segunda-feira, 28 de agosto de 2017

O Pensamento Político de Frei Bartolomé de Las Casas

Frei Bartolomé de Las Casas (1474-1566), Bispo de Chiapas, México.

Bartolomé de Las Casas (1474-1566) foi um frade dominicano espanhol que atuou na América durante o processo de conquista, no século XVI. Mas, mais que um frade dominicano, Las Casas pode ser considerado, dada a produção, a dimensão e a difusão de suas ideias, um pensador político que atuou tanto em defesa dos nativos americanos quanto na reflexão sobre a diversidade de poderes políticos existentes naquele momento.

Dois mundos entraram em choque quando do “descobrimento” da América. De um lado, uma sociedade unida pelos valores culturais e políticos da cristandade europeia. Do outro, um mundo que apresentava-se como novo, com outros povos e realidades distintas. O impacto foi grande, pois como escreveu o cronista Fernando López de Gómara em sua História Geral das Índias (1552) “a maior coisa depois da criação do mundo, tirando a encarnação e a morte de quem o criou, foi o descobrimento das Índias”. O dominicano Frei Bartolomé de Las Casas, vindo para a América em 1503, aperfeiçoou seu pensamento político, ou teoria política, ao longo da evolução do processo de conquista empreendido pelos espanhóis.

O pensamento político de Las Casas caracteriza-se pela ênfase ao Direito Natural e aos valores cristãos, estes aplicados em defesa dos nativos, bem como à soberania popular e questões sobre a diversidade de poderes e seus papéis. Las Casas, a Espanha, a Europa, faziam parte da Cristandade, esta entendida como uma sociedade global unida por uma mesma religião, por um mesmo Deus e pela tradição escrita da língua latina. O objeto de estudo de Las Casas era a América, terra que ainda estava sendo incorporada a Cristandade. É nessa questão de incorporação da América ao mundo cristão que o frade dominicano começa a expressar seus primeiros questionamentos.

Para Las Casas, a forma como o continente estava sendo incorporado à Cristandade passava por cima de todos os preceitos do Direito Natural e daquela sociedade assentada nas bases cristãs católicas: A Igreja e o príncipe de Castela não tinham domínio sobre as populações americanas enquanto estas, de livre e espontânea, não aceitassem a nova religião e o novo soberano. Em Treinta Proposiciones Muy Jurídicas (1552) ele afirma que

“Todos os reis e senhores naturais, cidades e povos das Índias são obrigados a reconhecer os reis de Castela como universais senhores soberanos e imperadores da maneira dita, depois de terem recebido de sua própria e livre vontade nossa santa fé e o sacro batismo, e se antes que tenham recebido ou não queiram receber, não podem ser por algum juiz ou Justiça punidos” (Las Casas, 1965, vol. 1, p. 483 APUD Bruit, 2003, p. 9).

Já é por demais conhecido que os conquistadores não esperaram a “livre e espontânea” vontade dos nativos. Igreja e Coroa Espanhola passaram por cima das tentativas de uma incorporação mais “democrática” da América. Estava instalada uma crise de valores, pois para Las Casas, as ações violentas dos conquistadores impediram a formação de uma sociedade cristã livre, justa, com respeito à condição humana. Dado esse fracasso, era necessária a elaboração de uma teoria política sobre a sociedade e o Estado. Os primeiros argumentos de Las Casas são religiosos e humanitários, assumindo posteriormente um caráter jurídico-político.

Em Tratado Comprobatorio del Império Soberano e Algunos Princípios que deben servir de punto de partida, ambas de 1553, Las Casas escrevia que a sociedade deveria funcionar em equilíbrio a partir do império da lei, que mediaria as relações entre governantes e governados (LE BRUIT, 2003, p. 7). Para o frade dominicano os fundamentos do Cristianismo rejeitavam a força como instrumento de expansão da fé. O Papa era o senhor espiritual dos cristãos e também dos nativos, mas destes últimos apenas por suas vontades e consentimentos. Por essas ideias sobre os nativos e o Papa que Las Casas travou um acirrado debate, em 1550, com o sacerdote e filósofo Juan Ginés de Sepúlveda (1489-1573). Sepúlveda tinha como base a filosofia aristotélica e defendia que o nativo americano, “por sua bestialidade e inferioridade, marcadas por suas práticas de idolatria, politeísmo, canibalismo, sodomia, incesto e sacrifícios humanos, era escravo natural dos espanhóis” (FIGUEIREDO JÚNIOR, 2011, p. 5). Acusava, também, que Las Casas negava o poder temporal do Papa.

Em contrapartida, Las Casas defendia os nativos afirmando que qualquer nação e povos, possuidores de terras e reinos que habitam desde o início dos tempos, são povos livres que reconhecem apenas a autoridade de seus senhores. Em sua defesa também utilizou o preceito cristão de que todos os homens são criados à imagem e semelhança de Deus e de que somente pela fé, e não pela força, poderiam ser amenizadas e modificadas certas práticas nativas. Ele não negava o poder temporal do Papa, mas defendia veemente que este não poderia usar instrumentos que fossem contra a vontade dos indígenas. Las Casas nunca se questionou sobre a importância do poder espiritual, pois este se originava de Deus, estando acima do poder dos reis de Castela. O poder temporal “aperfeiçoava-se e atingia seu verdadeiro sentido pela aprovação do Papa, mas isto não queria dizer que esse poder tivesse origem no Papa, pois era de direito natural e estava fundado no povo” (BRUIT, 2003, p. 8).

Em outras palavras, quando os nativos aceitassem a fé cristã católica os reis teriam a jurisdição sobre eles. O poder político era uma consequência do espiritual eclesiástico, este último também devendo ser aceito e não imposto aos indígenas. Las Casas, dessa forma, dá luz a uma pluralidade de autoridades políticas. Caso os nativos aceitassem a fé cristã, o monarca espanhol seria o poder central, mas os soberanos nativos teriam autonomia para governar seus reinos, mediante o pagamento de um tributo à Coroa. O poder, para o autor, emanava do povo, e este não era inferior ao do soberano, sendo o segundo determinado pelo primeiro. Em Algunos Princípios ele expressa essa ideia da seguinte forma:

“Vendo os homens que não podiam viver em comum sem um chefe, elegeram por mútuo acordo ou pacto desde o início algum ou alguns para dirigir e governar toda a comunidade e cuidaram principalmente de todo o bem comum […] Somente deste modo, ou seja, por eleição do povo, teve sua origem qualquer domínio justo ou jurídico dos reis sobre os homens em todo o mundo e em todas as nações, domínio que, de outro modo, teria sido injusto e tirânico” (Las Casas, 1965, vol. 2, p. 1245 a 1259 APUD Bruit, 2003, p. 11).

