Estabelecimento dos Educandos Artífices, na antiga Olaria Provincial.
Passara-se
um dia da sessão realizada no Alto de Nazareth, na qual revelou-se
que o espírito que atormentava a família Alencar, no bairro da
Cachoeirinha estava inquieto e obcecado, procurando vingar-se das
injustiças que lhe foram cometidas em vida. Os fenômenos naquele
bairro continuavam a se manifestar, chamando a atenção de
espíritas, leigos ou de associações. Dessa vez, durante
uma sessão realizada no bairro dos Educandos,
um espírito vindo de muito longe deixaria sua marca no caso...
Manáos,
06 de agosto de 1917
Seguidores
e estudiosos da doutrina espírita mostraram-se bastante interessados
com o caso, como pode ser visto com a reveladora sessão realizada um
dia antes no Alto de Nazareth, na qual descobriram-se as motivações
do espírito da Cachoeirinha. Um desses estudiosos era Manoel dos
Santos Castro, porteiro da Alfândega, morador
da rua Barroso, no Centro, e há muito dedicado às leituras sobre o
espiritismo.
Castro,
naquele momento, amigo da caridade, assumiu para si a tarefa de
tentar evangelizar o espírito que estava atormentando
a família Alencar e, de certa forma, os moradores do arrebalde da
Cachoeirinha. Ele, no entanto, não informava os resultados de suas
pesquisas para a imprensa, apenas afirmava que “trata-se de
espíritos, e muitos outros factos psychicos vão se reproduzir nessa
cidade”.
As
manifestações na Cachoeirinha continuavam e, agora, não atingiam
apenas membros da família Alencar. Um jovem que zombava do caso,
criticando-o e afirmando ser ele uma mentira, declarou,
na redação do jornal A Capital, ter recebido um forte golpe no
rosto, o qual não sabia a procedência, pois estava sozinho no
momento.
O
Sr. Alencar se encontrava bastante abatido pelo que vinha ocorrendo
em sua casa desde o início do mês de agosto. Sua saúde, assim como
a vigilância e a perseguição ao ‘phantasma’, ia diminuindo.
Alice Alencar, a jovem que via o espírito, foi enviada para a
residência de um amigo da família, o advogado
Antônio Batista de Aquino, localizada na rua Visconde de Porto
Alegre, para ver se cessavam as perseguições. Mal
entrou na casa, foi atingida com um golpe vindo do “nada”.
Além
do trabalho de Manoel dos Santos Castro, outros espíritas realizavam
sessões em diferentes pontos da cidade, sendo que em todas elas o
espírito que se comunicava afirmava ter ocorrido um crime, de que
foi vítima o cidadão desconhecido que, agora no plano espiritual,
buscava vingança. Em
um encontro realizado no bairro dos Educandos, separado do local dos
eventos por um igarapé, recebeu-se a comunicação de um espírito
que se dizia ter sido um
jesuíta português
em vida, tendo vindo para o Brasil junto de um grupo de religiosos
que acompanhavam Duarte da Costa, em 1553. O espírito fez revelações
sobre o futuro da humanidade, do Brasil, durante e após a Guerra:
“Meus
amados irmãos, convidado por vós para dizer alguma coisa sobre os
recentes acontecimentos da Cachoeirinha, devo vos declarar que não
posso ir além do que já se pronunciou um respeitável mestre do
espaço, na sessão ultimamente levada a efeito no Alto de Nazareth.
É
justa a vossa curiosidade no sentido de se conhecer a vítima da
Cachoeirinha, mormente quando agora já se base, que um crime bárbaro
presidiu a tudo isso, crime esse que foi revestido da mais revoltante
hediondez.
Mas,
essa revelação não pode ser feita pelos espíritos que ascenderam
a grande escala da evolução espiritual. Somente os espíritos que
ainda pairam num plano bastante inferior, podem assim proceder,
porque a verdade é como diz o venerando apóstolo São Paulo, na
Epístola aos Efésios, cap. 6° verso 12°: Nós temos de lutar
contra os espíritos de malícia espalhados por esses ares.
Mantendo
os mesmos princípios externados pelo mestre que me precedeu em outra
sessão (porque dou graças a Deus de já ter atingido um grau mais
ou menos considerável na eterna vida do cosmo), me abstenho de
proclamar o nome desse irmão, que ora se manifesta na Cachoeirinha,
vítima da terrível tragédia referida pelo outro mestre.
