Mostrando postagens com marcador escravidão. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador escravidão. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 24 de maio de 2021

24 de maio de 1884: Abolição da Escravidão em Manaus

Recorte do jornal 'Amazonas'. FONTE: Amazonas, 24/05/1884, p. 01.

Apesar de ser pouco conhecida e não fazer parte do calendário oficial do Estado, a data de 24 de Maio é de extrema importância para a História do Amazonas no que diz respeito à luta contra a escravidão.

No dia 24 de maio de 1884 o Presidente da Província do Amazonas, Theodoreto Carlos de Faria Souto (1841-1893), declarou o fim da escravidão na cidade de Manaus. Um mês e meio depois, em 10 de julho, a escravidão seria abolida em toda a Província. Manaus foi uma das primeiras cidades do Império a abolir essa prática, sendo precedida, em 1883, pelas vilas de Acarape,  Pacatuba, São Francisco, Aracoiaba, outras localidades e a cidade de Fortaleza, ambas na Província do Ceará.

Para que Manaus e, posteriormente, o Amazonas, se vissem livres de tão antigo sistema econômico, que por séculos foi o sustentáculo do país, foram necessários anos de lutas de várias entidades abolicionistas, destacando-se a 'Sociedade Emancipadora Amazonense', fundada em 1870, e da Maçonaria, que atuavam na Assembleia Legislativa Provincial da Província e também compravam cartas de alforria. De 1869 a 1884 foram criadas leis visando a libertação dos negros escravizados, garantindo nos orçamentos da Província quantias para a compra de alforrias.

A lei n° 184, de 19 de maio de 1869, destinou 10:000$000. A n° 200, de 05 de maio de 1870, 12.000$000. A n° 219, do ano seguinte, a mesma quantia para os escravos que nascessem a partir daquela data. A lei n° 444, de 31 de janeiro de 1880, garantiu a liberdade de dez escravos; e a n° 620, de 14 de junho de 1883, a liberdade de dezessete (AMAZONAS, 24/05/1884, p. 01) Finalmente, no dia 24 de maio de 1884, o Presidente Theodoreto Carlos de Faria Souto anunciava, na Praça Dom Pedro II, que tinha fim a escravidão na cidade de Manaus. Por conta dessa ação, Thedoreto Souto foi demitido do cargo pelo Gabinete Lafayette, comandado por Lafayette Rodrigues Pereira, Presidente do Conselho dos Ministros.

Deve-se destacar que os escravos não foram passivos diante da escravidão. Nos jornais do século XIX e em outros documentos encontramos vários registros de fugas, de rebeldia contra agressões e trabalhos extenuantes, sendo essas as principais formas de resistência verificadas na Província do Amazonas e em outras localidades do Império.

A antiga Rua da Constituição foi renomeada, de acordo com o Historiador Mário Ypiranga Monteiro, no livro Roteiro Histórico de Manaus, como 24 de Maio em 24 de fevereiro de 1887 por proposta dos vereadores Silvério José Nery, José Carneiro dos Santos e Manuel Ramos, ambos abolicionistas (MONTEIRO, 1998, p. 723).


FONTES:


Amazonas, 24/05/1884.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:


MONTEIRO, Mário Ypiranga. Roteiro Histórico de Manaus. 2 vols. Manaus: Editora da Universidade do Amazonas, 1998.

sexta-feira, 10 de julho de 2020

10 de Julho de 1884: Abolição da Escravidão na Província do Amazonas

Alguns escravos fotografados em Manaus durante a Expedição Thayer (1865-1866). FONTE: umaincertaantropologia.org.

No dia 10 de julho de 1884, o Presidente da Província do Amazonas, Theodoreto Carlos de Faria Souto (1841-1893), abolia a escravidão no Amazonas, que se tornou a segunda Província do Império a abolir a escravidão, pois em 25 de março de 1884 o Ceará anunciava a emancipação de seus escravos. Antes disso, em 24 de maio do mesmo ano a escravidão fora abolida em Manaus.