Direito, justiça e lei são os três fundamentos do pensamento de Bartolomé de Las Casas. Para ele reis e imperadores não são senhores soberanos, mas sim administradores dos interesses públicos. O mais importante para que a sociedade funcionasse sem nenhuma arbitrariedade era a soberania popular, a união de vontades do povo, que os encaminharia à liberdade, ao bem-estar e a defesa da propriedade. Antes de um político tomar alguma decisão ou realizar alguma obra, era necessário que este consultasse sua comunidade, que diria se isso beneficiaria ou não a coletividade. O rei não pode “vender a jurisdição, contratá-la ou aliená-la, pois não é dono dela. A jurisdição é do povo. Se o rei a vendesse, cometeria roubo, pois a jurisdição é de direito público” (BRUIT, 2003, p. 17). É obrigação do rei administrar os bens fiscais e patrimoniais, bem como exercer jurisdição e proteção sobre os bens privados, não tendo, no entanto, direito de propriedade sobre eles.

Bartolomé de Las Casas, sem dúvidas, estava a frente de seu tempo, com uma teoria que prezava antes a soberania popular, o direito natural da liberdade e da propriedade dos povos, que o poder real e o eclesiástico. É possível falar que fosse ele um teórico da democracia, dos Direitos Humanos? Para Ruggiero Romano (1972) o “Estado” que se forma nos países da América é fraco, dominado por um número incrível de contradições, de interesses contrastantes que dificilmente chegam a encontrar um equilíbrio. Nesse ponto, é interessante ver o embate entre Las Casas, que defende os interesses da Coroa Espanhola; E Sepúlveda, que defende o interesse dos encomenderos, os particulares. Las Casas vê na ação da Coroa, mediada pela Igreja, ambas aceitas pelos nativos, a única forma de amenizar as relações políticas e sociais na América.


BIBLIOGRAFIA:

BRUIT, Héctor H. Uma utopia democrática do século XVI. São Paulo, Revista Eletrônica da Anphlac, n°03, 2003.

FIGUEIREDO JÚNIOR, Selmo Ribeiro. Valladolid: A polêmica indigenista entre Las Casas e Sepúlveda. Brasília, Revista Filosofia Capital, vol. 6, ed. 12, 2011.

ROMANO, Ruggiero. Os Mecanismos da Conquista Colonial. São Paulo, Editora Perspectiva, 1972. (Coleção Kronos).


CRÉDITO DA IMAGEM:


General Archives of the Indies (commons.wikimedia.org)

sábado, 26 de agosto de 2017

História da Criminalidade: O Monstro da Colina

Há quem pense que falar em crimes antigos é depreciar o passado de uma cidade. Eu, enquanto historiador, não acredito no mito de um passado "ordeiro e glorioso". É uma constante das sociedades humanas idealizar o passado para criticar, por inúmeros fatores, o presente em que vivem. Ao abordar crimes antigos, mais do que analisar o caso em si, trabalha-se com as mentalidades de uma época, da sociedade que presenciou esses acontecimentos, estando esse tipo de estudo ligado à História social, História Cultural e História das Mentalidades. O Caso a seguir aconteceu em Manaus em 1976, marcando inúmeras gerações que dele ouviram falar.



O MONSTRO DA COLINA

O tradicional bairro de São Raimundo, localizado na zona Oeste da cidade, ficou marcado na década de 1970 pelo Caso do Monstro da Colina, ocorrido em 1976.

No dia 14 de novembro de 1976, o criminoso Wallace Barreto de Oliveira, de 19 anos, assassinou com requintes de crueldade o menor Carlos Andrade de Oliveira, de 14 anos. O crime ocorreu na rua 5 de Setembro. Até aquele momento os crimes mais comuns eram as brigas de rua, o desentendimentos entre casais e, vez ou outra, algum roubo. Assassinatos eram raros e deixavam a população abismada.

Rosalvo Reis, no texto 'Os "monstros" da cidade', publicado em 26 de junho de 1977 no Jornal do Commercio, afirma que Wallace Barreto, homossexual, estava apaixonado e tentava induzir Carlos Andrade de Oliveira ao mundo do crime. Carlos passou a evitar qualquer forma de contato com ele. Enfurecido e com ciúmes, este arquitetou sua vingança:

Na madrugada de 14 de novembro, invadiu a residência de Carlos, entrando em seu quarto. Os pais do menor, no momento, estavam ausentes. Estuprando o menor, Wallace, com uma faca, lhe fez novas propostas. Carlos, novamente, recusou todas. Wallace lhe golpeou mortalmente com uma facada na nuca. Depois, lhe estripou e decepou seu pênis, eliminando o cadáver em uma fossa na parte de trás da casa.

Capturado pelos familiares de sua vítima, passou por um longo processo judicial, com duração de pouco mais de quatro anos, sendo condenado a 23 anos de prisão. Sempre afirmou que não matou o menor, apontando como responsáveis pelo crime membros de uma quadrilha de traficantes de drogas, que também vitimou três taxistas, no caso conhecido como "Varadouro da Morte".

Um mês após a condenação, segundo consta no Jornal do Commercio de 29 de julho de 1980, escapou da penitenciária em 28 de julho de 1980, junto de seu companheiro, o arrombador Admilton Silva Pereira, atravessando a Praça 14 de Janeiro. A notícia de sua fuga causou pânico na cidade.

Wallace foi recapturado em 01 de agosto de 1980 no bairro de Santo Agostinho, junto de seu companheiro. Ambos confessaram à polícia que pagaram agentes penitenciários para terem a fuga facilitada. 

Classificado como deficiente das faculdades mentais, recebeu a liberdade condicional, passando a trabalhar no Tribunal do Júri Popular, de onde empreendeu nova fuga em 1984. Sem dinheiro, passou a praticar roubos e furtos, furtando uma máquina de datilografia da SECOM (Secretaria de Comunicação), no Aleixo. Foi recapturado com mais 17 criminosos. Tentou alegar sua deficiência mental, mas novos exames médicos atestaram que ele era um indivíduo são. Em 1985 fugiu outra vez da Penitenciária, formando uma gangue de menores que arrombou o Palácio da Justiça.

Capturado e levado para a Penitenciária Agrícola Anísio Jobim, passou a mostrar bom comportamento, recebendo um indulto do Presidente da República no dia 01 de abril de 1985. Foi preso novamente em 1986, acusado de roubo. Já estava com 29 anos. Que fim levou o Monstro da Colina? Parou de aparecer nas manchetes dos jornais em 1986. Se estiver vivo está com mais de 60 anos. Ele pode estar em seu bairro, caro leitor, caminhando tranquilamente, pensando em seu passado ou, quem sabe, no quarto de alguma casa da cidade lendo esse texto...


OUTRAS VERSÕES

Passados quatro anos da produção desse texto, surgiu uma pessoa com outra versão sobre esse caso:

A senhora Livônia Fournier, 61, afirma que Wallace é inocente. Ela conta que quando o assassinato de Carlos ocorreu ele estava em sua casa tocando violão, como costumava fazer. Se não foi Wallace o assassino, quem matou o menor Carlos? O autor do crime teria sido outra pessoa, pessoa essa que costumava extorquir Wallace e que acabou se livrando das acusações. A mãe de Livônia, dona Ruth, o visitou diversas vezes na cadeia. Ele, aos prantos, sempre dizia: "tia Ruth, você sabe que não fui eu que matei ele. Eu estava tocando violão na sua casa". A última vez que ouviu falar dele, soube que ele estava morando no bairro Compensa. Mas isso foi há muito tempo.



