sábado, 26 de agosto de 2017

História da Criminalidade: O Monstro da Colina

Há quem pense que falar em crimes antigos é depreciar o passado de uma cidade. Eu, enquanto historiador, não acredito no mito de um passado "ordeiro e glorioso". É uma constante das sociedades humanas idealizar o passado para criticar, por inúmeros fatores, o presente em que vivem. Ao abordar crimes antigos, mais do que analisar o caso em si, trabalha-se com as mentalidades de uma época, da sociedade que presenciou esses acontecimentos, estando esse tipo de estudo ligado à História social, História Cultural e História das Mentalidades. O Caso a seguir aconteceu em Manaus em 1976, marcando inúmeras gerações que dele ouviram falar.



O MONSTRO DA COLINA

O tradicional bairro de São Raimundo, localizado na zona Oeste da cidade, ficou marcado na década de 1970 pelo Caso do Monstro da Colina, ocorrido em 1976.

No dia 14 de novembro de 1976, o criminoso Wallace Barreto de Oliveira, de 19 anos, assassinou com requintes de crueldade o menor Carlos Andrade de Oliveira, de 14 anos. O crime ocorreu na rua 5 de Setembro. Até aquele momento os crimes mais comuns eram as brigas de rua, o desentendimentos entre casais e, vez ou outra, algum roubo. Assassinatos eram raros e deixavam a população abismada.

Rosalvo Reis, no texto 'Os "monstros" da cidade', publicado em 26 de junho de 1977 no Jornal do Commercio, afirma que Wallace Barreto, homossexual, estava apaixonado e tentava induzir Carlos Andrade de Oliveira ao mundo do crime. Carlos passou a evitar qualquer forma de contato com ele. Enfurecido e com ciúmes, este arquitetou sua vingança:

Na madrugada de 14 de novembro, invadiu a residência de Carlos, entrando em seu quarto. Os pais do menor, no momento, estavam ausentes. Estuprando o menor, Wallace, com uma faca, lhe fez novas propostas. Carlos, novamente, recusou todas. Wallace lhe golpeou mortalmente com uma facada na nuca. Depois, lhe estripou e decepou seu pênis, eliminando o cadáver em uma fossa na parte de trás da casa.

Capturado pelos familiares de sua vítima, passou por um longo processo judicial, com duração de pouco mais de quatro anos, sendo condenado a 23 anos de prisão. Sempre afirmou que não matou o menor, apontando como responsáveis pelo crime membros de uma quadrilha de traficantes de drogas, que também vitimou três taxistas, no caso conhecido como "Varadouro da Morte".

Um mês após a condenação, segundo consta no Jornal do Commercio de 29 de julho de 1980, escapou da penitenciária em 28 de julho de 1980, junto de seu companheiro, o arrombador Admilton Silva Pereira, atravessando a Praça 14 de Janeiro. A notícia de sua fuga causou pânico na cidade.

Wallace foi recapturado em 01 de agosto de 1980 no bairro de Santo Agostinho, junto de seu companheiro. Ambos confessaram à polícia que pagaram agentes penitenciários para terem a fuga facilitada. 

Classificado como deficiente das faculdades mentais, recebeu a liberdade condicional, passando a trabalhar no Tribunal do Júri Popular, de onde empreendeu nova fuga em 1984. Sem dinheiro, passou a praticar roubos e furtos, furtando uma máquina de datilografia da SECOM (Secretaria de Comunicação), no Aleixo. Foi recapturado com mais 17 criminosos. Tentou alegar sua deficiência mental, mas novos exames médicos atestaram que ele era um indivíduo são. Em 1985 fugiu outra vez da Penitenciária, formando uma gangue de menores que arrombou o Palácio da Justiça.

Capturado e levado para a Penitenciária Agrícola Anísio Jobim, passou a mostrar bom comportamento, recebendo um indulto do Presidente da República no dia 01 de abril de 1985. Foi preso novamente em 1986, acusado de roubo. Já estava com 29 anos. Que fim levou o Monstro da Colina? Parou de aparecer nas manchetes dos jornais em 1986. Se estiver vivo está com mais de 60 anos. Ele pode estar em seu bairro, caro leitor, caminhando tranquilamente, pensando em seu passado ou, quem sabe, no quarto de alguma casa da cidade lendo esse texto...


OUTRAS VERSÕES

Passados quatro anos da produção desse texto, surgiu uma pessoa com outra versão sobre esse caso:

A senhora Livônia Fournier, 61, afirma que Wallace é inocente. Ela conta que quando o assassinato de Carlos ocorreu ele estava em sua casa tocando violão, como costumava fazer. Se não foi Wallace o assassino, quem matou o menor Carlos? O autor do crime teria sido outra pessoa, pessoa essa que costumava extorquir Wallace e que acabou se livrando das acusações. A mãe de Livônia, dona Ruth, o visitou diversas vezes na cadeia. Ele, aos prantos, sempre dizia: "tia Ruth, você sabe que não fui eu que matei ele. Eu estava tocando violão na sua casa". A última vez que ouviu falar dele, soube que ele estava morando no bairro Compensa. Mas isso foi há muito tempo.



FONTES:

Jornal do Commercio, edições de 1976, 1977, 1978, 1979, 1980, 1984, 1985 e 1986.

IMAGEM: 

Wallace Barreto de Oliveira, o Monstro da Colina. Jornal do Commercio, 1976.

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