Uma
das principais dúvidas dos leitores das páginas sobre a história
da cidade é o destino de seus antigos bondes elétricos, que pararam
de circular em 1957, e dos quais se tem como lembranças os trilhos
em algumas áreas do Centro, os inúmeros registros em
cartões-postais e os relatos dos que chegaram a utilizar esse meio
de transporte. O pesquisador Ed Lincon, para ajudar a sanar essa
questão, recuperou duas matérias, uma de 1960 do falecido
jornalista Irizaldo Godot intitulada Cemitério de Bondes!, e
uma de 1995 da jornalista Etelvina Garcia com o título Por que os
bondes desapareceram? Nos dois textos, de décadas diferentes,
temos um panorama do funcionamento desse meio de transporte, das
tentativas de sua recuperação e o seu destino nada animador.
Cemitério
de Bondes
Coletivos
Elétricos Abandonados na Garagem como Ferro velho – Recuperação
de Fachada – História de Uma das Mais Fantásticas Burlas
Infligidas ao Povo.
Está
definitivamente afastada a hipótese de Manaus voltar a possuir
bondes no seu sistema de transporte coletivo. Os elétricos que tanto
bons serviços prestaram a população, hoje não passam de um montão
de ferro velho sem nenhuma utilidade, servindo apenas para comprovar
a criminosa atuação de administradores sem escrúpulos e sem
responsabilidade, que deixaram destruir um patrimônio considerado do
mais alto valor.
A
história relacionado com os transportes elétricos nestes últimos
anos, principalmente depois de um trabalho de recuperação que se
pretendeu fazer, com alardes e foguetórios, e até com um governador
transformado em motorneiro, nos mostra fatos que denunciam criminosa
irresponsabilidade. Isso, principalmente, pelo caráter político
emprestado à coisa que se tinha como certo o seu efeito nas massas,
tinha por igual, a certeza de gastos desnecessários numa das mais
fantásticas burlas ao povo deste Estado.
Iremos
aos poucos até atingir esse ponto culminante da história dos
bondes.
Instalação
dos primeiros bondes
Os
primeiros bondes que circularam em Manaus foram adquiridos no governo
de Eduardo Ribeiro, o “Pensador” e a sua instalação deu-se no
governo de Fileto Pires. O primeiro fato histórico relacionado com o
sistema de transportes recém-introduzido na capital do Estado, foi o
de terem os bondes formado o cortejo fúnebre que conduziu Eduardo
Ribeiro à sua última morada, justamente aquele governante que
adquirira a frota popular. E a sua exploração coube a firma
Travassos & Maranhão, que antecedeu a empresa inglesa The Manáos
Tramways And Light Co. Ltda.
O
serviço de bondes era feito por 45 veículos, considerados da mais
alta qualidade e qualificados como os melhores do Brasil.
Mas,
os anos foram passando, o material desgastando e o serviço
tornando-se ineficaz até que poucos ou quase nenhum bonde era
empregado no transporte coletivo.
Recuperação
ou Golpe Político
Em
1955, quando era administrador dos Serviços Elétricos do Estado o
engenheiro Carlos Eugênio Chauvin, foi determinado pelo governador
da época, que se procedesse a recuperação dos bondes parados e
amontoados na sub-usina da Cachoeirinha*.
Não
se tratava de uma recuperação verdadeira, mas, apenas, de uma
manobra de caráter político que serviria tão somente para projetar
o Executivo como órgão realmente interessado em trabalhar pela
solução dos problemas que afligiam a população, e dentre os quais
figurava em plano de destaque o dos transportes coletivos.
Verdade
é que essa recuperação, que se fosse concretizada em toda a sua
plenitude, não seria mais que o cumprimento de uma obrigação do
Governo, não passou de uma simples pintura. Na parte ligada ao
maquinário, pequenos reparos foram feitos pelos próprios empregados
das oficinas dos Serviços Elétricos do Estado, apenas com a
supervisão técnica do engenheiro Carlos Eugênio Chauvin. E cada
bonde, supostamente recuperado custou aos cofres públicos
importância superior a 50 mil Cruzeiros.
Cada
bonde que saía das oficinas ensejava uma nova festa. O próprio
Governador, entusiasmado com os efeitos políticos desse trabalho
abandonou o seu gabinete para, de quepe na cabeça, dirigir pelas
ruas da cidade o bonde n° 40 (a dezena é pura coincidência).