FONTES:

Jornal do Commercio, edições de 1976, 1977, 1978, 1979, 1980, 1984, 1985 e 1986.

IMAGEM: 

Wallace Barreto de Oliveira, o Monstro da Colina. Jornal do Commercio, 1976.

terça-feira, 22 de agosto de 2017

Os divertimentos públicos de outros tempos

Mais um texto recuperado do historiador e folclorista Mário Ypiranga Monteiro (1909-2004). Ele foi publicado originalmente na Série Memória da Secretaria de Estado da Cultura, Turismo e Desporto (AM) com o título Os divertimentos públicos de antanho. Nesse texto o autor aborda, da Província às transformações advindas com a economia gomífera e a República, os locais de divertimento da sociedade manauara.

O já demolido Cine Guarany, na Av. Floriano Peixoto, no Centro.

Mário Ypiranga Monteiro

São escassas as informações que temos a respeito de centros de atrações para adultos e menores. Parece que devemos aos primeiros jornais uma ou outra nota muito sucinta, que disfarça de certo modo uma negligência não proposital. Geralmente o aspecto social da região - Manaus, por exemplo- não despertava a atenção do noticiarista nem mesmo a curiosidade do fotógrafo, do desenhista, oficial ou não. Somente a partir de 1870 (naquela altura Manaus já possuía seis fotografias) é que se fala em Pastorinhas, posto que o bumbá fosse notado desde 1787.

De 1865, mais ou menos, são as notícias na imprensa sobre bailes carnavalescos em sedes de clubes, fazendo-se notabilizar o carnavalesco Joaquim José da Silva Pingarilho, que explorou a mina de ouro durante vinte anos, com pouca concorrência. Isto não significa que o ambiente social daquela época para trás não comportasse um derivativo erótico tão animado como a dança. O índio sempre foi festeiro, e o caboclo, seu imediato, ao construir a casa reserva sempre a sala para os dançarás. Naquele tempo os habituês das festas eram obrigados a levar suas cadeiras, pois o Pingarilho e outros não eram de muitas mordomias.

Depois das animadas festas carnavalescas assume a liderança, por muitos anos, o teatro, que aliás sempre foi uma fórmula de expressão social mesmo entre as populações indígenas, que não usando a tecnologia comunicada pelos portugueses, desde o descobrimento, faziam-no através os vários rituais em que tomava parte toda a comunidade. O primeiro teatro coberto, construído de palha - "Thalia" - (e crismado de "Porco Espinho") ficava no sítio da praça de Tamandaré, esquina das hoje ruas de Miranda Leão e Marquês de Santa Cruz. Chamavam-no assim por causa das pontas da palha viradas para cima por influência do sol. Depois dele foi construído o de madeira, chamado "Éden Theatro", do mesmo Pingarilho associado ao sr. José Casemiro do Prado. Nesse começaram a aparecer companhias líricas europeias, francesas, italianas e portuguesas, e fez-se perfeita "diva" a senhora Eufrásia. Parece que foi nele que se representou a tragédia "A Calúnia", original de Casemiro do Prado. Depois do "Éden Theatro" veio o "Apolo" já de cantaria de pedra, localizado onde hoje é os fundos da Loja Bemol. O teatro parece haver sido a coqueluche dos animados habitantes de Manaus, que nunca o perderam de vista, valorizando-o até que em 1881 se definisse por um teatro maior e mais luxuoso.

Apesar do seu isolamento como simples Comarca e depois Província, a região possuía atrativos que variavam de tempo e de lugar, salientando-se as diversões familiares. Manaus possuiu um velódromo (praça do Rio Branco), Carrocel (mesmo local), Recreio Aurora, onde se corriam touros (atrás da futura Penitenciária), balneários públicos (Cachoeira Grande, Pancada), e particulares, circos itinerantes, "gabinetes physicos", onde os charlatães pescavam coelhos de cartolas, saraus com quadrilhas à francesa e rural, os cotillons, os "salões de leitura", particulares, as bibliotecas, os museus. O mais importante desdes era o Museu Botânico, dirigido pelo dr. João Barbosa Rodrigues. Na entrada do século surgiu o Jardim Zoológico, de propriedade e direção do súdito francês Mr. Pressier, estava localizado em casarão da rua de Belém, próximo ao Entroncamento, numa área bastante ampla, mas não possuía muitas espécies estranhas ao meio, somente um velho leão, e pavões reais que haviam sido adquiridos do espólio do dr. Eduardo Ribeiro. Havia uma anta domesticada, que servia para passear crianças e obter-se fotos originais.

O fonógrafo, primeira manifestação do que seria o gramofone, depois a vitrola e mais tarde a eletrola, funcionava em casa particular da praça dos Remédios. Afastado do centro urbano, a casa "Bilhares", que deu nome ao bairro, do barão de Floresta Bastos, atraía nos domingos e feriados uma multidão de aficionados do bilhar. Existe uma boa fotografia de 1914, mostrando a casa rústica e no pátio uma profusão de autos Ford, o que vem desmentir a irritante premissa de que em Manaus "não havia muitos carros motorizados" e a população só se deslocava a pé ou em montaria. De fato, todas as grandes famílias possuíam de preferência seus landoletes, seus tilburis, suas charretes, suas seges de uma parelha, suas berlindas, mas era também notória a invasão dos automóveis. E tinham os bondes elétricos, e antes dos bondes, a "machambomba", ou locomotiva que arrastava vagões de madeira. Não tivemos bondes puxados a parelha de burros, como no Pará. Nós saímos da máquina a vapor - o locomóvel - cuja estação central ficava em casa da avenida de Epaminondas (lado da praça do General Osório) e terminal da antiga Estação de Bondes, à praça do Comércio.

O cinema surgiu na vigência do século, exibido no Teatro Amazonas, mas o decano dos cinemas foi o Politheama, localizado então na avenida de Eduardo Ribeiro, onde era a casa comercial Lojas Populares, do Braga. A firma Fontenele & Cia, francesa, construiu a sede do Politheama no antigo lugar denominado Pitiú, um chavascal drenado pela comuna, formado pelo igarapé dos Remédios. O Cine Odeon só surgiria mais tarde, para concorrer com o outro. O segundo Politheama era de armação "Império", coberto de corrugado inglês e consta que sua planta é da autoria do engenheiro arquiteto M. Pimentel, que planejou a estrutura do Hipódromo Amazonense.

O Politheama, como depois o Cassino Julieta, são pré-frabricados, e dos poucos materiais que resistiram ao impacto das soluções anti-estéticas do momento atual.

Resta-nos o trabalho de contestar, como inverossímil, quem dá o igarapé de Manaus, fim da rua Doutor Almino, como local de banho das famílias de Manaus. Que alguém ali tomasse banho não seria novidade, pois se sabe de afogamentos de rapazes que disputavam mergulhos, saltando do convés de navios ali ancorados, inclusive o colombiano "Narino". Mas alegar que aquilo era "ponto de encontro da sociedade amazonense" é pura invencionice, pois os locais de encontro das famílias eram os convescotes domingueiros na Cachoeira Grande e na Pancada. Ou nos balneários particulares, que existiram desde a metade do século XIX, conforme vamos tentar elucidar noutra lâmina desta coletânea de memórias avulsas.

