Mostrando postagens com marcador ideologia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador ideologia. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 30 de maio de 2017

500 anos da Reforma Protestante: Discursos sobre o movimento

Estátua de Martinho Lutero, em Washington (EUA). Obra do escultor alemão Ernst Friedrich August Rietschel (1884).

O presente texto, simples e livre de qualquer formalidade, não se pretende ser mais uma explicação sobre os processos que culminaram na Reforma Protestante, mas sim uma discussão sobre os reflexos desse evento em discursos contemporâneos, estando inserido no campo das mentalidades formadas sobre a Reforma, que completa 500 anos em 2017.

Sábado, 20 horas. Mudando aleatoriamente de canais, paro em um programa de uma emissora Protestante. Na pauta, dirigida pelo apresentador na companhia de dois teólogos, os 500 anos de um dos eventos mais importantes da Era Moderna: A Reforma Protestante. São cinco séculos de um movimento que moldou de forma significativa o panorama político e religioso do Ocidente e, dadas as influências posteriores, o mundo de forma geral.

No horário, o programa já estava bastante adiantado, mas o que foi assistido serviu de fonte para a produção desse artigo. Os dois teólogos afirmavam, com alegria, que “Lutero libertou a Europa da tirania da Igreja Católica” e que o “movimento renovou o Cristianismo”. Afirmações essas feitas com uma vivacidade que poderia fazer pensar se esses convidados não estiveram em Wittenberg, na Alemanha, em 1517, ajudando o monge agostiniano na propagação de suas ideias.

Uma semana depois, na universidade, ouvi nos corredores uma conversa entre dois estudantes. Ao que tudo indica, católicos praticantes, tanto pelo tom da conversa quanto pelos adereços, bótons de santos e terços. Um dizia que Lutero era um “herege” que dividiu o Cristianismo. Outro, no mesmo tom, via naquele monge agostiniano a figura que contribuiu para a proliferação de inúmeras “seitas sem unidade” que se arrastam até os dias de hoje. Bem que esses dois poderiam estar, em 1517, do alto do Castelo de Wittenberg vendo, sob protestos, Lutero pregar as 95 teses na porta da Igreja.

São comentários interessantes, um mais caloroso que o outro, mostrando como um evento de 500 anos permanece “vivo” na mente e no discurso de seus favoráveis e opositores do século XXI. A História é o campo de combate da memória. Ganha, geralmente, aquele que está atrelado ao Estado e às mais altas posições. No entanto, não estamos falando de grupos pequenos que lutam por suas memórias, mas sim de duas grandes e poderosas ramificações do Cristianismo, com milhões de adeptos ao redor do mundo. É uma disputa que parte do alto, disputa essa com reações imediatas ao evento.

Em fevereiro de 1518, o Papa Leão X, a pedido da Ordem dos Agostinianos, pediu para que as ideias de Lutero parassem de ser difundidas. O teólogo italiano Silvestro Mazzolini da Priero redigiu Um Diálogo contra as Teses Presuntivas de Martinho Lutero sobre o Poder do Papa. João Maier, amigo de Lutero, escreveu teses contra suas ideias, o considerando um herege estúpido, o que terminou por iniciar uma disputa teológica, o famoso Debate de Leipzig, que terminou sem vencedores. Por último, Martinho Lutero foi excomungado da Igreja Católica em 1521, quando queimou a Bula que oferecia ou a retratação ou a excomunhão.

Vejamos o que diz o padre Paulo Ricardo, figura famosa no meio religioso católico, no texto Por que não sou Protestante? Sobre a Reforma Protestante e seus agentes: “Os reformadores protestantes, como Martinho Lutero, João Calvino e Ulrich Zwinglio, vendo a triste situação em que se encontravam os homens da Igreja, quiseram empreender uma mudança, mas, no fim, acabaram mutilando a Igreja”. Conclusões semelhantes às dos dois estudantes anteriormente citados.