Acontece
que apenas quatro ou cinco bondes foram recuperados. Quando se
anunciava a saída de um carro, outro era recolhido já imprestável.
Os poucos bondes que trafegavam com a nova pintura, não prestaram
serviço por mais de 3 meses, quando voltaram, definitivamente para o
ferro velho de onde haviam saído. O mérito dessa recuperação foi
permitir que a Companhia mantivesse em serviço ativo, motoristas e
cobradores, transferindo a responsabilidade sobre os mesmos para a
Companhia de Eletricidade de Manaus e obrigando que essa Companhia de
economia mista se veja, atualmente em dificuldade para indenizar
funcionários para os quais não há serviço e cuja indenização é
da ordem de 13 milhões de Cruzeiros ou mais.
Da
Pena a Situação
Da
pena verificar a situação em que se encontram atualmente,
recolhidos na sub-usina da Cachoeirinha, os bondes que tantos e tão
bons serviços prestaram a coletividade. Nada mais resta dos mesmos.
Suas máquinas, Trolleys, fios, material em cobre e metal, tudo foi
vendido ou desviado. Atente-se para o fato de que referido material
foi adquirido na Inglaterra, sendo mesmo considerado produto que hoje
não mais se fabrica.
Houve
mesmo uma firma local que arrematou quase tudo como se o importante
acervo da Companhia de Eletricidade de Manaus estivesse sendo
leiloado.
Enfim,
desapareceram os bondes da circulação. Se a Companhia de
Eletricidade de Manaus desejar explorar o transporte coletivo, como
prevê, aliás, o seu Estatuto, terá que recorrer para ônibus
elétricos. E isso se não conseguirem tirar antes, os fios de
alta-tensão que servirão para acionar aqueles veículos.
* No local funciona o prédio da Eletrobras Distribuição Amazonas, no final da Avenida Sete de Setembro.
* No local funciona o prédio da Eletrobras Distribuição Amazonas, no final da Avenida Sete de Setembro.
Irizaldo Godot
A
Crítica, 11 de abril de 1960.
Por
que os bondes desapareceram?
Etelvina
Norma Garcia*
Lembro
de uma reportagem de página inteira que o nosso colega Irizaldo
Godot (falecido), meu chefe de redação nos jornais da empresa
Archer Pinto, publicou, no começo dos anos 50 (começo dos anos 60,
observação nossa), na edição do “Diário da Tarde”. Título:
Cemitério dos Bondes. Ele fez uma denúncia grave e séria da
criminosa situação dos bondes, abandonados a céu aberto na chamada
sub-usina da Cachoeirinha, lá no fim da Sete de Setembro.
Infelizmente,
porém, Manaus não é uma caixa de ressonância eficiente para esse
tipo de denúncia, que acaba tendo o efeito contrário. Ou seja,
desperta a atenção dos vândalos, dos desonestos… E os bondes se
acabaram, foram desmontados peça a peça, e transportados em
pedacinhos para os fornos privilegiados das metalúrgicas…
Com
eles acabou-se um pedaço delicioso da história social de Manaus.
Chegamos a ter uma frota de cerca de 60 bondes, com 46 ou 47 em plena
circulação, limpos, ágeis, elegantes, correndo nos trilhos com
pontualidade britânica… Saíam da Praça do Comércio, depois
chamada Oswaldo Cruz, onde ficava o prédio da Manáos Tramways, com
seu relógio sorridente, que abria um olho e fechava o outro, tinha
cheiro de pipoca e gosto de sorvete Mimosa…
Alguns
bondes tinham uma só lança, eram pequenos, faziam as linhas mais
curtas – Saudade, Nazaré-Remédios, Fábrica de Cerveja. Outros,
os grandes, tinham duas lanças e faziam os percursos mais longos, os
chamados “circulares”.
O
Governador Plínio Coelho tentou botar os bondes nos trilhos outra
vez, mas o sistema gerador de energia elétrica estava falido. Deles,
agora, de concreto mesmo, só alguns pedaços de trilho que teimam em
empurrar o asfalto e voltar a aparecer…
*Etelvina
Norma Garcia é jornalista
A
Crítica, 19 de março de 1995
E qual é a finalidade de mostrar um pedaço de trilho ente a av. eduardo ribeiro e a rua dez de julho? Só serve mesmo para atravancar mais o trânsito caótico desta cidade.
ResponderExcluirManter os bombes é manter a História da nossa cidade viva.
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