FONTE: 

MONTEIRO, Mário Ypiranga. Os divertimentos públicos de antanho. Manaus, Secretaria de Estado da Cultura, Turismo e Desporto, 6° ed, n° 112, novembro de 2002.

CRÉDITO DA IMAGEM:

Acervo do pesquisador Ed Lincon

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Educandos: 161 anos do Alto da Bela Vista

Estabelecimento dos Educandos Artífices, instalado na antiga Olaria Provincial. FONTE: Manaus Sorriso

Neste dia 21 de agosto, o bairro de Educandos comemora 161 anos de fundação. Ele está Localizado na zona Sul de Manaus, em frente ao Rio Negro, limitado pelos bairros de Santa Luzia, Colônia Oliveira Machado, Cachoeirinha e Centro (ponte Pe. Antônio Plácido de Souza).

A origem desse bairro é ligada à criação do Estabelecimento dos Educandos Artífices, instituição educacional criada através da Lei N° 60, de 21 de agosto de 1856, onde eram ensinados os ofícios de tipografia, sapataria, carpintaria, alfaiataria etc. Estudavam nessa instituição jovens órfãos e de origem humilde. O nome pelo qual o bairro ficou conhecido é uma lembrança do antigo Estabelecimento dos "Educandos". Essa escola foi instalada no prédio da Olaria Provincial, no local conhecido como Barreira de Baixo.

De acordo com o Relatório da Comissão Organizadora do Tombo dos Próprios do Município, de 1927, as primeiras ruas do local foram abertas em 1901, num total de 6, sob as ordens do superintendente Dr. Arthur Cezar Moreira de Araujo. Por meio do decreto n° 67, de 22 de julho de 1907, do superintendente interino Coronel José da Costa Monteiro Tapajós, a localidade de Educandos é batizada com o nome de Constantinópolis (Cidade de Constantino), uma homenagem ao governador da época, Constantino Nery.

Ainda com base nesse documento e nas informações do historiador Cláudio Amazonas, em 1908 a Intendência Municipal, sob os comandos do superintendente Domingos José de Andrade, através das Leis N° 487 (29 de fevereiro), 491 (4 de março), 507 (29 de maio) e 538 (9 de dezembro), dá a denominação das primeiras seis ruas que foram abertas no bairro:

A rua Norte/Sul n°1 passa a chamar-se Boulevard Sá Peixoto, "em homenagem ao sr. Senador Antonio Gonçalves de Sá Peixoto que tão relevantes serviços ha prestado ao Estado do Amazonas e especialmente à cidade de Manáos; As ruas Norte Sul n° 2 e 3 passam a chamar-se monsenhor Amâncio de Miranda e Innocêncio de Araújo; As ruas Leste/Oeste n° 1 e 2 passam a chamar-se Delcídio Amaral e Manuel Urbano; A que poderia ser a Norte/Sul n° 3, seria chamada pelo povo de Boulevard Rio Negro, pois se constitui a faixa marginal o bairro frente ao rio Negro. Quanto à praça, seria batizada de Dr. Tavares Bastos, advogado e político alagoano, morto no dia 3 de dezembro de 1875 em Nice, na França, que, dentre outros feitos importantes de sua vida, inclui-se a luta pela abertura dos portos do Amazonas ao comércio mundial e pela libertação dos escravos.

Após essas significativas mudanças, o bairro de Educandos necessitava integrar-se com o restante da cidade, localizada no Centro e na Cachoeirinha. Até então, o contato era feito através das catraias, com seus portos localizados nas ruas Delcídio Amaral e Manoel Urbano. O primeiro porto levava em direção à rua Lima Bacury; o segundo, rua dos Andradas.

Ponte Ephigênio Salles.

A integração do Educandos ao restante da cidade se deu por meio das pontes. Ao todo, em sua História, foram construídas três. A primeira começou a ser construída em 1927, no governo de Ephigênio Salles, sendo entregue à população dois anos depois, em 1929. Foi batizada com o nome do referido governador. Com isso, o Educandos estava conectado com o bairro da Cachoeirinha e, através desse, ao Centro.

Ponte Juscelino Kubitschek.

Em 1° de maio de 1959, o então governador, Gilberto Mestrinho, inaugurava a Ponte Juscelino Kubitschek, que esteve em Manaus para a inauguração. Essa ponte também ligava o bairro à Cachoeirinha. Sua construção se deu pelo aumento da demanda do tráfego na cidade, da ligação com a estrada do Paredão para o aeroporto de Ponta e Pelada e da Refinaria de Isaac Sabbá.

Ponte Pe. Antônio Plácido de Souza.

A terceira e última é a Ponte Pe. Antônio Plácido de Souza, que liga o Educandos, através da rua Delcídio Amaral, ao Centro, pela rua Quintino Bocaiuva. Começou a ser construída em 1972, na administração do prefeito Frank Lima, e foi concluída e inaugurada em 18 de outubro de 1975, na administração de Jorge Teixeira. Seu nome é uma homenagem ao primeiro vigário da paróquia de N.S.doPerpétuoSocorro.

Através da Lei N° 1469, de 7 de dezembro de 1979, de autoria do ex-vereador Alfredo Dias, do MDB, o bairro de Constantinópolis voltou a ser chamado de Educandos.


Lugares Históricos


Av. Leopoldo Péres - Com suas obras iniciadas em 1928 e concluídas em 1929, a "Estrada de Constantinópolis", como era conhecida na época, foi aberta pelos membros da Sociedade Sportiva e Beneficente de Constantinópolis, para facilitar o acesso dos moradores ao bairro da Cachoeirinha, através da ponte Ephigênio Salles. No final da Grande Guerra, com os Acordos de Washington encerrados e a nova queda dos preços da borracha, muitos nordestinos passaram a se alojar em subúrbios da cidade. A Estrada de Constantinópolis passou a ser habitada por essas pessoas, que passaram a instalar no local pequenos comércios. A presença dos nordestinos fez a estrada ficar conhecida como Estrada dos Arigós. Atualmente, a avenida mantém a tradição comercial, com inúmeras lojas de pequeno e médio porte.





Paróquia de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro - Em 1928, durante as obras da Estrada, foi construída uma pequena capela em madeira, dedicada à Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. O Pe. Antônio Plácido de Souza assume o Curato Provisório de Constantinópolis, que se tornou, em 15 de dezembro de 1941, Paróquia de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. A estrutura atual, de alvenaria, começou a ser construída em 1946, sendo concluída anos mais tarde. Está localizada na rua Inocêncio de Araujo.

Vila Cavalcante - Uma das primeiras construções em alvenaria do bairro, a Vila Cavalcante, construída em 1912, é um dos últimos prédios históricos do bairro. O nome é de origem de uma rica família de seringalistas do Juruá. Foi adquirida por Manuel Figueiredo de Barros, regatão, que a vendeu em 1935 para o comerciante Joaquim Ferreira da Silva. Em 1924, em suas dependências, funcionou o Grupo Escolar Machado de Assis e, na década de 1930, o escritório dos Correios. Atualmente o prédio pertence à Fundação Santa Catarina, organização religiosa da Igreja Católica. Está localizado no Boulevard Sá Peixoto.

