Edward Gibbon (1737-1794).
Edward
Gibbon (1737-1794), historiador inglês autor de História do
Declínio e Queda do Império Romano,
foi um dos maiores representantes do período das “luzes”
inglesas. No que foi abordado sobre sua obra, referente ao papel do
Cristianismo no processo de declínio e queda do Império Romano,
pode-se fazer a seguinte análise sobre seu pensamento e produção
historiográfica:
Mais
do que se debruçar sobre o Império Romano e sua queda, e o papel do
Cristianismo nesse processo, Gibbon, dentro do espírito filosófico
característico das letras no século XVIII, traz em sua obra a
reflexão sobre a religião na época dos romanos e como esta se
encontrava no tempo em que vivia, fazendo uma ponte entre o mundo
antigo e o moderno.
Superstições,
milagres e outros eventos explicados de forma sobrenatural, são por
ele motivos de crítica. Não
só a superstição cristã, mas o paganismo também é visto por
Gibbon com maus olhos, por suas práticas como adivinhações,
sacrifícios e prostituição. Fé cega, espírito crítico, natureza
humana e religião são conceitos para ele opostos. Contra o “mundo”
sobrenatural o autor busca explicações naturais, físicas e
racionais.
Constantino,
uma das principais personagens para a Igreja, é analisado por
Gibbon,
assim como a Apostasia de Juliano e o culto dos santos, das relíquias
e o movimento monástico. No que se refere a Constantino, Gibbon
inicia sua análise desmistificando as visões divinas sobre sua
conversão; mostra as
contradições entre as fontes dos primeiros séculos da Igreja (A
História Eclesiástica de Eusébio de Cesareia); elucida a
influência dos contextos políticos, e não religiosos, nesse fato;
e conclui explicando o porque da sobrevida do paganismo logo após o
triunfo do Cristianismo (o autor afirma, primeiramente, que a
hipocrisia, pelo fato dos cristãos passarem a perseguir seus antigos perseguidores; e logo depois, as disputas entre cristãos partidários,
são as principais causas).
Ao abordar Juliano, o
Apóstata, único imperador romano que abandonou o Cristianismo e
voltou ao Paganismo, e
apresentar as causas para essa reconversão, Gibbon parece exprimir
na figura desse imperador suas próprias experiências pessoais: insubmissão, gosto pela
liberdade, denuncia da hipocrisia religiosa, interesse por disputas
religiosas e uma má administração da autoridade religiosa. Gibbon
deixa evidente seu gosto pela Mitologia Grega, afirmando que a
religião dos antigos permitia que seus seguidores “dosassem” sua
fé. A tolerância de Juliano
e sua aversão à violência são elogiados, enquanto o excesso dos
cultos pagãos, com seus sacrifícios e adivinhações, são
criticados. A superstição,
cristã ou pagã, é uma ameaça ao pensamento crítico do Iluminismo.
Depois
da Apostasia de Juliano o autor aborda o culto dos santos e das relíquias,
que, para ele, do reino de Constantino à Reforma de Lutero (século
4 d.C. ao século 16 d.C.), vem sendo um problema, pois a Igreja,
vendo a possibilidade de lucrar, começa a produzir relíquias em grande quantidade e, na maioria das vezes, falsas. A
destruição de antigos templos pagãos, a conversão forçada de
judeus e os milagres são motivos de lamentação e crítica.
Por
último, a barbárie representada pela religião cristã mostra sua
pior forma, para Gibbon, no movimento monástico. Os
monges, em nome de uma religião, se privam de liberdade, de modos e
de qualquer sinal de pensamento racional e
reflexivo. Gibbon
nutre grande aversão por essas personagens, que considera escravas
de regras inflexíveis. O elogio aos mosteiros surge quando ele
relata que estes locais, ao recuperar e copiar obras antigas como as
de Cícero e Tito Lívio, nas
línguas grega e latina,
contribuíram para o letramento dos povos bárbaros.
Depois
dessa breve elucidação sobre parte da obra História do
Declínio e Queda do Império Romano,
é preciso levar em conta, para compreender o pensamento histórico e
produção historiográfica de Gibbon, sua posição social e o
contexto no qual viveu:
Edward
Gibbon, burguês liberal da Inglaterra setecentista, preza a
liberdade de pensamento, a
tolerância, o espírito
crítico e o convívio social. A
análise histórica e humana da religião é uma continuidade da
história natural da religião, inaugurada pelo filósofo e
historiador britânico David Hume. O espírito filosófico de Gibbon
é evidente quando este, ao abordar as querelas religiosas dos
antigos, faz a reflexão para sua época e experiência pessoal
(controvérsias de Oxford). Gibbon
é um polemista, e suas
críticas são
dirigidas ao extremismo, fé
cega, hipocrisia (os cristãos que antes eram perseguidos se tornaram
os novos perseguidores) e à
autoridade religiosa (Igreja Católica) que
minava os direitos civis. Ele
era um cético, e aproveitava as oportunidades de tecer críticas ao
Cristianismo e, em certa
medida, ao paganismo. A
verdade, para esse autor, é relativa, e a natureza humana é fixa e
imutável. A novidade na
produção historiográfica de Gibbon fica no
seu exame crítico das fontes primárias, na leitura do Cristianismo como fator influenciador para a queda do Império, na contextualização e visão
abrangente dos eventos e sua importância para a história.
''A
História, esse quadro terrível dos crimes, das perversidades e das
desgraças do gênero humano'' - Edward Gibbon.
FONTES:
LOPES, Marcos Antônio. Ideias de História: tradição e inovação de Maquiavel a Herder. Londrina, EDUEL, 2007.
CRÉDITO DA IMAGEM:
nndb.com
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