professor Luís Balkar cita o trabalho de Célia Santiago sobre a greve dos metalúrgicos de 1985 (“Clandestino e mobilização nas linhas de montagem: a construção da greve dos metalúrgicos de 1985, em Manaus”) e também a de Rafaela Bastos que segue até 2015 (“Entre memórias: as experiências dos carregadores e carregadoras da Manaus Moderna e Estação Hidroviária de Manaus - Roadway, 1993-2015”).

Com memória primorosa e abordagens sensatas, o historiador Luís Balkar encerra a palestra online ainda com informações surpresas: aconselhamentos sobre a utilização atual das fontes diferenciadas e questões a serem superadas na contação dessas histórias. Mas, pra isso, o leitor terá que assistir ao vídeo, disponível no https://youtu.be/m5V61HsDm2w.




(*) Betsy Bell é jornalista formada pela Universidade Federal do Amazonas e graduanda do 3º período do curso de Licenciatura em História (também Ufam)

Um comentário:

  1. Parabéns, Bellzinha!

    Teu texto leve e rico em fundamentação torna o estudo da história agradável até para os leigos.

    Orgulhosa da tua nova trajetória. Que seja plena de sucesso, realizações e contribuição social.

    💡👏🏽😘

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