Para o pastor Paulo Júnior, em O que foi a Reforma Protestante? Afirma que “em uma época que o povo comum era privado da leitura das Escrituras e o papa liderava a cristandade com mãos de ferro, Lutero foi uma voz levantada por Deus para dar início a uma completa revolução espiritual na Alemanha. Lutero combateu os vários desvios doutrinários de sua época praticados pela Igreja Católica Romana, condenou veementemente a venda de indulgências, traduziu a Bíblia para o alemão e a colocou nas mãos do povo comum. Enfim, inflamou o coração de seus irmãos a uma busca sincera por Deus e o Cristianismo autêntico”.

Diferentes discursos, alguns do século XVI, outros do século XXI. Mesmo com inúmeros séculos de diferença entre uns e outros, eles possuem o mesmo objetivo: defender determinada visão de mundo. Os teólogos não estavam ao lado de Lutero na hora de fixar as 95 teses na porta da Igreja, nem os estudantes estavam do alto do castelo protestando contra a ação desse monge. Essas pessoas apenas defendem aquilo que lhes foi transmitido de determinada forma, oral ou escrita, dentro de uma visão religiosa de mundo. O curioso é observar como 500 anos depois o evento permanece vivo por meio da mentalidade e dos discursos sobre ele formados e propagados. É como se a qualquer momento Lutero ou o Papa Leão X fossem ressurgir e fazer uma observação: “não foi assim, pois eu estava lá”…


FONTES:

RICARDO, Paulo Pe. Por que não sou protestante? Disponível em: https://padrepauloricardo.org/episodios/por-que-nao-sou-protestante. Acesso em 28/05/2017.

JÚNIOR, Paulo Pr. O que foi a Reforma Protestante? Disponível em: https://defesadoevangelho.com.br/videos/o-que-foi-reforma-protestante/. Acesso em 28/05/2017.

CRÉDITO DAS IMAGENS:

commons.wikimedia.org


segunda-feira, 9 de maio de 2016

A produção historiográfica nos Estados Unidos entre 1940 e 1990

Entre 1940 e 1990, os principais ataques eram feitos à ideologia comunista.

O presente artigo é parte da minha resenha do capítulo IV do livro A História dos Homens, do historiador Josep Fontana. Esse capítulo, intitulado As Guerras da História, aborda como os embates ideológicos, travados com maior força desde a Segunda Guerra, influenciaram a produção historiográfica. Entre 1940 e 1990, travaram-se nos Estados Unidos embates violentos, que culminaram na instalação de um clima de vigilância contra o que era considerado nocivo à produção historiográfica:

As guerras da história se mostram mais violentas na outra parte do Mundo Ocidental, com maiores agravantes após a divisão ideológica causada pela Guerra Fria. Segundo Fontana, desde os anos 1930 se notam conflitos no ensino de História nos Estados Unidos, onde os livros que não se adequassem aos valores conservadores e patrióticos eram censurados e eliminados. A Associação Nacional de Manufaturas, nos anos 1940, possuía mais de 6.800 vigias locais, com a missão de manter a educação livre do perigo do coletivismo, que pode ser interpretado como Comunismo.

Após o fim da Primeira Guerra Mundial e a ascensão de duas forças antagônicas, Conservadorismo (representado pelos Estados Unidos) e Comunismo (representado pela URSS), os Estados Unidos passaram a atacar a história progressista de historiadores como Charles Beard e Carl Becker; e a elaborar uma história objetiva, que transmitisse ensinamentos morais. Nunca houve, nas palavras de Fontana, “uma associação tão íntima entre os historiadores e o poder que se estabeleceu nestes anos1. Historiadores de prestigiadas universidades passaram a trabalhar na CIA, na OSS, no Departamento de Estado e em outros órgãos do governo. A produção historiográfica que começava a se formar nesses anos de embates ideológicos visava não só a consolidação dos Estados Unidos como principal potência mundial e a defesa dos valores tradicionais americanos, mas também atendia ao interesse governamental sobre informações dos “inimigos”. Surgem sovietólogos, kremlinólogos, matérias universitárias sobre a Ásia e a Rússia. O historiador George Kennan fixa as linhas da política norte-americana em relação a URSS; e o professor emérito de História Russa, Richard Pipes, num primeiro momento, ataca o comunismo, para mais tarde, minar o estado de bem-estar social.

