sábado, 9 de janeiro de 2016

Documento Histórico - História da Paróquia São Lázaro

São Lázaro de Betânia.

Quando comecei minhas pesquisas sobre a História do bairro, em 2011, tive acesso ao arquivo da Paróquia que, aliás, encontra-se muito bem preservado. Entre vários documentos, encontrei um bem interessante. Um texto, com o título História da Paróquia São Lázaro, de autor desconhecido, cobre, em 6 páginas, a evolução da paróquia do ano de 1956 até 1991.

Não se sabe o nome do autor, mas provavelmente pode ser uma ou mais pessoas ligadas à instituição Católica. Em linguagem simples, temos, no início do texto, uma apresentação sobre as origens do bairro, com a chegada dos primeiros moradores em 1956, e, de forma abrupta, passamos para a “História Paroquial” da comunidade. O autor (es) descreve detalhadamente os nomes dos primeiros moradores, datas e etapas de construção da Igreja no bairro e a relação da comunidade com outras que começavam a surgir nas imediações

Reproduzo o documento na íntegra, sem fazer maiores alterações, apenas algumas correções ortográficas:


HISTÓRIA DA PARÓQUIA SÃO LÁZARO


No ano de 1956, um pequeno grupo de pessoas, formando um povoado de mais ou menos dez casas de madeira e taipa, que viviam com um pequeno salário da venda de capim para casas de colchão, criaram a comunidade do Barro Vermelho, tendo à frente: Dona Maria Andrade (conhecida como D. Mariquinha); Dona Nair; Dona Antônia; Sr. José; Sr. Evilázio; Dona Raimunda; Sr. Hermógenes (de 70 anos, ainda morador do bairro), e outros.

Com a chegada de Carlos Viana, jovem idealista, fortificam-se os passos da caminhada da Igreja no bairro; e no dia 03 de maio de 1958, Pe. Paulino Lammeier celebra a primeira missa num tronco de marizeiro (onde hoje é o Seminário Cristo Sacerdote). Neste lugar fizeram uma capelinha coberta de palha, e depois construíram uma outra pequena e de madeira. No dia 09 de maio deste ano foram criados o grupo Apostolado da Oração, a Congregação Mariana e o grupo Filhas de Maria; e no dia 09 de novembro, funda-se o Clube da Boa Ação. No dia 11 de fevereiro de 1959, realizou-se a primeira Procissão de São Lázaro. Neste mesmo ano, no dia 31 de maio, inaugurou-se a 3° capela de São Lázaro, esta sendo maior que a anterior. A partir de 1960, a Igreja promovia concursos e arraiais para a animação da comunidade.

Em março de 1964, a pedido de D. João de Souza e Lima, vem as Irmãs do Colégio Santa Dorotéia: Irmã Maria do Carmo Peixoto; Irmã Souza; Irmã Rodrigues; Irmã Montenegro; Irmã Jovita (Peixotinho); e Irmã Macário; que vinham nos fins de semana com as meninas do colégio e catequizavam aos domingos no grupo escolar Antóvila Mourão Vieira; e com elas havia uma jovem catequista chamada Helena, moradora da comunidade. Elas vinham com Pe. Alcides, para celebrar a missa. Para melhor trabalhar, Irmã Peixoto, com a ajuda do SESI, das alunas e do grupo de jovens local, fez um levantamento das crianças da comunidade. Nesta época foi construída uma nova capela, em alvenaria; e deram início à construção de um barracão, feito em mutirão nos fins de semana e à noite, sendo todo o material doado. Nele era feito o trabalho prático do curso de pedreiro do SENAI, que realizava-se em São Lázaro. Sua inauguração foi no dia 01° de janeiro de 1966, com missa celebrada por D. João, e denominou-se Centro Social Educativo São Lázaro, onde formou-se um clube de mães, dava-se aulas e se faziam recreações. (Este barracão, hoje é a Igreja de São Lázaro). São Lázaro foi o primeiro serviço de mutirão e de trabalhos comunitários.

Em 1967, também em mutirão, construíram uma casa para acolher as irmãs nos fins de semana, e onde funcionava um pequeno ambulatório, para facilitar o trabalho das irmãs. Em 1968, Irmã Maria, Irmã Rodrigues e Irmã Gobites iniciam trabalhos de catequese no Crespo, iniciando assim a comunidade Bom Pastor. Lá, ficavam debaixo de uma figueira, conseguindo logo depois uma casa de madeira, onde celebravam com os padres salesianos, aos domingos após a catequese; celebravam também casamentos e batizados. Em dezembro de 1971, as irmãs Dorotéias foram morar na Betânia, e Pe. João Carlos Stefani assumiu as duas comunidades – São Lázaro e Betânia – que faziam parte da Paróquia Santa Luzia. Este ficou aí até o início de 1974.