Orla do Amarelinho - O calçadão, de frente para o Rio Negro, é o principal cartão postal do Educandos. De noite, é o point certo dos que querem se divertir nos bares e casas de dança que ficam ao redor. Fato marcante e trágico é que, às 9 horas do dia 23 de abril de 1970, a área que atualmente compreende o Amarelinho desmoronou, consequência de forte tempestade ocorrida um dia antes. Nenhuma pessoa morreu, ocorrendo apenas a destruição das residências de madeira e palha que existiam no local. Está localizado no Boulevard Rio Negro.

Usina Labor - Em 1938, o empresário Isaac Sabbá adquire um grande terreno na Estrada de Constantinópolis, construindo nele a Usina Labor, destinada ao beneficiamento de sorva e borracha. A mão de obra empregada nessa indústria vinha do próprio bairro. Nos anos 1970 foi transformada em Fitejuta, agora funcionando como tecelagem de juta. O prédio é onde funcionou, até 2014, um dos supermercados DB. Fica na Avenida Leopoldo Péres.


FONTES: AMAZONAS, Cláudio. Memórias do Alto da Bela Vista: Roteiro Sentimental de Educandos. Manaus: Norma Propaganda e Marketing, 1996.

Relatório da Comissão Organizadora do Tombo dos Próprios do Município. 1927. Administração do prefeito Basílio Torreão Franco de Sá. Disponível em: http://catadordepapeis.blogspot.com.br/2015/08/livro-tombo-da-prefeitura-de-manaus-1.html. Acesso em 22/08/2015.

AMAZONAS, Cláudio. Constantinópolis: Origens e Tradições. Manaus: Edições Muiraquitã, 2008.


CRÉDITO DAS IMAGENS:

Skyscrapercity
Blog do Coronel Roberto
Manaus Sorriso
Manaus de Antigamente

domingo, 20 de agosto de 2017

Patrimônios Históricos: Ensino, pesquisa, teorias e metodologias

O presente texto foi produzido pelo autor convidado Marcos Vinicius Alvarenga¹, acadêmico de História da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Em Patrimônios Históricos: Ensino, pesquisa, teorias e metodologias, Marcos procura problematizar, através de uma ampla discussão, a noção de patrimônio histórico, discussão essa relacionada aos sujeitos históricos, aos lugares de fala e aos discursos que foram e continuam sendo fabricados.

Marcos Vinicius Alvarenga

Cotidiano da Comunidade Quilombola do Alto da Serra, no Distrito de Lídice, no município de Rio Claro, região do Médio Paraíba do Rio de Janeiro. Foto de 2015.