Aliava-se à história, nesse período, a sociologia, surgindo a sociologia histórica, que interpretava os fatos históricos a partir de modelos sociológicos esquemáticos. Também era produzida uma história erudita, representada por maciços trabalhos de compilação documental. Sociologia Histórica e História Erudita eram voltadas para o estudo de conflitos sociais e formas de evitá-los ou contê-los. Podem ser citadas as obras de Barrington Moore Jr., Charles Tilly e Theda Skocpol.

A repressão tornou-se constante no cenário intelectual americano. Livros considerados subversivos, com tendências pró-comunistas, eram censurados. A Daughters of the American Revolution chegou a denunciar 170 livros nessa categoria, que continham, por exemplo, expressões sobre coletividade, algo considerado pró-comunista. Esse clima repressivo permitiu o surgimento de uma história baseada na predestinação, na doutrina Destino Manifesto e em outros "talentos" considerados natos dos Estados Unidos. Não eram feitas menções à conquistas dos nativos, a grupos marginalizados e não eram feitas críticas sociais. Fontana, citando Gendzier, afirma que "voltava-se, ao mesmo tempo, à doutrina da objetividade, à rejeição da "ideologia" - isto é, das ideias dos outros - e da "construção social".2

Os Estados Unidos, representantes máximos do lado liberal da Guerra Fria, tinham de estender sua influência para outros países. Seus ideais eram difundidos através do Congresso pela Liberdade da Cultura (CCF), dirigido pela CIA e amparados por recursos provenientes do Plano Marshall. Eram financiadas revistas propagandistas dos ideais norte-americanos da Europa à Oceania: Na França, existiu a publicação preuves; na Grã-Bretanha, a EncounterCuadernos, na Espanha; Tempo Presente, na Itália; e outras de mesmo cunho na Austrália, Índia e Japão.

Outros campos do conhecimento humano passaram por transformações radicais dentro desse contexto. No campo das Artes, por exemplo, o realismo, vertente utilizada para popularizar as artes, é substituído pelo expressionismo abstrato. Essa vertente tem uma linguagem complexa, entendida apenas por uma pequena elite intelectual. As exposições dos artistas expressionistas abstratos eram financiadas pela CIA. No curso de Letras das universidades, língua e literatura passam a ser estudados sem se levar em conta o contexto social e histórico, apenas o conteúdo do texto. É um estudo elitista, que evita críticas tanto da direita quanto da esquerda. No estudo de Ciências Sociais, a National Science Foundation, pedia para aqueles que pediam apoio para seus estudos que evitassem qualquer ligação com reformas ou bem-estar social. Se o apoio viesse da iniciativa privada, os pedidos eram, por exemplo, que se evitassem pesquisas sobre relações de raça.

Dando um salto cronológico de quase 50 anos, Josep Fontana sai do período da Guerra Fria e entra nos anos 90, afirmando, no entanto, que a luta não terminou naqueles tempos de visível divisão ideológica. Nessa década, o presidente George W. Bush empreendeu uma grande reforma na educação dos jovens americanos, no qual estava incluído o conhecimento das “diferentes heranças culturais da nação”. A comissão encarregada da área da História teve uma tarefa árdua ao englobar uma gama de minorias presentes no país, numa tentativa de construir uma história verdadeiramente global. Os novos parâmetros de ensino ficaram prontos em 1994, e quase de imediato passaram a ser denunciados por grandes veículos de comunicação do porte de Wall Street Journal, que os acusavam “como uma conspiração para inculcar uma educação ao estilo comunista ou nazista, dentro de uma campanha contra o multiculturalismo e contra os “tenured radicals”: os professores “radicais” que se acreditava, sem fundamento algum, controlassem os ensinos de história, literatura ou antropologia nas universidades norte-americanas”3Emergiam novamente os conflitos da época da guerra, que de fato nunca foram superados.

