terça-feira, 5 de abril de 2016

Animais e Seres Fantásticos da Idade Média

Por Viviane Huchard (1946-2005), historiadora francesa


Desde a narrativa do Gênesis, homem e animal caminham juntos em aventuras pela Terra. Na Antiguidade, o tempo era ritmado pelo zodíaco, e os animais eram alegorias de poderes superiores. No século II, foi publicada a primeira coletânea consagrada à descrição de bichos: o Physiologus. A obra se tornou a principal fonte do bestiário medieval.

Com a grande enciclopédia Etymologiae, de Isidoro de Sevilha, no século VII, o bestiário tomou forma "moral" e passou a servir como suporte de ensino doutrinal ou religioso. A partir do século XII, as obras em prosa de Pierre de Beauvais e o trabalho em verso de Guillaume le Clerc aumentaram a facilidade de assimilação dos simbolismos dos bestiário. Essa tendência continuou com a interpretação de Richard de Fournival, autor de Bestiários de amores, no qual os animais são usados para descrever comportamentos amorosos.

As principais coletâneas foram conservadas em bibliotecas de mosteiros e constituem repertório para escritores, ilustradores, escultores e pintores. A imaginação do homem, contudo, não se contentou com os bichos reais. Inventou "novas naturezas" para explicar o que não entendia. Assim surgiram os monstros semi-humanos, como a harpia e a mantícora, e bestas fabulosas, como o unicórnio.

Misturadas às figuras da Bíblia e aos heróis da Antiguidade, as representações de animais são exibidas nas fachadas das igrejas romanas e góticas, enfeitando seus portais ou capitéis. São Bernardo de Claraval cansou de clamar contra essas "figuras monstruosamente belas" das galerias do claustro de Saint-Denis, que só faziam distrair o monge de sua oração essencial.

O Combate de Alexandre

Alexandre da Macedônia inspirou uma epopeia fabulosa, traduzida e repetida em toda a Europa medieval. A ilustração figura na História do Grande Alexandre, um manuscrito francês do século XV (Museu Petit Palais, em Paris) que narra as aventuras do herói antigo (356 a.C. - 323 a.C.) em países exóticos, nos quais enfrenta animais fantásticos, como unicórnios e dragões. Imagem do cavaleiro valoroso, de espada e armadura, Alexandre enfrenta o lendário animal, cercado de seus fiéis escudeiros e de seu exército. A iluminura coloca o episódio como um combate da Guerra dos Cem Anos.



A Caça ao Unicórnio

O unicórnio não teme homem nenhum, e só é possível capturá-lo por meio de artifícios traiçoeiros. O caçador, depois de ficar longo tempo à sua espreita, escolheu uma jovem para seduzi-lo e pôde então capturá-lo. Na verdade, o desconfiado unicórnio só sossega sob os encantos de uma virgem. Despreocupado com sua segurança, adormece em paz sobre seus joelhos. As teologias vêem aí a prefiguração do Cristo, encarnando-se no seio da Virgem Maria. No coração de um jardim fechado, imagem do paraíso. A virgem radiante e aureolada está cercada de uma corte de santos e anjos.




O Basilisco

"Trata-se de uma besta com cabeça, pescoço e peito de galo, e corpo de serpente", diz o bestiário de Brunetto Latini. O basilisco ocupa um papel de rei dos répteis, podendo provocar a morte com apenas um sopro.








São Jorge e Lancelote

O dragão representa Satã, caçador infernal, que persegue os pecadores e os arrasta para o inferno. Segundo a lenda, Jorge, um capadócio nobre e rico, abateu os ídolos e destruiu o monstro que desolava a Líbia. No Ocidente, ele se tornou o patrono da cavalaria e das armas. É claro que o modelo dos cavaleiros, o valente Lancelote do Lago, personagem das lendas do rei Arthur, também não poderia deixar de enfrentar um dragão.












A Viagem de Alexandre

Entre as aventuras romanescas que a literatura medieval empresta ao conquistador antigo, tem lugar uma viagem ao paraíso terrestre, em que ele enfrenta animais fabulosos. Em um Oriente misterioso, javalis dividem espaço com unicórnios e dragões, hipopótamos carnívoros, morcegos gigantes e até serpentes com rosto de mulher. Em seu fogoso cavalo Bucéfalo, o herói grego segue um percurso vitorioso que o conduz de Tiro a Jerusalém, depois à Pérsia de Dario e até às Índias.

A Áspide

É um pequeno dragão, coroado por um carbúnculo, cuja mordida é fatal. Simboliza a prudência: quando teme estar sendo vítima de sortilégios de encantadores, ele aperta uma das orelhas contra o solo e tampa a outra com a cauda.






O Dragão

Síntese das invenções do homem medieval, ele reúne os poderes da serpente e do leão. É um dos maiores monstros do universo fabuloso, com uma cauda particularmente temível.











O Grifo

Corpo de leão com cabeça e asas de águia, o grifo pertence ao bestiário egípcio e persa, e também ao mundo medieval. O grifo toma formas múltiplas e instáveis, próprias para aterrorizar os homens. Ora leão, ora águia, ele alia as qualidades do rei dos animais às da rainha dos ares. Vivendo em um deserto rico em ouro, o grifo usa esse metal para construir seu ninho, escapando assim de todas as tentativas de captura. Essa lenda poderia ter suas origens nas minas de ouro encontradas na Rússia, principalmente nos Urais.



O voo de Alexandre

Os grifos têm a força de oito leões e de cem águias reunidos. Eles servem para puxar a nacela de Alexandre quando ele sobe em direção ao Sol, atraídos pelos pedaços de carne que o herói lhes oferece, na ponta de um bastão. Na mitologia grega, os grifos guardam os tesouros de Apolo na região lendária dos hiperbóreos, na Cítia.













A Mantícora antropófaga

Monstro de rosto quase humano, corpo de leão de pele vermelha e cauda de escorpião, a mantícora alimenta-se de carne humana. É um animal de uma crueldade assustadora, cujo nome vem de uma palavra persa que significa "comedor de homens". [...] O monstro assume o semblante de Satã, caçador de almas humanas.









FONTE:

HUCHARD, Viviane. O Fabuloso bestiário medieval. In: História Viva, n° 63, São Paulo, Duetto, 2009.

CRÉDITO DAS IMAGENS:

benedante.blogspot.com
pinterest.com
buzzfeed.com
britishlibrary.typepad.co.uk
lavondyss.net
bestiary.ca

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