Há um questionamento importante a ser feito: “Por que conhecemos o inventor da lâmpada, mas não conhecemos o inventor da canoa? ” Estamos diante de uma ferramenta extremamente sofisticada, capaz de manter um pescador e o fruto de seu labor ao longo do curso de rios caudalosos em demasia como os da bacia do Amazonas sem que o primeiro, seu condutor, se afogue!
Vamos levar a discussão um pouco mais adiante com outro exemplo: “Por que consideramos tão facilmente as casas brancas presentes nas elevações das ilhas gregas do Mediterrâneo como ‘patrimônio’, mas não o fazemos para com os cortiços ou as casas da comunidade do Vidigal, no Rio de Janeiro?” Ora, se pintarmos as da última localização e tirarmos uma foto poderia até ser confundido um espaço com o outro! E, para encerrar a sessão de perguntas, faço uma terceira “Por que as vestes de um monarca europeu são cuidadosamente preservadas, ao passo em que as de um escravo de origem africana do século XIX não?”
O objetivo deste artigo é problematizar em cima destas indagações, evocando uma discussão mais ampla acerca do que são patrimônios históricos, com base em exemplos fornecidos por outros escritos, como o magnífico trabalho do professor Gerson Rodrigues de Albuquerque, os “Trabalhadores do Muro, o rio das cigarras”, que estabeleceu um perfeito diálogo com suas fontes; mais do que fontes, Gerson deu voz a sujeitos! Sujeitos em meio a suas vivências, agentes ativos de sua própria história e não marionetes de um teatro estruturalista em que são submissos aos seus dominantes.
Gerson não fez uso de um monólogo do historiador 100% objetivo, o cientista que conta as coisas “Tal como aconteceu”, e o “narrador”, mas estabeleceu um verdadeiro diálogo mútuo. Marcos Silva, ao tratar-se do primeiro caso, afirma: “Narrações orais e outros itens de patrimônio histórico, quando assim tratados, são metamorfoseados em cadáveres dissecados pelo analista, sem se estabelecer um diálogo entre as partes, que poderia ser esclarecedor para ambas. “ (SILVA, p 42)
Cabe a nós, com nossos trabalhos de PIBIC, nossas monografias e futuramente, nossos trabalhos de mestrado e doutorado, dar voz aos mais diversos sujeitos (que também constituem um patrimônio!). Por que não fazer uma história das crianças que moram na rua? Ou uma história das empregadas domésticas? É preciso rememorar os esquecidos do passado, tal como apontou Walter Benjamin em suas “Teses sobre o conceito de História”. Mesmo que muitos do curso de História possuam como objetivo somente a sala de aula (ensino fundamental e médio) isso também se faz necessário, diria que ainda mais necessário! Os alunos e alunas precisam ter a consciência de que a História é muito mais que um marechal que “proclama” uma república, e que ele e seus pais, que são trabalhadores, também são sujeitos históricos.
Antes de tratarmos de patrimônio de forma mais ampla é necessária uma discussão acerca do que chamamos de “fontes”. De acordo com a abordagem inicial do livro “A Pesquisa em História”, uma parceria de Maria do Pillar, Maria do Rosário e Yara Maria, durante o século XIX, quando a História ganha um status de “ciência” pelos positivistas, a palavra “documento” passa a ser usada como sinônimo de prova científica. Como documento, no sentido positivista da palavra, entendemos o que é escrito, e não é qualquer escrita, mas sim aquela emitida pelos governos, em síntese, nestes é que reside a “verdade”.
Isso configura algo demasiadamente problemático pois, supõe que a História é feita somente por grandes heróis, onde estão as mulheres, os trabalhadores e as crianças nessas narrativas? Outro grande problema nisso é a negação de história a povos que relatam suas trajetórias não por uma via da escrita, mas por uma rica oralidade. É dizer, por fim, que os griots, mestres da tradição oral no continente africano, não possuem história. Estariam eles eternamente condenados pela afirmação de Friedrich Hegel de que o continente africano não possui história?
Com contribuições como a da Escola dos Annales, a História passará a abarcar aspectos sociais, para além desses “grandes homens”, como estudos sérios acerca dos campos, como foi o caso de Marc Bloch, este que em seu livro “Apologia da História ou o Ofício do historiador” defende que a história é a ciência dos homens, mas que diferente da Sociologia ou da Antropologia, tratam deste homem no tempo.
Neste bojo, a escrita da História passa a estar lastreada em qualquer vestígio humano, desde a literatura de um dado período, como também a música, o cinema, e a própria história oral. Além de todo este advento, supera-se a ideia de que o “documento fala por si mesmo”, é preciso fazer perguntas a ele. Entender, por exemplo, que não se vai retirar um mero reflexo de uma dada sociedade em uma obra literária, mas sim uma expressão das representações acerca desta.
Um relato de viajante, outro tipo de fonte, não nos mostra a “verdade absoluta”, mas sim a forma como aquele viajante representou aquele dado local ao qual esteve ciente, com seus preconceitos e valores. Ninguém é isento! Nem mesmo o historiador que escreve um dado texto, a forma como este visualiza a realidade se reflete muito na sua escrita.
Considerei de suma importância para a discussão acerca de patrimônio a abordagem realizada no livro “A Pesquisa em História” sobre a condução de uma pesquisa. Ela se encaixa perfeitamente ao Gerson Rodrigues e da forma como este o conduziu, de modo a abarcar com mais vida o seu objeto. Como ressaltei no início, mais do que uma “fonte friamente analisada”, o professor da Universidade Federal do Acre reconstituiu vivências de pessoas que “tem nome e tem rosto”, como o sr Francisco e do sr Maurício em suas vivências naquela mata em torno do rio Muru, este que, é de fato um patrimônio histórico, conforme abordarei mais adiante com profundidade maior.
Retomando à obra metodológica e teórica, sua abordagem sobre a condução de uma pesquisa, nos é feito um importante alerta acerca do diálogo com as fontes. Muitos trabalhos fazem uso de um “método prévio” tal como uma “receita de bolo”, para que assim se possa analisar suas fontes, percorrendo um caminho com início, meio e fim, herança, segundo as autoras, cientificista do século XIX: “ Esta forma de se conceber a pesquisa histórica supõe uma submissão do historiador, tanto aos procedimentos do método como aos recursos da técnica, pois a ênfase recai nos procedimentos do pesquisador em detrimento de sua relação com o objeto”. (p 40)
Mais adiante, evoca os argumentos do historiador Ciro Flamarion Cardoso, afirmando que as perguntas que devemos fazer as fontes devem ser feitas não nas fontes em si, mas antes baseadas em arcabouços teóricos e metodológicos prévios. As autoras fazem um contraponto a isso, defendendo um diálogo ainda maior com as fontes a fim de dar sequência com um bom trabalho.
Não cabe, vale lembrar, se desvencilhar de quaisquer métodos ou “base teórica”, Gerson Rodrigues, por exemplo, dialoga com Thompson em sua valorização da experiência dos trabalhadores do rio Muru, mas sim não serem esses os nortes pelos quais uma pesquisa seguirá; acrescentaria que é preciso que esses arcabouços não ofusquem esses “esquecidos” que, como ressaltados, são sujeitos de sua própria história!
Certa vez, um professor da graduação (o nome e a disciplina ministrada serão resguardados por questões éticas), contou de um caso em que foi chamado para uma banca de mestrado, cujo trabalho se propunha a abarcar as vivências dos seringueiros. Ao ler o trabalho da mestranda, tudo o que pode ver nele eram “teorizações mirabolantes” sobre as ideias de Bourdieu e Foucault. “Mas menina, onde estão suas fontes? Que que o Bourdieu entende se seringueiros?!”
Na anedota acima, muitos graduandos interpretaram o docente como se estivesse censurando o uso de teóricos, ou, mais especificamente, desses dois teóricos. Isso é cair em um grande engano: sua crítica se relacionava com a feita pelos demais autores aqui mencionados: a censura a trabalhos onde você parte muito da teoria para a prática, ou à aqueles em que você só fica na teoria e não aborda os patrimônios históricos no que eles são, em um contato que remete até mesmo a afetividade.
Podemos fazer um paralelo entre a noção tradicional de documento como algo escrito, e escrito por pessoas “relevantes”, e que prova com a noção de patrimônio histórico como estritamente arquitetônico.
Quando falamos em patrimônio histórico muito provavelmente o que vem na mente de uma pessoa é o Teatro Amazonas, o Teatro Municipal de São Paulo (o próprio Marcos Silva o explora como exemplo em seu texto), ou o famoso Cristo Redentor. Dificilmente as pessoas reconheceram como patrimônio um sotaque, uma determinada festividade, ou (retomando para o exemplo inicial) uma canoa. No entanto, Marcos Silva nos adverte que essa diversificação não deve ser confundida com a diversidade de temas abordados pelos historiadores: “(...) está-se diante de fazeres sociais. Para cada material interpretado, há um contato com lutas, acordos, potencialidades, limites. ”
Ele faz este alerta sobretudo para os relatos orais, como já mencionado e citado anteriormente para se referir ao trabalho de Gerson. E mais do que isso, a canoa usada por esses sujeitos, sua fala, suas histórias da mata, a forma como executam o trabalho, todos são patrimônios que contém trajetórias de vida imbuídas.
Marcos Silva aponta para a não separação de patrimônio histórico de ensino de história, mostrando como ambos estão inteiramente ligados. São, segundo ele, partes de um mesmo processo, onde se procura
(...) evidenciar múltiplas virtualidades e opções contidas no ensino de história como experiência que abrange o domínio ampliado sobre um campo erudito e o diálogo com os universos de vivências sociais dos grupos humanos estudados e daqueles que o estudam. “ (SILVA, p 40).
Eis a importância inclusive de se estabelecer um diálogo em sala de aula sobre a própria noção de patrimônio a fim de destruir este “lugar comum” que o define como um elemento arquitetônico, na grande maioria algo que de fato é pertencente à elite, em que muitas vezes o aluno de uma família proletária não o identifica com suas vivências e tradições; ao ampliar o leque deste debate, se evidencia que elementos banalizados, como sua fala, também se trata de um patrimônio histórico.
Marcos Silva trata disso no exemplo do Teatro Municipal de São Paulo, local criado especificamente para a elite no século XX e que, ainda hoje, mesmo com atrações gratuitas, muitas pessoas humildes possuem uma certa vergonha de assistirem a um espetáculo; é possível fazer um paralelo deste exemplo com o Teatro Amazonas, onde de fato há muitas atrações gratuitas nos dias atuais, mas que muitos manauaras possuem receio de assistirem às atrações.


REFERÊNCIAS

ALBUQUERQUE, Gerson Rodrigues de. Trabalhadores do Muru, o rio das cigarras. Rio Branco/AC, EDUFAC, 2005.
BLOCH, Marc. Apologia da história, ou, O ofício de historiador. Rio de Janeiro/RJ, Jorge Zahar, 2001.
BURKE, Peter. O que é História Cultural? Rio de Janeiro/RJ, Jorge Zahar, 2008.
HERNANDEZ, Leila Leite. A África na sala de aula: visita à história contemporânea. São Paulo/SP, Selo Negro, 2005.
SILVA, Marcos. História: o prazer em ensino e pesquisa. São Paulo/SP, Brasiliense, 1995.
VIEIRA, Maria do Pilar; PEIXOTO; Maria do Rosário; e KHOURY, Yara Aun. A Pesquisa em História. São Paulo/SP, Ática, 1989

SOBRE O AUTOR

¹ Marcos Alvarenga é graduando em Licenciatura Plena em História pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Seus interesses de pesquisa remetem ao estudo da nacionalidade através da literatura em África, a negritude e a presença negra na Amazônia.









