sábado, 10 de fevereiro de 2018

O destino dos antigos bondes elétricos de Manaus


Uma das principais dúvidas dos leitores das páginas sobre a história da cidade é o destino de seus antigos bondes elétricos, que pararam de circular em 1957, e dos quais se tem como lembranças os trilhos em algumas áreas do Centro, os inúmeros registros em cartões-postais e os relatos dos que chegaram a utilizar esse meio de transporte. O pesquisador Ed Lincon, para ajudar a sanar essa questão, recuperou duas matérias, uma de 1960 do falecido jornalista Irizaldo Godot intitulada Cemitério de Bondes!, e uma de 1995 da jornalista Etelvina Garcia com o título Por que os bondes desapareceram? Nos dois textos, de décadas diferentes, temos um panorama do funcionamento desse meio de transporte, das tentativas de sua recuperação e o seu destino nada animador.


Cemitério de Bondes
Coletivos Elétricos Abandonados na Garagem como Ferro velho – Recuperação de Fachada – História de Uma das Mais Fantásticas Burlas Infligidas ao Povo.


Está definitivamente afastada a hipótese de Manaus voltar a possuir bondes no seu sistema de transporte coletivo. Os elétricos que tanto bons serviços prestaram a população, hoje não passam de um montão de ferro velho sem nenhuma utilidade, servindo apenas para comprovar a criminosa atuação de administradores sem escrúpulos e sem responsabilidade, que deixaram destruir um patrimônio considerado do mais alto valor.

A história relacionado com os transportes elétricos nestes últimos anos, principalmente depois de um trabalho de recuperação que se pretendeu fazer, com alardes e foguetórios, e até com um governador transformado em motorneiro, nos mostra fatos que denunciam criminosa irresponsabilidade. Isso, principalmente, pelo caráter político emprestado à coisa que se tinha como certo o seu efeito nas massas, tinha por igual, a certeza de gastos desnecessários numa das mais fantásticas burlas ao povo deste Estado.

Iremos aos poucos até atingir esse ponto culminante da história dos bondes.


Instalação dos primeiros bondes

Os primeiros bondes que circularam em Manaus foram adquiridos no governo de Eduardo Ribeiro, o “Pensador” e a sua instalação deu-se no governo de Fileto Pires. O primeiro fato histórico relacionado com o sistema de transportes recém-introduzido na capital do Estado, foi o de terem os bondes formado o cortejo fúnebre que conduziu Eduardo Ribeiro à sua última morada, justamente aquele governante que adquirira a frota popular. E a sua exploração coube a firma Travassos & Maranhão, que antecedeu a empresa inglesa The Manáos Tramways And Light Co. Ltda.

O serviço de bondes era feito por 45 veículos, considerados da mais alta qualidade e qualificados como os melhores do Brasil.

Mas, os anos foram passando, o material desgastando e o serviço tornando-se ineficaz até que poucos ou quase nenhum bonde era empregado no transporte coletivo.


Recuperação ou Golpe Político

Em 1955, quando era administrador dos Serviços Elétricos do Estado o engenheiro Carlos Eugênio Chauvin, foi determinado pelo governador da época, que se procedesse a recuperação dos bondes parados e amontoados na sub-usina da Cachoeirinha*.

Não se tratava de uma recuperação verdadeira, mas, apenas, de uma manobra de caráter político que serviria tão somente para projetar o Executivo como órgão realmente interessado em trabalhar pela solução dos problemas que afligiam a população, e dentre os quais figurava em plano de destaque o dos transportes coletivos.

Verdade é que essa recuperação, que se fosse concretizada em toda a sua plenitude, não seria mais que o cumprimento de uma obrigação do Governo, não passou de uma simples pintura. Na parte ligada ao maquinário, pequenos reparos foram feitos pelos próprios empregados das oficinas dos Serviços Elétricos do Estado, apenas com a supervisão técnica do engenheiro Carlos Eugênio Chauvin. E cada bonde, supostamente recuperado custou aos cofres públicos importância superior a 50 mil Cruzeiros.

Cada bonde que saía das oficinas ensejava uma nova festa. O próprio Governador, entusiasmado com os efeitos políticos desse trabalho abandonou o seu gabinete para, de quepe na cabeça, dirigir pelas ruas da cidade o bonde n° 40 (a dezena é pura coincidência).

