Guilherme Aluízio de Oliveira Silva (1937-2019), muito antes de ser um grande empresário do ramo da comunicação, proprietário do centenário Jornal do Commercio de Manaus, foi jornalista, tendo iniciado sua carreira em 1955 aos 18 anos no extinto jornal A Gazeta, à época propriedade do político Arthur Virgílio Filho (1921-1987).
Nesse periódico atuou como repórter e redator, produzindo matérias de alta qualidade e grande repercussão, como a intitulada Dois gêneros de primeira necessidade provocam séria crise no consumo, em que registrou o desespero dos manauaras diante da falta de farinha de trigo e açúcar, o que gerou uma grave crise, sendo necessário o racionamento do pouco que ainda existia e do que era apreendido em fiscalizações nas imediações do porto. O problema só foi superado com a compra em grandes quantidades feitas pela COAP (Comissão de Abastecimento e Preços) em casas comerciais do Pará.
Além das matérias investigativas, notabilizou-se na produção de relatos de viagem. Comecemos por sua Excursão do Rio Negro a Nova Olinda. Nele descreve com riqueza de detalhes a viagem, realizada por iniciativa do Atlético Rio Negro Clube e da Petrobras, à cidade de Nova Olinda, onde estava sendo feita a prospecção de petróleo. Ele destacou, logo ao chegar, que os tripulantes da chatinha ‘Irineu Evangelista’ ficaram admirados “[…] com o muito que tem feito a Petrobras por aquela cidade madeirense, no que diz respeito às suas ruas em linha reta e nas bonitas construções erigidas quase que em plena selva”.
Posteriormente a essa passagem por Nova Olinda, recordou sua terra natal, Beruri, no texto Recordando o Berury. O lugar que Guilherme descreveu era modesto, com quatro ruas e cerca de 1000 habitantes, tendo como principais atividades econômicas o plantio, a colheita da castanha, a pesca e a indústria manual. A Petrobras estava em busca de petróleo nessas terras. “As esperanças do seu povo convergem para o ouro negro”, registrou o autor, “aquele mesmo que jorrou em Nova Olinda”. A partir desse ponto ele passa a exaltar a natureza e a vida bucólica de Beruri, em contraste com a correria e artificialismo das grandes cidades: “Pequenino lugar encravado no barro vermelho do Purus, que nos viu nascer, tu estás ausente das orgias da cidade, das noturnas bacanais, da “very kar society”. Não tens carros nem jipes atropeladores, esses monstros sob rodas que matam e atrofiam os pedestres. A vaidade, a descompostura e a falsidade não existem entre teus filhos. És esquecido, mas melhor que lembrado”.
Sua série de reportagens de viagens mais longa chama-se Belém em seis dias, dividida em seis partes. A estadia de seis dias na capital paraense ocorreu com contexto de estreitamento de laços entre os membros do Orbis Clube de Manaus, do qual Guilherme era membro, e o Orbis Clube de Belém. O Orbis era uma entidade social que congregava jovens de diferentes classes sociais e ocupações. Foi criada com os objetivos de garantir a educação gratuita, atividades culturais e o estudo e soluções de problemas sociais. Nos dias em que a comitiva do Orbis de Manaus esteve em Belém, tomou nota sobre diferentes aspectos da cidade, como o comércio, as indústrias, os pontos turísticos, a culinária e a vida social. Ao final de sua estadia afirmou o seguinte: “A Belém que nós vimos em seis dias, e que foi pintada por nós nestas reportagens, está bem nítida aos nossos olhos, e dêles ninguém tirará a impressão maravilhosa do que é a grande cidade – centro de um povo bom e amigo”.
Em 24 de janeiro de 1958 escreveu um belo texto em comemoração ao aniversário do jornal A Gazeta. Com título simples, Parabéns, “A Gazeta”!, descreveu de forma brilhante a trajetória de lutas do vespertino, fundado em 24 de janeiro de 1949. “Eram tempos”, escreve Guilherme, de “glórias alcançadas com o sacrifício e o esforço de um punhado de bravos jornalistas, que a tempo e hora se lançou numa tarefa, com um futuro ignorado, construindo e conceituando o grande jornal de hoje”. Nesta homenagem não citou apenas os colegas de redação, o Diretor Arthur Virgílio, o Secretário Caupolican Padilha e o Gerente Augias Gadelha, também deixando registrados os nomes dos funcionários que trabalhavam com o maquinário: Costa Novo, Nonato da Costa, Dalmo, Rebelo, Osmar, Solondino, Corrêa Lima, Francisca e Eduardo. Todos eram peças importantes para o dinamismo e qualidade ímpares do jornal.
Nesse período Guilherme tinha como companheiros de trabalho os jornalistas Milton de Magalhães Cordeiro, Wanderley Barbosa de Pinho, Júlio César da Costa, Aldévio Praia, Thomaz Tavares, Ulysses Oyarzabal (fotógrafo), Leonardo Parentes de Araújo, Benedito de Jesus Azêdo, Raimundo Nonato de Magalhães Cordeiro, Frânio Lima, Thomaz Meireles Neto, Guilherme Gadelha, Lenize Carvalho e Andréa Limongi.
Guilherme Aluízio foi um jovem que lutava bravamente por seus ideais, principalmente os que diziam respeito à educação. Foi um membro ativo da União dos Estudantes Secundaristas do Amazonas (UESA), chegando a candidatar-se à presidência da mesma, viajando para o interior do Estado para angariar votos dos colégios interioranos. Mesmo não sendo aluno do Colégio Estadual do Amazonas (Dom Pedro II), registrou de forma vibrante, no texto A Vitória que eu vi, a eleição do amigo jornalista do jornal A Tarde, Waldy Machado, para a presidência do Centro Estudantil Plácido Serrano, tendo como vice Manuel Luiz. Deve-se destacar, também, sua participação política como um dos oradores do Núcleo Central Pró Arthur Virgílio em 1958.
Sua vida social era rica. Foi membro dos principais clubes da cidade. No já citado Orbis Clube foi eleito Presidente em 1959. Sua posse foi realizada no dia em que o clube comemorou um ano de fundação. Estiveram presentes o Governador Gilberto Mestrinho, o Prefeito Lóris Cordovil e outras autoridades, bem como empresários de envergadura no Estado. No Atlético Rio Negro Clube fez parte da Juventude Rionegrina. Já no Ideal Clube atuou como Diretor de Imprensa do Boletim Social da casa. É em um desses boletins, de 1960, que figura um de seus mais belos textos, Num Mors... necrológio (elogio fúnebre) em homenagem ao Desembargador Emiliano Stanislau Affonso (1881-1960), então o único sócio-fundador do clube ainda vivo. A passagem do desembargador era uma “pêrda irreparável, lacuna impreenchível, ausência sentida”, mas sua “presença espiritual” jamais seria esquecida.
Guilherme deixou o jornalismo em 1960, quando começou a trabalhar nas empresas de seu pai, Álvaro Fachina da Silva (1908-2000). Ele foi um jornalista completo, escrevendo matérias investigativas, relatos de viagens, elogios fúnebres e atuando no meio político e social. Tal experiência, mais de duas décadas depois, resultaria na aquisição e modernização do Jornal do Commercio de Manaus.
Nenhum comentário:
Postar um comentário