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sábado, 19 de agosto de 2017

Sobre ser Historiador

Pintura de Eanger Irving Couse.

História, ciência do homem no tempo. Existem, claro, pessoas que discordam desse termo “ciência”, demasiado positivista para elas, herança de um anseio de cientificidade vindo do século XIX. Devo recorrer, então, à definição um pouco mais abrangente de Leopold Von Ranke, segundo a qual ela é, “ao mesmo tempo, ciência e arte”? Saindo dessa breve discussão sobre o conceito de História, nesse dia 19 de agosto, Dia do Historiador, me faço dois questionamentos pertinentes: Porque escolhi esse curso? Porque sou historiador?

Bom, desde cedo sempre gostei do cotidiano, do movimento de pessoas, de cargas, pelas ruas do meu bairro e da cidade. As personagens peculiares, as ruínas e as casas antigas, as estórias e lendas locais, as manifestações religiosas e profanas, as conversas informais nas tabernas, nas repartições públicas, a orla do Rio Negro em contraste com a paisagem urbana. Foi através da escrita, ainda no Ensino Fundamental, que pude melhor expressar minhas concepções de mundo, da sociedade em que estou inserido, me reconhecer como agente do processo histórico. Ainda me faltava, claro, a formação, o conhecimento profundo dessa área, a profissionalização.

No início de 2015 veio o resultado da aprovação para o curso de Licenciatura Plena em História, na Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Até o presente momento, ser aluno desse curso permitiu o acesso a diferentes conhecimentos, conhecimentos esses que ou reforçaram antigas convicções, ou sedimentaram e ajudaram a construir novas. Referenciais teóricos, metodologias, críticas, conselhos e ‘puxões de orelha’, todos aplicados, de alguma forma, no que aqui se pretendeu fazer. Agradeço aos professores Auxiliomar Ugarte, Maria Eugênia, Joana Clímaco, Almir Diniz, Luís Balkar, Ana Lúcia, Patrícia Silva, Sínval Gonçalves, Márcia Mello, Glauber Biazo, Kátia Couto, Thiago Atroch, Davi Avelino e Robeilton Gomes por tudo o que foi ensinado até agora.

Criei o blog História Inteligente com o intuito de incentivar os jovens e demais pessoas à leitura, à escrita e aos estudos das Humanidades, destacando a importância da História, que não é simples “memorização” ou conjunto de datas e fatos como ainda sustentam certas pessoas, marcadas por uma transposição didática há muito mal feita, mas que hoje toma novos rumos, mas antes uma ciência na qual se busca compreender os processos humanos, processos esses que por serem humanos são desiguais, no tempo, repercutindo em mudanças na estrutura de nossa sociedade. A boa História não é aquela dos fatos construídos e presa a uma estrutura, mas sim a que se assemelha (aqui me aproprio, de certa forma, dos postulados de Fernand Braudel, sobre longa duração) a uma comida preparada lentamente em fogo baixo, para que o gosto seja melhor apurado, para que a sutiliza dos diferentes temperos seja captada, fazendo com que o resultado final seja saboreado com maior prazer.

Escolhi o curso de História porque tenho um dever social, de fazer as pessoas se identificarem como agentes de um processo, construtores de suas realidades, elementos dinâmicos em um vai e vem constante, para que entendam a trajetória humana. Sou filho do meu tempo, não sou um juiz do passado, sou historiador porque busco compreender as mudanças e as ações e as motivações de homens e mulheres através do tempo.


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segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Neocolonialismo e Guerra como "esperanças" de crescimento da Amazônia no pós-crise da borracha

Vila Operária de Fordlândia, às margens do rio Tapajós, no Pará, em 1933.

Na década de 20 do século passado, Europa e Estados Unidos controlavam boa parte dos países da África, Ásia, Oceania, Oriente Médio e América. A Amazônia foi economicamente controlada, por 30 anos, por agentes do capital estrangeiro. No entanto, uma dominação completa, característica do neocolonialismo (dominação política e econômica), surgiria na região, mais especificamente no Tapajós (PA) a partir do final dos anos 20.

Henry Ford, grande empresário da indústria automobilística do início do século XX, buscava a autossuficiência de matérias-primas para suas indústrias. Não só Henry, mas um grande número de empresários americanos voltariam a depender da borracha brasileira. Durante a Primeira Guerra, o comércio europeu se tornou instável, agravado que fora pelo bloqueio marítimo alemão. A Inglaterra, que detinha o monopólio da borracha, viu os estoques acumularem e os preços caírem. Visando garantir preços estáveis e impedir a acumulação do produto durante o pós-guerra, o país adotou, a partir de 1923, o Plano Stevenson, que, basicamente, passa a limitar a cota de cada produtor inglês.

Com menos matéria-prima no mercado e os preços novamente favoráveis aos ingleses, os grandes fabricantes americanos de pneus foram os mais prejudicados. Como reação, as grandes companhias da época (Goodyear, Firestone e Ford) passaram a buscar diferentes locais, da América à África, para implantar seus próprios seringais.

José Custódio Alves de Lima, cônsul geral do Brasil nos Estados Unidos, depois de saber do interesse do empresário em criar um seringal em Everglades, na Flórida, lhe sugeriu a Amazônia como local de implantação para seu projeto. José Custódio, em contato com Dionísio Bentes, governador do Pará, facilitou para Ford a aquisição de um milhão de hectares no Tapajós. A Companhia Ford, através de contrato firmado com o governo do Estado do Pará em 03/01/1927, tinha o direito à exploração das terras, dos minerais e de outras matérias-primas nela encontradas; de realizar a navegação nos rios Tapajós e Amazonas; construir estradas, armazéns, fábricas, criar núcleos de povoação, escolas, linhas de comunicação etc, sem necessidade do aval de qualquer autoridade. Poderia criar sua própria relação política, sem intervenção do governo. Estava, também, isenta de qualquer imposto pelo prazo de 50 anos. Surgiu um território americano na Amazônia, independente do Brasil, gerido por uma empresa privada.

Antigos trabalhadores das cidades do interior, dos seringais e de outras atividades atingidas pela grande crise, passaram a se dirigir à região que ficou conhecida como Fordlândia. Xingu, Madeira, Purus, Acre, Solimões, Guaporé e Jutaí foram os maiores “fornecedores” de mão de obra. Essas pessoas, acostumadas com um tradicional sistema de trabalho comandado pelo aviamento e pela rigidez do seringalista, pela primeira vez venderiam suas forças de trabalho através de um sistema de contrato. O funcionário recebia da Companhia uma chapa de alumínio, com seu número de identificação e tipo de serviço, pelo valor de dez mil réis. Através dessa chapa eram controladas as faltas, as licenças para tratamentos médicos, pagamentos de férias e transferências.