Após dois anos de trabalho na comunidade Bom Pastor, chega o movimento industrial, e é desapropriada a casa. Nesta época veio como vigário Pe. José Montecone, que logo comprou um outro terreno e construiu uma capela ampla, inaugurada no dia 01° de janeiro de 1972, com celebração de missa – e neste mesmo ano, no dia 11 de abril, festejou-se o padroeiro Bom Pastor e a 1° Eucaristia de 25 crianças, além de alguns adultos. Por motivo de mal entendido foi demolida a capela e construída no lugar a escola Dorval Porto; logo foi conseguido um outro terreno e construída uma capela, inaugurada no dia 01° de julho de 1973. Nela havia missas aos domingos, confissão, batizados, assistência aos enfermos. Por um pequeno período, junto ao Pe. José, deu assistência ao Pe. José Fumagalle; depois, Pe. Dalbem, enquanto esperava-se um novo sacerdote; mas a comunidade ia crescendo como Igreja.

Neste mesmo ano, 1973, sentiu-se a necessidade de formar uma nova comunidade, na Lagoa Verde: Um senhor chamado Raimundo F. Da Costa falou com as irmãs Dorotéias, e estas começaram a incentivar nos círculos bíblicos da comunidade. Uma jovem chamada Clarinha rezava o terço na parte alta do bairro. Juntaram-se todos e construíram um salão, onde Pe. José Montecone celebrava missas. Com o tempo, a comunidade da Lagoa Verde foi crescendo e organizaram sua primeira Diretoria, a qual falou com D. João e ele comprou um galpão de madeira, que depois foi ampliado e transformado em um centro social, que mais tarde foi vendido, e logo comprado um outro, onde até hoje está a Igreja Cristo Rei. Dom Milton* gostou muito do local, e hospedou-se por três dias como visita pastoral.

No início de 1974, assumiu como vigário auxiliar, Pe. Durvalino Condicelle, que criou o grupo de jovens (OJAC), e organizou a diretoria como membros de Pastoral na comunidade Bom Pastor. Em 1976, Pe. Franco Picolly assumiu as comunidades e procurou dinamizar as pastorais existentes – em São Lázaro, implantou o dízimo e a Pastoral Familiar com o Grupo de Casais Amigos e incentivou a participar do CLC (Curso de Liderança Cristã) e do Congresso de Leigos do Amazonas. Organizou o catecumenato para o Batismo e a Crisma, reativou o Apostolado da Oração e criou o Conselho Comunitário de Pastoral; e no Bom Pastor, reforçou a Catequese com cursos, formando novos catequistas. Em fevereiro de 1977, para a comunidade Bom Pastor, vem Pe. Sabino Mariga, que dá continuação aos trabalhos já iniciados, e ainda fez um levantamento das famílias, visitando cada uma e falando sobre o dízimo, que com o auxílio de Frei Laurindo, pároco de Santa Rita, foi criado o Dízimo Paroquial nas duas comunidades. Pe. Sabino, auxiliado por seu sucessor, Pe. Carillo, deu início à ampliação da igreja, inaugurando no dia 09 de dezembro de 1979, com presença de Dom Milton Corrêa Pereira, Pe. Sabino e Pe. Carillo, que no ato recebeu o cargo de vigário destas comunidades – São Lázaro, Bom Pastor e Cristo Rei. Em 1980, Pe. Franco e Pe. Mário o auxiliaram nas comunidades; e o último doou para a comunidade Bom Pastor um belíssimo sacrário de metal como recordação da Igreja Mãe, Santa Luzia.

No dia 14 de outubro de 1980, D. Milton celebrou missa na Igreja São Lázaro, com presença das comunidades Bom Pastor e Cristo Rei, com a finalidade de apresentar Pe. Bernardino Micce, e advertir o povo de suas responsabilidades como Paróquia. No dia 04 de novembro houve reunião geral com as comunidades e neste mesmo dia, Pe. Bernardino celebrou sua 1° missa e continuou como pároco até 16 de agosto de 1981. No dia 19 de agosto do mesmo ano, D. Milton e D. Bêda concelebraram e apresentaram Pe. Ernesto Rodrigues à Paróquia, o qual celebrou sua primeira missa no dia 23 de agosto, mostrando suas perspectivas, e dar continuidade nas obras já idealizadas. Ele iniciou as construções de casas paroquiais em São Lázaro e Bom Pastor, e construiu novos altares nas mesmas; celebrou sua última missa no dia 11 de novembro de 1982. No dia 12 de novembro Frei Ricardo celebrou sua primeira missa. Ele criou vários grupos de Legião de Maria na Paróquia, tanto de adultos como juvenis; reviu os grupos existentes. Em 1984, para ajudá-lo, veio Pe. Elimar, celebrando sua primeira missa no dia 05 de fevereiro na comunidade Bom Pastor, e que muito colaborou na catequese desta comunidade, promovendo cursos, que depois se estendeu na Paróquia; ajudou muito a comunidade Cristo Rei; ficou aí até julho de 1985, sendo um verdadeiro missionário.