As perseguições ao marxismo e seus simpatizantes continuava a funcionar com o mesmo mecanismo dos anos 40: os vigilantes e historiadores alinhados à classe dominante. O historiador David Abraham foi perseguido pelo também historiador Henry A. Turner; Norman Cantor atacava Lawrence Stone; Robert Conquest, que em seu último livro mostrara como as “ideias revolucionárias devastaram mentes, movimentos e países inteiros”, atacava o historiador inglês Eric Hobsbawm, autor de História do Século XX, livro bem aceito nos meios liberais britânicos.


1FONTANA, Josep. “As Guerras da História”. In: A História dos Homens. Bauru, (SP). p. 347.
2Ibidem, p. 353.
3Ibidem, p. 355-56.


CRÉDITO DA IMAGEM:

http://mccarthyism175.weebly.com/

domingo, 10 de janeiro de 2016

Grandes acervos - As Bibliotecas Conservadora e Marxista

Russel Kirk (1918-1994).

Na internet, encontramos ótimos acervos de diferentes formas de pensamento. O Portal Conservador (portalconservador.com) possui a maior biblioteca virtual de matriz conservadora em Língua Portuguesa. De acordo com o próprio portal "nem todos os autores são ditos conservadores; mas se aqui marcam presença, é em virtude pela qual se constitui como autor obrigatório nos anos de estudo a fio que marcam a mentalidade conservadora inspirada por nosso patrono, Russel Kirk e pela Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo". De forma simplificada, o acervo Conservador é composto por obras utilizadas por Russel Kirk em seus estudos e postulados do pensamento conservador.

O acervo é composto de autores clássicos do mundo cristão, os Doutores da Igreja, Santo Agostinho, Santo Anselmo e Santo Tomás de Aquino, além de conter obras gerais sobre História do Cristianismo, Teologia Católica e escritos dos Santos. Na área econômica, temos obras de Adam Smith, Jesus Huerta de Soto, Friedrich Hayek e Economia Geral. Os historiadores aparecem em peso. São eles: Hannah Arendt, Marc Bloch, Jacques Le Goff, Bóris Fausto, Michel de Certeau, Peter Burke, Paul Veyne e História Geral. Do Mundo Antigo temos Cícero, Aristóteles, Hesíodo, Homero e Platão. Em literatura estão disponíveis livros de Aldous Huxley, Clives Staples Lewis, William Shakespeare, Luís de Camões, Nelson Rodrigues e Fiodor Dostoievski.

Existem, claro, muitos outros autores. O acervo também guarda obras essenciais de Direito, Filosofia, História da Inquisição e da Idade Média. Alguns livros encontram-se traduzidos para o português, outros, no entanto, estão em inglês, francês e espanhol. O Portal Conservador está no Facebook, Twitter e no Youtube.

Karl Marx (1818-1883).

Na versão portuguesa do site Marxists Internet Archives - Arquivos Marxistas da Internet (www.marxists.org/portuguese), estão disponíveis para download livros, comentários e entrevistas de 201 autores do pensamento marxista. Militantes brasileiros famosos como Jorge Amado, Florestan Fernandes e Carlos Lamarca fazem parte do acervo. 

No campo histórico temos Eric Hobsbawm, Jacob Gorender, Pierre Bruoué, Edgard Carone, Jorge Abelardo Ramos e Edward Palmer Thompson. Entre os filósofos, Louis Althusser, Ludwing Fauerbach, Georg Hegel, Immanuel Kant, Friedrich Nietzsche F. Engels e Jean-Paul Sartre. Na economia, estão os nomes consagrados de Karl Marx e Max Weber. Figuras políticas também estão no acervo; Salvador Allende, João Amazonas, Ernesto Che Guevara, Yasser Arafat, Nikita Khrushchev, Kin II Sung etc.

O Arquivos Marxistas da Internet está no Facebook em forma de grupo público. A maior parte do acervo encontra-se em português, traduzidos por algumas universidades federais ou pessoas particulares.


Endereços - Portal Conservador (http://portalconservador.com/biblioteca/) e Arquivos Marxistas da Internet (www.marxists.org/portugues/biblioteca.htm).


CRÉDITO DAS IMAGENS:

acton.org
commons.wikimedia.org