Desde 1869 valores eram adicionados, mediante emendas parlamentares, ao orçamento da Província do Amazonas, para a compra de cartas de alforria.

Foi em uma quinta-feira, no dia 10 de julho de 1884, às 12 horas, que o Presidente Theodoreto Souto declarou, na Praça 28 de Setembro (hoje Heliodoro Balbi, da Polícia), cujo nome fazia alusão à Lei do Ventre Livre, que já não existiam mais escravos no Amazonas.

No relatório da Província, antes da abolição esta contava com cerca de 1.501 escravos em 1884, em sua maioria empregados em serviços domésticos. Eram carpinteiros, jardineiros, cozinheiros, amas de leite, amas-secas (empregadas domésticas) etc. Estavam distribuídos da seguinte forma:

"Manáos - 626
Manicoré - 309
Itacoatiara - 76
Teffé - 171
Maués - 9
Borba - 164
Silves - 15
Parintins - 134
Barcellos - s. n.". (AMAZONAS, Província. Relatório, 16. fev. 1884, p. 29).

Deve-se destacar que, como menciona o Presidente José Paranaguá, esses números podem não corresponder à realidade, dadas as irregularidades frequentes nos livros de matrículas de escravos. Mas quem eram esses escravos? Eram objetos que poderiam ser vendidos, alugados, usados como empréstimos, pagamento de dívidas e heranças. Tomemos como exemplo os seguinte casos: No primeiro, de 1868, mãe e filha foram vendidas:

"Compareceram Antonio Albano do Lago, representado por seu procurador bastante nesta cidade Manoel Alves dos Santos, como vendedor e Manuel Gonsalves Ferreira como comprador... e foi dito perante mim e as testemunhas que sendo o seu constituinte senhor e possuir de uma escrava de nome Marcellina de côr carafusa e idade vinte e cinco annos, natural da cidade de Obidos, filha da escrava Theodora, com uma filha por baptizar, de sete mezes de idade, tambem nascida em Obidos, fazia venda da supradita escrava Marcellina com a referida filha... (escritura de compra e venda de 20 de abril de 1868, lavrada a fls. 9 verso a 10 do Livro de Notas n°. 1 do 1° Ofício de Manaus, hoje cartório do Dr. Fernandes Barros apud ITUASSÚ, 1981, p. 20-21).

Alguns anos mais tarde, em 1875, o escravo Jordão Piauhy, um dos bens penhorados de Francisco Fernandes da Silva Júnior, foi avaliado em 1:200$000 réis (JORNAL DO AMAZONAS, 16/04/1875, p. 04).

Apesar do tratamento como objeto, o escravo não deixava de responder e ser punido pelos crimes que cometia. Em 1863, a escrava Benedita, propriedade de Joaquim Pinto das Neves, fugiu por estar "condemnada a cém açoites por sentença do sr. delegado de policia desta cidade" (O CATHECHISTA, 14/11/1863, p. 04).

Um conjunto de fatores possibilitou que o Amazonas antecipasse em quatro anos a libertação de seus escravos. Deve-se destacar o novo contexto econômico, isto é, a expansão das atividades ligadas à extração do látex; o alto custo para a manutenção dos escravos, que já não era mais sustentável; a pressão cada vez maior de setores da sociedade e instituições como a Assembleia Legislativa Provincial, a Maçonaria e as sociedades emancipadoras contra essa prática. O historiador Provino Pozza Neto registra que a abolição total da escravidão no Amazonas estava marcada para o dia 5 de setembro, mas o Gabinete Lafayette, chefiado por Lafayette Rodrigues Pereira, já insatisfeito com as ações do Presidente da Província, decide exonerá-lo do cargo. Dessa forma, os abolicionistas amazonenses decidem adiantar a libertação para o dia 10 de julho (POZZA NETO, 2011, p. 140).

