Jornal do Comércio, 01/01/1914.
Relatório de análise de documento (periódico) apresentado na disciplina Metodologia da Pesquisa Histórica, ministrada pela Professora Dra. Maria Luiza Ugarte Pinheiro, do curso de História da Universidade Federal do Amazonas (UFAM):
O
Jornal do Comércio é o jornal mais antigo ainda em circulação no
Amazonas,
fundado
em Manaus
em
02 de janeiro de 1904 pelo Major Joaquim Rocha dos Santos
(1851-1905), português
que veio para a capital do Amazonas em 1862, tendo ocupado os cargos
de
Delegado de Polícia, Deputado Estadual, Presidente do Congresso
Amazonense, Deputado Federal, administrador do trapiche da
Recebedoria do Estado e provedor da Santa Casa de Misericórdia.
O
documento a ser analisado é uma edição de 01/01/1914 do referido
jornal. Este possui oito páginas. A quantidade de laudas variou com
o passar do tempo, tendo a primeira edição sido lançada com trinta
e duas e, posteriormente, sendo publicadas diariamente edições de
quatro e oito páginas. À
época dessa publicação, o Jornal do Comércio tinha como
proprietário o advogado Vicente Torres da Silva Reis, que o comprou
da família de Rocha dos Santos em
1907. No
canto superior direito da primeira página está estampada uma tabela
de assinaturas, forma pela qual o jornal era comercializado. A
assinatura anual, na capital, custava 50$000 réis, 60$000 para o
interior do Estado e 70$000 para outros países. Semestralmente, a
assinatura custava 25$000 réis na capital, 30$000 no interior do
Estado e 35$000 para outros países. No
canto superior esquerdo, o subtítulo: “No Estado do Amazonas o
JORNAL DO COMMERCIO é a folha de maior circulação”.
Nota-se
uma divisão logo na primeira página, estando o lado esquerdo
destinado à publicação de anúncios, com
o título ‘avisos úteis’
(vendas, aluguel de casas e produtos diversos); o
centro para a publicação gravuras e fotografias, estas últimas
mais comuns a partir de 1913; e o lado direito para a publicação de
alguns artigos, de notas do colunismo social (aniversários,
nascimento, visitas e óbitos), de notícias meteorológicas e dos
principais eventos do dia. A partir de 1912-13, o artigo em destaque,
na verdade uma série de publicações, era o Ouro
Negro,
publicado por Armindo R. da Fonseca, comerciante da praça de Manaus
que acompanhava todos os desdobramentos do comércio internacional de
borracha, instável naqueles
últimos anos.
Na
segunda página são publicados os informes sobre teatros, clubes e
cinemas; a coluna ‘os buliçosos’, sobre furtos e roubos; as
‘Queixas do Povo’, reclamações dos mais variados tipos
(críticas a serviços públicos, ao estado das ruas, das moradias
etc) vindas de diferentes pontos da cidade; as ‘Várias’,
publicações rápidas e resumidas; os ‘Ineditoriais’, parte do
jornal vendida para a publicação de informações de terceiros; os
‘Actos funebres’, notas sobre velórios, enterros e missas de
sétimo dia; e mais alguns anúncios de estabelecimentos comerciais.
Na terceira página é publicada a coluna ‘Bastidores da política’,
sobre os desfechos de administrações federais e estaduais,
eleições, deposições e revoltas; e
artigos diversos sobre acontecimentos internacionais e em outras
partes do país, em sua maioria pitorescos. Essa página é dividida,
sendo a parte de cima para as publicações anteriormente citadas e a
debaixo para anúncios, poesias e contos. A quarta página é
dedicada exclusivamente à publicação de anúncios de produtos e
estabelecimentos comerciais, bem como para a continuação dos poemas
e contos.
A
página cinco tem a mesma divisão da primeira página, sendo
diferentes apenas alguns elementos. Do lado esquerdo, anúncios de
vendas, de aluguel de casas e de produtos variados. Do lado direito,
mais alguns anúncios, só que agora trabalhados iconograficamente.
No centro, as informações telegráficas ‘O que vae pelo mundo’,
trazendo notícias sobre a capital federal e outros estados, e de
países como Portugal, França e Reino Unido, e a entrada e saída de
embarcações. Na parte de baixo, mais anúncios e a continuação de
contos de edições passadas.