Com a vinda de Pe. Edimar, Frei Ricardo teve mais tempo disponível e, em maio de 1984, fez visitas a algumas famílias e juntos começaram a fazer círculos bíblicos e cultos dominicais, com o objetivo de organizar as CEB'S, conscientizando de seu valor, com a ajuda de José Moura, que em 18 de outubro convidou Sr. Alexandre para ajudá-lo nos encontros; e este, depois, tomou à frente o trabalho. Em dezembro do mesmo ano, fizeram a novena Natal em Família, com agradável receptividade, e estes encontros decidiram o local para a construção da casa comunitária. Em abril de 1985, realizou-se o 1° curso para pais e padrinhos para o batismo de 11 crianças. No dia 08 de maio, reuniram-se para escolher uma comissão administrativa para iniciar a construção da casa – também escolheram São Joaquim como padroeiro, pois tudo iniciou na Rua São Joaquim. Neste mesmo ano, do dia 26 de julho, dia de São Joaquim, houve celebração Eucarística no local da casa, com participação de 72 pessoas. No dia 11 de agosto teve início a construção e concluíram-na com doações e muitas promoções.

No final de novembro de 1985, a comunidade Bom Pastor junto do Frei Ricardo, organizou a novena Natal em Família na área do Igarapé do Quarenta, e as famílias mostraram-se interessadas em reunir-se como Igreja; e deram início a uma nova CEB, pela qual ficou responsável a Sr° Albanízia, membro do grupo Casais Amigos, da comunidade Bom Pastor; logo reuniram-se para decidir o padroeiro, sendo escolhido Menino Jesus, por estar perto do Natal. Nos encontros, a maioria dos presentes eram crianças. Para construir a capelinha, conseguiram muitas doações, e vários grupos foram formados: Catequese, Grupo de Jovens, Congregação Mariana; e havia missas ou cultos dominicais.

Em 1986, iniciou-se os trabalhos de Catequese em São Joaquim, feitos nas casas de algumas famílias, e formou-se um grupo de jovens, ajudados por pessoas das comunidades São Lázaro e Bom Pastor. Neste mesmo ano, um jovem da Paróquia, Gélio Oliveira Barbosa, entrou para o Seminário São José, da Arquidiocese, e dá muito impulso aos jovens da comunidade. Em 1987, Frei Ricardo nomeou uma Diretoria na comunidade Menino Jesus, a qual organizou a primeira Festa do padroeiro e depois disto organizou o Dízimo na comunidade. Frei Ricardo, ainda, promoveu o Planejamento Natural da Família; organizou cultos ecumênicos, cursos de noivas, cursos bíblicos e outros. Ele ficou na Paróquia até 30 de junho de 1987.

No dia 13 de março de 1988, chegam as Irmãs da Divina Providência, para trabalhar na Paróquia, estabelecendo-se na casa da comunidade Bom Pastor, que, com a saída de Frei Ricardo, tomam à frente da Paróquia. Em celebração Eucarística, no dia 03 de julho, Dom Clóvis Frainer apresentou Pe. Danival como pároco, e Irmã Nelcy como coordenadora Paroquial – e ainda Frei Plácido, Pe. Pier Paulo e Pe. Carillo, que celebrarão missas e atenderão os enfermos. Inicialmente foi organizado o Conselho Paroquial, para organizar uma Pastoral de conjunto. No dia 05 de julho, reuniu-se pela primeira vez a coordenação paroquial de catequese. No dia 06 de julho, fundou-se a Pastoral Operária na Paróquia. No dia 11 de julho iniciaram os encontros paroquiais de liturgia. No dia 15 de julho reuniu-se pela primeira vez a Pastoral do Dízimo da Paróquia. No dia 16 de julho reuniram-se os agentes da Pastoral do Batismo para se conhecer e reorganizar-se. No dia 17 de julho houve assembléia paroquial com todos os agentes de pastoral para estudar o objetivo e as diretrizes da Igreja de Manaus, para haver realmente uma Pastoral de conjunto na Paróquia; Neste encontro esteve presente Frei Xavier. Ainda, foram feitas assembleias comunitárias para uma melhor caminhada. No dia 03 de agosto, houve encontro dos Ministros da Eucaristia dos Enfermos e marcado um encontro para reciclagem de estudos. Em agosto, houve curso bíblico na paróquia, promovido pela Coordenação Paroquial da Pastoral de Juventude. Foi criado, em setembro, um grupo vocacional paroquial. Foram promovidos cursos, e em todas as comunidades, seus tradicionais arraiais e outras promoções. Foi criada a Pastoral da Criança. Houve retiro para alguns grupos: Catequese, Casais Amigos e Crismados. Em 1989, a partir de março, iniciou a Escola Catequética mensal para os catequistas. Também foi trocado o telhado da Igreja de São Lázaro. Neste mesmo ano, houve cursos da Pastoral Operária, de CEB'S, de Noivos e outros; e ainda, feitas assembleias de avaliação da II APA e preparação da III APA. Neste ano a Paróquia teve ajuda de seis seminaristas do Seminário Diocesano São José; e a alegria de mais um jovem, Luiz Mauro Alencar, sendo admitido no Seminário.