Não deve ser olvidada, de forma alguma, a resistência dos escravos à condição servil, pois até hoje, quando esquecida, transmite a ideia já superada de que estes foram passivos ao processo ou de que a escravidão foi mais branda na região Norte. A libertação não ficou circunscrita a "homens ilustres e de bom coração" e ao viés parlamentar (POZZA NETO, 2011, p. 19). São abundantes, em jornais de época, registros de fugas, na capital e no interior, bem como de crimes contra seus senhores, algumas das principais formas de luta e resistência utilizadas pelos cativos.

Um dos vários anúncios de fugas de escravos na Província do Amazonas. FONTE: Estrella do Amazonas, 1857.

Os defensores da abolição, membros em sua maioria da elite, defendiam que tal prática não encontrava mais espaço em uma sociedade que buscava integrar-se aos principais centros difusores da economia capitalista e dos valores da dita modernidade. Imperavam fatores mais econômicos que humanitários.

A antiga rua do Progresso, no Largo de São Sebastião, foi batizada com o nome 10 de Julho. A rua da Constituição foi renomeada como 24 de Maio em 23 de fevereiro de 1887, por proposta dos vereadores Silvério José Nery, José Carneiro dos Santos e Manuel Ramos, ambos abolicionistas, em referência ao fim da escravidão em Manaus.

Deve-se destacar que o ato de 10 de Julho de 1884 só foi reconhecido pelo Império quase três anos mais tarde: "A Libertação do Amazonas só foi aceita legalmente, pelo Império, a 30 de março de 1887, com o encerramento do livro de matrículas de escravos, no Amazonas, oficialmente realizado na Alfândega desta cidade" (LOUREIRO, 1989, p. 219).


Costa D' África


A Costa D' África foi uma região existente em Manaus na época da Província, com referências desde a década de 1860. Essa área, considerada um bairro na época, era habitada por africanos livres. Em 1866, Gustavo Ramos Ferreira, Vice-Presidente da Província, registrava a existência de 57 africanos livres que possuíam cartas de emancipação (AMAZONAS, Província. Relatório, 05. set. 1866).

Os moradores desse bairro, na condição de livres, conseguiram integrar-se, em parte, à sociedade da época, ocupando cargos públicos, militares e servindo de mão de obra em construções na capital. Essa integração deu-se em parte, pois após a libertação os negros continuaram, e ainda hoje continuam, sendo marginalizados e postos em condições subalternas, ainda que se tente mascarar os mecanismos de segregação e minimizar seus efeitos.

A Costa D' África estava localizada, de acordo com o jornalista Bento de Figueiredo Tenreiro Aranha, no livro Um Olhar pelo Passado (1897), em terras ao norte do antigo Cemitério de São José, entre as ruas Leonardo Malcher e Luiz Antony. Esse lugar desapareceu, possivelmente, em fins do século XIX e início do século XX, sendo integrado ao restante do Centro da cidade.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:


ARANHA, Bento de Figueiredo Tenreiro. Um Olhar pelo Passado. Manaus: Prefeitura Municipal/GRAFIMA, 1990. [original de 1897].

ITUASSÚ, Oyama César. Escravidão no Amazonas. Manaus: Editora Metro Cúbico, 1981.

LOUREIRO, Antonio José Souto. O Amazonas na Época Imperial. Ed. comemorativa 45°. aniversário da T. Loureiro Ltda. Manaus, 1989.