O regime de trabalho era pesado, indo de 7 da manhã à 17 da tarde, com direito a uma hora de intervalo. Relógios e sirenes ditavam o início e o fim do dia. Nos Estados Unidos vigorava a Lei Seca, que proibia o consumo de bebidas alcoólicas em todo o território. Henry Ford, com apoio do governo paraense, implantou a medida em Fordlândia, onde já existia um considerável número de bares e casas de diversão. Para escapar da rigidez da fiscalização, à mesma maneira que nos Estados Unidos, surgiu um intenso movimento de contrabando de bebidas. Nos barracões onde eram feitas as refeições dos funcionários de patentes mais baixas, peixe e farinha eram substituídos por pão e espinafre, e servidos em bandejas padronizadas. A imposição dessas mudanças, nos anos 1930, fez surgir movimentos de greve radicais, com a destruição de galpões, tomada de usinas e refeitórios.

Os funcionários americanos abandonaram Fordlândia. Foi preciso a intervenção de forças policiais para o fim do movimento. Mas, antes mesmo de qualquer revolta, essa concessão já não mostrava os resultados esperados:

A grande distância do porto de Santarém, dificultando a comunicação e o abastecimento comercial, a reduzida força de trabalho, a não seletividade das mudas e sementes de seringueiras e a topografia do local, bastante acidentada, representavam um entrave para a lucratividade da empresa¹.

Soma-se ao fracasso técnico a doença do mal das folhas, que atacava a árvore da seringueira e reduzia a produção do látex. Com o fracasso da primeira concessão de terra, a Ford permutou com o governo uma parte de Fordlândia por outra, dessa vez Belterra, distante 30 milhas de Santarém. Da mesma forma que na primeira, Belterra recebeu todos os aparatos necessários para seu funcionamento: escolas, hospitais, vilas, instalações industriais, um porto e estradas. Os antigos trabalhadores de Fordlândia foram transferidos para Belterra, e também foram realizadas novas contratações. Esse, que parecia ser o emprego dos sonhos, mostrava sua face mais cruel com a política da empresa para com os funcionários. Um anúncio da companhia em 1943, publicado em O Jornal de Santarém², oferecia 9 cruzeiros por dia para homens e 6 para mulheres. As crianças, que já eram aceitas a partir dos 7 anos, ganhava 0, 50 por hora de serviço. Os fiscais estavam sempre atentos aos afazeres dos funcionários. Por menor que fosse o erro, o trabalhador era expulso da companhia sem o direito de tentar se explicar. Esses problemas, a baixa produtividade das plantações e a invenção da borracha sintética buna, mais barata que a natural, deram fim ao projeto, que durou de 1927 até 1945.

Entre 1942 e 1945, o Amazonas se viu inserido no conflito mundial. Em 1941, o Japão atacou bases Aliadas americanas e britânicas no Pacífico, dominando logo depois as colônias asiáticas produtoras de borracha. Sem acesso a essa matéria-prima, útil à indústria bélica e manufatureira, os Aliados voltaram suas atenções para o Amazonas. Em 1942, navios brasileiros foram torpedeados pelos alemães, o que fez o país declarar guerra ao Eixo.

O Amazonas, através de acordos firmados entre o Brasil e os Aliados, entrou no conflito como fornecedor de borracha. Mais uma vez ocorreria um surto de imigração nordestina para a Amazônia. Através dos “Acordos de Washington”, ficou estabelecido que os Estados Unidos investiriam no financiamento da produção de borracha na Amazônia, enquanto que o governo brasileiro se encarregaria de recrutar o maior contingente possível de trabalhadores. Estima-se que, entre 1942 e 1945, o governo conseguiu enviar do Nordeste, que passaram por uma terrível seca, cerca de 60.000 retirantes para a região Norte. O sistema de trabalho dos seringueiros continuava sendo o mesmo do início do século: em situação de semi escravidão, preso ao aviamento como devedor de um sistema cíclico. O governo norte-americano ficou de pagar 100$ por trabalhador instalado nos seringais. Manaus se tornou uma das subsedes da Rubber Development Company, órgão criado para administrar os serviços no Estado. A exportação da borracha, a circulação monetária, a construção de um aeroporto, os investimentos na capital e a especulação imobiliária criaram um momento de recuperação.

Enquanto o conflito ia se encaminhando e delineando o mapa político do mundo, os amazonenses e paraenses, inflados pelas propagandas do governo de Getúlio Vargas, mergulhavam, às de vezes de forma violenta, em um sentimento patriótico. Há registros, em Manaus, da malhação de bonecos de Judas como o nome ‘Xitler’, uma paródia com o nome do ditador alemão Adolf Hitler. Na Vila de Tomé-Açú, no Pará, foi construído um campo de concentração que chegou a receber 480 famílias japonesas, 32 alemãs e algumas italianas, tanto do próprio Estado quanto do Amazonas. Essas famílias, em Manaus e Belém, sofriam perseguição, tinham seus estabelecimentos e residências depredados pelo simples fato de virem dos países que formavam o Eixo.

Esse pequeno surto de desenvolvimento, de patriotismo, teve fim com a Segunda Guerra. O antigo mercado asiático estava novamente aberto, novas técnicas aperfeiçoaram o uso de borracha sintética. Já não existia mais a necessidade da borracha amazônica. O conflito acabara e, com ele

as esperanças de tirar a região do abismo sem fim do subdesenvolvimento. Os planos de desenvolvimento concebidos nos “Acordos” foram abandonados, as verbas indenizatórias dos trabalhadores foram descaminhadas, as estruturas do atraso não foram rompidas e tudo voltou como dantes. As atenções do governo federal agora são para as regiões Sul-Sudeste, por estas apresentarem mais condições de dinamismo econômico. A Amazônia vai ser mesmo esquecida do resto da nação por muito tempo³.

A Amazônia se viu novamente abandonada. O capital estrangeiro, depois de mais de 40 décadas conseguindo alguns resultados satisfatórios, foi direcionado para mercados mais estáveis. Em socorro à região, a nova Constituição de 1946, no artigo 199, de autoria do deputado federal Leopoldo Péres, instituiu que a União destinaria 3% de sua arrecadação para financiar o Plano de Valorização Econômica da Amazônia. Em 1953 foi criada a Superintendência de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA), que visava o desenvolvimento da agricultura, da extração mineral e da pecuária. Por falta de estrutura, principalmente de estradas, o plano não vingou. A construção da estrada Belém-Brasília, em 1958, atraiu o capital de grandes indústrias que passaram a funcionar no Pará. Em 1966 foi criada a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM), que criou incentivos fiscais para empresas nacionais e estrangeiras se instalarem na região. O resultado desse programa foi a criação da Zona Franca de Manaus, zona de livre comércio.


NOTAS:

¹ AMORIM, Antônia Terezinha dos Santos. A Dominação norte-americana no Tapajós – A Companhia FORD Industrial do Brasil. Câmara Municipal de Santarém, Santarém (PA), 1995, p. 44.
² Ibidem, p. 108.
³ FIGUEIREDO, Aguinaldo Nascimento. Manaus nos anos 40 (II): A Segunda Guerra Mundial. 24/10/2015. Disponível em: http://historiainte.blogspot.com.br/2015/10/manaus-nos-anos-40-ii-segunda-guerra.html Acesso em 17/03/2017.


CRÉDITO DA IMAGEM:

Colin Mcphearson/Corbis/Latinstock - Rede Brasil Atual