Acontece que apenas quatro ou cinco bondes foram recuperados. Quando se anunciava a saída de um carro, outro era recolhido já imprestável. Os poucos bondes que trafegavam com a nova pintura, não prestaram serviço por mais de 3 meses, quando voltaram, definitivamente para o ferro velho de onde haviam saído. O mérito dessa recuperação foi permitir que a Companhia mantivesse em serviço ativo, motoristas e cobradores, transferindo a responsabilidade sobre os mesmos para a Companhia de Eletricidade de Manaus e obrigando que essa Companhia de economia mista se veja, atualmente em dificuldade para indenizar funcionários para os quais não há serviço e cuja indenização é da ordem de 13 milhões de Cruzeiros ou mais.


Da Pena a Situação

Da pena verificar a situação em que se encontram atualmente, recolhidos na sub-usina da Cachoeirinha, os bondes que tantos e tão bons serviços prestaram a coletividade. Nada mais resta dos mesmos. Suas máquinas, Trolleys, fios, material em cobre e metal, tudo foi vendido ou desviado. Atente-se para o fato de que referido material foi adquirido na Inglaterra, sendo mesmo considerado produto que hoje não mais se fabrica.

Houve mesmo uma firma local que arrematou quase tudo como se o importante acervo da Companhia de Eletricidade de Manaus estivesse sendo leiloado.

Enfim, desapareceram os bondes da circulação. Se a Companhia de Eletricidade de Manaus desejar explorar o transporte coletivo, como prevê, aliás, o seu Estatuto, terá que recorrer para ônibus elétricos. E isso se não conseguirem tirar antes, os fios de alta-tensão que servirão para acionar aqueles veículos.

* No local funciona o prédio da Eletrobras Distribuição Amazonas, no final da Avenida Sete de Setembro.

Irizaldo Godot

A Crítica, 11 de abril de 1960.





Por que os bondes desapareceram?
Etelvina Norma Garcia*


Lembro de uma reportagem de página inteira que o nosso colega Irizaldo Godot (falecido), meu chefe de redação nos jornais da empresa Archer Pinto, publicou, no começo dos anos 50 (começo dos anos 60, observação nossa), na edição do “Diário da Tarde”. Título: Cemitério dos Bondes. Ele fez uma denúncia grave e séria da criminosa situação dos bondes, abandonados a céu aberto na chamada sub-usina da Cachoeirinha, lá no fim da Sete de Setembro.

Infelizmente, porém, Manaus não é uma caixa de ressonância eficiente para esse tipo de denúncia, que acaba tendo o efeito contrário. Ou seja, desperta a atenção dos vândalos, dos desonestos… E os bondes se acabaram, foram desmontados peça a peça, e transportados em pedacinhos para os fornos privilegiados das metalúrgicas…

Com eles acabou-se um pedaço delicioso da história social de Manaus. Chegamos a ter uma frota de cerca de 60 bondes, com 46 ou 47 em plena circulação, limpos, ágeis, elegantes, correndo nos trilhos com pontualidade britânica… Saíam da Praça do Comércio, depois chamada Oswaldo Cruz, onde ficava o prédio da Manáos Tramways, com seu relógio sorridente, que abria um olho e fechava o outro, tinha cheiro de pipoca e gosto de sorvete Mimosa…

Alguns bondes tinham uma só lança, eram pequenos, faziam as linhas mais curtas – Saudade, Nazaré-Remédios, Fábrica de Cerveja. Outros, os grandes, tinham duas lanças e faziam os percursos mais longos, os chamados “circulares”.

O Governador Plínio Coelho tentou botar os bondes nos trilhos outra vez, mas o sistema gerador de energia elétrica estava falido. Deles, agora, de concreto mesmo, só alguns pedaços de trilho que teimam em empurrar o asfalto e voltar a aparecer…

*Etelvina Norma Garcia é jornalista

A Crítica, 19 de março de 1995




2 comentários:

  1. E qual é a finalidade de mostrar um pedaço de trilho ente a av. eduardo ribeiro e a rua dez de julho? Só serve mesmo para atravancar mais o trânsito caótico desta cidade.

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  2. Manter os bombes é manter a História da nossa cidade viva.

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