POZZA NETO, Provino. Ave libertas: ações emancipacionistas no Amazonas Imperial. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2011.

terça-feira, 10 de julho de 2018

Anúncios de escravos em jornais da Província do Amazonas (1857-1880)

Hoje, 10 de julho, comemora-se a abolição da escravidão no Amazonas, decretada em 10 de julho de 1884 pelo então presidente da Província do Amazonas Theodureto Carlos de Faria Souto. O movimento pela libertação dos escravos da Província e o fim dessa prática já vinha sendo desenvolvido por sociedades abolicionistas de senhoras, pela Maçonaria, por estudantes e intelectuais da região. Em 1884 surgiu o jornal O Abolicionista do Amazonas, gerido por senhoras que propagavam os ideais de libertação uma ou mais vezes na semana através desse periódico. No presente texto apresento alguns anúncios de venda e de recompensas para a captura de escravos publicados em jornais da Província do Amazonas entre 1857 e 1880.

José Piranga, escravo negro e oficial de calafate, humilde e com 32 anos, fugiu do domínio de José Joaquim de França, no dia 09 de abril de 1857, levando consigo seu filho de nome Cipriano, com 13 anos de idade. Percebam como funcionava a circulação de escravos: José Piranga foi escravo do Capitão Thomaz, de Villa Bella, sendo posteriormente comprado por José Coelho do Itaituba, que o vendeu para José Joaquim de França, o anunciante. O proprietário oferecia uma gratificação a quem os capturasse, assim como se manifestaria contra os que lhes dessem abrigo. Serpa (Itacoatiara), 10/04/1857.

Mesquita & Irmãos, grandes comerciantes da época, estabelecidos na antiga rua do Imperador (Marechal Deodoro), anunciam para aluguel um escravo que entendia de cozinha. O aluguel de escravos garantia uma boa renda aos proprietários. Manaus, 1866.

Com um grande título escrito 'Gratifica-se', Amorim & Irmãos, propriedade do Comendador Alexandre de Paula de Brito Amorim (1831-1881), oferecia uma gratificação a quem capturasse o escravo Bernardino, 'molato folo', que pertenceu ao capitão Antonio Lebo de Macedo, que o vendeu a João José Ferreira, que depois o vendeu a Custódio Pires Garcia, de quem foi comprado pelos anunciantes. Assim como Mesquita & Irmãos, manifestaria-se contra quem desse abrigo ao fugitivo. Manaus, 18/12/1867.

Alguns anúncios eram extensos, nos oferecendo mais detalhes sobre os proprietários e o escravo fugido. Antonio José Lopes Braga, procurador de seu irmão Luiz Antonio Lopes Braga, este herdeiro de Hermenegildo Lopes Braga, procurava um antigo escravo de Hermenegildo, em fuga desde 1868, cujo nome era Tristão, de mais ou menos 25 anos de idade, de cor "mulata atapuiado", de cabelos meio crespos, altura normal. Detalhes, muitos detalhes. Com essas descrições facilitava-se o reconhecimento e a captura. Sabia-se que estava em Silves, no interior. Caso fosse capturado, poderia ser entregue em três endereços: Em Manaus; no Pará, na firma Francisco Joaquim Pereira & Cia; e na Ilha das Araras, no rio Madeira, ao Capitão Antonio Lopes Braga. As despesas feitas durante a captura e a viagem seriam pagas pelo anunciante. O mesmo afirmava que não seria aplicado no escravo qualquer forma de castigo. Sobre a recompensa, esta ficaria em cem mil réis. Da mesma forma que outros anunciantes, manifestaria-se contra os que lhe dessem abrigo. Manaus, 31/08/1870.

Tratados como mercadorias, os escravos, importados ou já nascidos nessa condição, iam e viam, utilizados em casas comerciais, em afazeres domésticos e serviços públicos. Nesse anúncio a firma Debusine & Levy, estabelecida na rua Brasileira (Avenida Sete de Setembro), informava necessitar de um escravo. Quem tivesse algum disponível para a venda deveria levá-lo até a sede da mesma. Manaus, 29/05/1880. 


FONTES (PERIÓDICOS):

Estrella do Amazonas, 10/04/1857.
Amazonas, 1866.
Jornal do Rio Negro, 18/12/1867.
Amazonas, 31/08/1870.
Amazonas, 29/05/1880.