Para
falarmos do início da caminhada do Cristianismo na Idade Média,
precisamos voltar um pouco ao passado, mais precisamente entre o
início e o final do século IV. Nesse período, duas datas são
importantes para que
essa
religião originária do judaísmo
ganhe o status de que desfrutará séculos depois:
O ano de 312, quando o imperador Constantino se converte, por razões
políticas, ao cristianismo, e cessa as perseguições contra os
praticantes desse culto; e 392, quando o imperador Teodósio torna o
paganismo ilegal e transforma o cristianismo em única religião
praticável no Império.
Paz
e legalidade. O Cristianismo tinha, agora, um terreno favorável para
se expandir pelo Império e outras áreas fronteiriças.
Aproveitando-se das antigas estruturas imperiais, a Igreja vai se
consolidando como um elemento de força local, por meio das dioceses,
antiga unidade administrativa de uma cidade ou uma província
governada pelo legatus. As dioceses, que possuem o aval do
imperador para funcionar, são governadas pelo bispo, que tem em sua
mão uma grande extensão urbana e rural. Em regiões que foram
romanizadas no passado, como a Itália e a Gália do Sul, surgem
redes densas de pequenas dioceses. Ao Norte, onde a malha urbana era
mais antiga, as dioceses são menos numerosas e mais extensas.
Cristo retratado como um imperador, usando vestes militares. Mosaico em Ravena.
Politicamente
e ideologicamente, os imperadores romanos passam a se favorecer com o
novo culto, associando suas imagens com a de Jesus Cristo, igual como
ocorria no culto pagão, com uma divindade principal do panteão.
Dessa época, existe uma rica iconografia que atesta essa associação.
O
Império já não é mais uma ameaça para os cristãos. Porém,
surge um novo inimigo: os povos germânicos que começam a atravessar
as fronteiras são, em sua maioria, pagãos. Mesmo os que já estavam
convertidos representavam uma ameaça, como os Visigodos, ostrogodos
e vândalos, seguidores do Cristianismo Ariano, considerado uma
heresia pela população e pelo clero dos locais onde se instalavam.
Clóvis, que unificou o povo franco sob um reino, converteu-se ao
catolicismo em 508, recebendo, com isso, apoio dos bispos em suas
campanhas militares contra os visigodos arianos. Recaredo, rei da
Espanha visigótica, se converte ao catolicismo em 587.
São Patrício, missionário e padroeiro da Irlanda.
O
paganismo perdura por um bom tempo no Noroeste da Europa. No século
V foi realizada uma missão para evangelizar a ilha Irlanda. Mesmo
penetrando a região nesse século, o Cristianismo só se tornará a
religião oficial da ilha no final do século VI. No continente, o
passado pré-cristão dá lugar a uma mistura original entre uma
cultura romano-cristã (externa) e a uma cultura celta (local).
Pagão
ganha o sentido que conhecemos nos dias de hoje. Mas, ainda sim, de
acordo com os escritos Orósio, ele é o homem do campo. O paganismo
é considerado um culto rural atrasado, visto com desprezo pelos
homens da cidade. Para os cristãos, os deuses antigos existem, mas
não são divindades, e sim demônios que precisam ser caçados. Essa
associação marcará a propagação da nova religião contra o
paganismo. O batismo funciona como uma das formas para renegar satã
e expulsar essa forças diabólicas. O exorcismo é praticado em
larga escala pelos clérigos. Soma-se a essas práticas a destruição
de antigos templos politeístas.
É necessária a dessacralização da natureza e a valorização do
elemento humano. O culto dos santos cumpre a função de substituir
os antigos elementos pagãos presentes na natureza. O culto dos
santos se mostra uma arma poderosa na luta contra o paganismo, pois
torna o processo de conversão mais maleável, dessacralizando
antigos símbolos pagãos e substituindo-os por imagens cristãs. São
frequentes as iconografias de santos abatendo bestas.
O
processo de conversão ocorre de forma lenta nos reinos anglo-saxões.
A primeira missão evangelizadora foi enviada à região em 597, por
ordens de Gregório, o Grande. O rei de Kent, Etelberto, assim como
milhares de anglos, é batizado. O rei assemelha o momento à figura
de Constantino, que se converte após receber um sinal de Deus na
Batalha da Ponte Mílvia. O desafio da missão é encontrando em
Edwin, rei de Northumbria, que se converte apenas em 628. Em 632, ano
de sua morte, o Cristianismo entra em ruína em seu reino. Na
História eclesiástica do povo inglês, de 731, o Venerável
Beda relata que o processo de conversão da Bretanha insular foi
concluído, ou seja, dois séculos após o início do processo.
O Batismo da Polônia, de Jan Matejko.
O avanço do Cristianismo no Norte é ainda mais lento. Vilibrodo, no
fim do século VII, inicia a conversão dos frisões situados no
Norte da Gália, consolidando uma zona fronteiriça para os soberanos
francos. Bonifácio, com apoio dos reis francos e do pontífice
romano, é enviado como bispo missionário das igrejas da Germânia,
favorecendo-se das campanhas militares dos francos contra os saxões
do Leste, pagãos. Consegue estabelecer a religião na Bavária e na
renana, onde funda o monastério de Fulda. As conquistas de Carlos
Magno vão assegurar de fato a conversão dos saxões.
O Cristianismo triunfa na Europa no século X, quando são
convertidas as últimas regiões com focos de cultos pagãos. A
Polônia é convertida em 966; o rei Estevão I, da Hungria, é
batizado em 985; Haroldo Dente Azul, da Dinamarca, é batizado em
960; Olavo Tryggveson da Noruega em 995, e Olavo da Suécia em 1008.
Por um referendo popular, a Islândia se converte no ano 1000.
FONTE:
BASCHET, Jérôme. A Civilização Feudal: Do ano mil à colonização da América. São Paulo: Globo Editora, 2006.
CRÉDITO DAS IMAGENS:
commons.wikimedia.org
thehistoryofthebyzantineempire.com
http://polishpoland.com/
Na verdade as últimas regiões convertidas ao cristianismo na Europa foram os países bálticos (atuais Lituânia, Letônia, Estônia e antiga Prússia Oriental), entre os séculos XII e XIII. https://en.wikipedia.org/wiki/Northern_Crusades
ResponderExcluirObrigado, Vitor. Acredito que o Baschet se refira apenas à Europa Central e a do Norte.
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