Na
sexta página são publicadas informações detalhadas sobre o
comércio, a indústria, as finanças e a navegação, a
cotação de gêneros alimentícios, a cotação da bolsa, das taxas
de câmbio de instituições financeiras como o London Bank, o Banco
do Brasil e o Banco Amazonense, as pautas estabelecidas pela
Alfândega, pela Associação Comercial e pelo Tesouro do Estado, os
preços das estivas, a arrecadação da alfândega, a variação de
preços da borracha, a
relação de funcionários em serviço na Alfândega, o boletim da
Associação Comercial, o movimento de embarcações no porto e a
entrada e saída de passageiros. As páginas sete e oito são
voltadas exclusivamente para a publicação de anúncios.
Para
uma análise mais teórica desse periódico, destaca-se, em um
primeiro momento, a divisão espacial das matérias. É fácil
perceber o peso dos anúncios dos estabelecimentos comerciais da
capital no jornal, estando estes dispostos do lado esquerdo e do lado
direito das páginas, quando não utilizados em páginas inteiras,
tornando-os bastante visíveis aos leitores. Isso
revela o forte caráter comercial do periódico.
No
centro, em tamanho grande, uma fotografia, elemento visual que também
auxilia a dar destaque ao periódico.
Quanto
ao conteúdo jornalístico, o maior artigo é o do comerciante
Armindo R. da Fonseca, ‘Ouro
Negro’,
no qual o autor trata da situação da borracha brasileira e do
cenário desolador que o comércio desta estava enfrentando frente
aos preços praticados por negociantes do Reino Unido. O desta edição
era o 18° artigo sobre a mesma temática, comércio gomífero, todos
assinados por Armindo R. da Fonseca. O
plano 'Defesa Econômica da Borracha', criado
em 1912, ficou
sediado no Rio de Janeiro, distante da região problema. Foram feitos
gastos exorbitantes em compras e pesquisas desnecessárias, o que fez
o Congresso dar fim ao plano em 1913. Armindo
faz críticas a esse projeto.
Quando do início da Primeira Guerra Mundial, quando
algumas rotas comerciais foram temporariamente fechadas e os preços
caíram mais bruscamente, os
artigos ganhariam um tom mais dramático.
A
historiadora Maria
Helena Capelato chama a atenção para a utilização desses
artifícios, que eram “empregados tanto com objetivos de lucro,
como para fins políticos” (CAPELATO,
1988, p. 16). Dessa forma, deve-se refletir sobre o uso, em boa parte
do periódico, de anúncios e propagandas de produtos e casas
comerciais, uma
das possíveis fontes de lucro do Jornal do Comércio, assim como de
outros periódicos, revelando também sua teia de relações com a
elite política e empresarial da região,
bem como o impacto das publicações dos artigos sobre a crise do
mercado gomífero.
Das
cinco grandes linhas da imprensa brasileira ao longo dos séculos, o
Jornal do Comércio aparenta estar inserido entre as linhas do
jornalismo político e do jornalismo informativo, surgidas entre fins
do século XIX e início do século XX. Sobre esse período no
Amazonas e a influência na imprensa, diz Santos et al:
Na
medida em que o Amazonas vai aumentando o volume produzido de borracha
exportada para a Europa e os Estados Unidos, equipamentos mais
modernos de impressão são importados, e com eles, tipógrafos,
sobretudo portugueses. Mas a imprensa nem sempre correspondeu
plenamente à velocidade da informação que a nova situação
exigia. O “fumaréu”
de incenso continuava “turibulando
muitos governos”,
com o surgimento de jornais – em geral de edição única –
destinados a homenagear as autoridades (SANTOS, 1990,
p. 19)
O
Jornal do Comércio, por suas articulações políticas com as elites
locais e pelo caráter político e informativo, rompeu com essa linha
de elogios particulares dispensados diretamente às autoridades
políticas da região. No entanto, como todo periódico e outro tipo
de fonte, deve ser visto a partir da luz da crítica interna, sem ser
tomado como uma parte objetiva do passado, uma informação que vale
por si mesma, devendo ser buscada as relações no momento em que
essa documentação foi produzida.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS:
CAPELATO,
Maria Helena. Imprensa
e História do Brasil.
São Paulo: Contexto/Edusp, 1988.
SANTOS,
Francisco Jorge et al. Cem
Anos de Imprensa no Amazonas (1851 – 1950) – catálogo de
jornais.
Manaus, 1990.
CRÉDITO DA IMAGEM:
Acervo da Prof. Dra. Maria Luiza Ugarte Pinheiro
um pouco da nossa história 😙😙😙
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