Demais
a mais, o fenômeno psíquico ora observado, não é o primeiro, nem
será o último, mesmo porque, se aproximando os tempos anunciados, a
reprodução desses fenômenos se manifestará por todos os pontos da
terra, com maior intensidade.
O
aparecimento da nova raça no planeta, ocasionará os mais
extravagantes fenômenos, até que venha o reinado da fraternidade
humana.
É
por isso que vos posso afirmar que muito breve a maçonaria, que teve
um importante papel na civilização atual, estará de mãos dadas
com a igreja, porque nada mais separará o homem, mas tudo os unirá.
Virá
o amor, na santa lei de Buda, combatendo o ódio, para por termo às
contendas das nações”.
Nesse
momento, o presidente da sessão interrompe a fala, dizendo que, em
outro encontro, o Dr. Jorge de Moraes, ex-prefeito da capital, disse
que era impossível a paz universal, pela dificuldade da
reação do Tribunal Internacional, como pela impossibilidade do
desarmamento das nações. O espírito, prosseguindo, respondeu:
“O
Dr. Jorge de Moraes é um talento de eleição; mas a frase que ele
não encontra, para se dar isso, está na lei do amor. A ele respondo
como Cristo: O que é impossível aos homens não é difícil a Deus.
Finda
a guerra atual, que apavora as nações, os povos, ainda debaixo da
mais terrível impressão, terão horror só em ouvirem falar em
guerras sangrentas.
Esta
guerra, portanto, é o primeiro ensaio para a paz permanente dos
povos.
O
povo alemão, instrumento inconsciente da Divindade, se aparelhando
tanto quanto lhe permitiu o engenho da arte, presta grande benefício
às gerações de amanhã, aniquilando o seu poderio, como destruindo
as demais potências armadas”.
E
o Brasil, perguntou o presidente, qual seu destino nessa Grande
Guerra?
“Talhado
para grande destino na humanidade, o Brasil, a terra adorada, cuja
grandeza contemplamos e admiramos do espaço, terá importante papel
no concerto universal, nos tratados de paz das nações.
Emigrando
a civilização da Europa para a América, o Brasil se tornará o
centro das mais adiantadas concepções humanas; e assim, podeis ir
desde já observando a nova geração que se vai formando neste
grande país do futuro.
O
povo brasileiro de amanhã será essencialmente culto, dedicado às
letras, artes e indústrias; numa palavra: dominará o mundo pela
moral, pelo direito; a lei será a sua grande força.
Já
no rompimento das relações diplomáticas e comerciais com a
Alemanha, o Brasil deu uma grande lição perante o mundo inteiro:
garantiu a vida, liberdade e propriedade dos súditos alemães
residentes em seu território.
Apesar
de na minha última vida material ter sido português, venho amando
este pedaço de solo americano, desde que nele pisei, como jesuíta,
em companhia do padre José de Anchieta, que por sua vez com mais 15
jesuítas, fizera parte da comitiva de Duarte da Costa, segundo
governador geral do Brasil, em 1553.
Foi,
portanto, da fundação do Colégio de São Paulo, em 25 de janeiro
de 1554, que partiram meus primeiros ensaios na grande obra da
proteção aos índios, ao lado do padre Anchieta, fato esse que
tanto irritou os mamelucos.
Como
português que fui, concorri, com o meu pequeno esforço, para a
formação do grande povo brasileiro, que será a continuação da
pátria portuguesa, pela raça, pela língua, pelos costumes, pela
religião, enfim, e não posso, portanto, deixar de amar e muito este
belo país, o El Dorado das gerações futuras".
O
espírito do jesuíta português, um tanto saudosista, vindo do
longínquo século XVI para o XX, terminava sua comunicação, sem
fazer maiores revelações sobre os eventos da Cachoeirinha. É
evidente que a
maioria de suas previsões não se concretizaram.
No dia seguinte, ocorreriam
acalorados debates no Templo da Verdade, na rua José Clemente. Alice
Alencar
seria chamada para depor na delegacia e, ao fim de seu depoimento,
sua vida seria alterada de forma profunda…
CONTINUA
CRÉDITO DA IMAGEM:
Blog do Coronel Roberto - Catador de Papéis
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