Neste ano de 1989, no dia 1° de julho, começou a construção do Seminário de Filosofia Cristo Sacerdote no terreno da Comunidade Paroquial. Dom Clóvis é o grande idealizador da obra e construiu para que os jovens tivessem um lugar adequado e decente, onde pudessem viver a vida fraterna, de estudos, de trabalhos e oração, e pudessem também servir às paróquias vizinhas. As obras foram concluídas em 15 de fevereiro de 1990 com a presença de D. Clóvis, os padres do Conselho Presbiteral, os Vigários Episcopais e todos os seminaristas dos Seminários Diocesanos.

No ano de 1990, no dia 11 de fevereiro, tomou posse o novo pároco, Pe. Mauro Cleto, que assumiu toda a Paróquia de São Lázaro e mais o Seminário Cristo Sacerdote. A pastoral Paroquial já estava em andamento, o pároco só continuou dando incentivos às pastorais, mas reprogramando para o ano de 1991, toda a estrutura pastoral paroquial.


*Milton Corrêa Pereira (Cametá, PA, 18 de novembro de 1919 – Manaus, AM, 23 de maio de 1984). Recebeu a ordenação presbiteral no dia 29 de junho de 1943, em Belém. Foi nomeado bispo auxiliar da Arquidiocese de Belém do Pará pelo Papa João XXIII, no dia 23 de agosto de 1962. Exerceu a função de 1962 a 1967. Em 4 de agosto de 1967, o Papa Paulo VI o nomeou bispo da Diocese de Garanhuns, no Pernambuco. Em 25 de abril de 1973 recebe a função de Arcebispo Coadjutor de Manaus. Foi Administrador Apostólico da arquidiocese entre 21 de abril de 1980 e 5 de março de 1981, quando foi nomeado pelo Papa João Paulo II para ser Arcebispo Metropolitano de Manaus. Faleceu em 23 de maio de 1984.

quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

2015: o Brasil, o Mundo e o Homem

Gravura de Flammarion (1888).

2015. Que ano estranho, puxado, de poucas risadas. Confesso que, desde 2012, não sinto mais uma "nostalgia" referente ao crescimento do país. Temos instalada uma crise política, que reflete de forma negativa em nossa economia. Aliás, percebemos aos poucos que, seja qual for a instituição, política ou religiosa, ela não é criada necessariamente para melhorar a vida das massas, mas sim para sustentar um número privilegiado de dirigentes, que as transformam em verdadeiras monarquias. Mas, claro, algumas pessoas se destacam na multidão e acabam fazendo a diferença.

Democracia ainda parece ser uma utopia, pois vemos diariamente como esse regime político é atacado. As disputas ideológicas entre esquerda e direita, que ganharam força neste ano, mostram como as pessoas não aceitam as diferenças de pensamento. Com um simples palavra, você se torna um "coxinha", como outra, um "comuna". “Posso não concordar com uma só palavra sua, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-la” - essa frase, erroneamente atribuída a Voltaire, não fez nenhum sentido esse ano.

“A História não é a mesma, mas temos a impressão de que, alguns eventos dela, se repetem”. Essa frase, do meu professor de Teoria da História, me fez pensar em alguns momentos trágicos que presenciamos no início e na metade de 2015. Grupos terroristas, em nome do Islã, promoveram inúmeros massacres no Oriente Médio e no Ocidente – e conseguiram dominar territórios em nome de uma nova unidade política. Parece que, assim como na Idade Média, o Islamismo está tentando novamente expandir suas fronteiras. Mas essa expansão não vai deixar um legado cultural como a do passado (língua, arquitetura, botânica, história e literatura), mas sim um rastro de ódio e medo.

Paz, um estado de espírito. O homem nunca esteve em paz com seu semelhante. Aliás, paz é uma fronteira fácil de se cruzar, e quando atravessada, chega à barbárie. Nem os deuses, nos tempos primordiais, viviam em harmonia. Resta a nós vigiar essa fronteira, tentar fortalecê-la a cada dia, não deixar os pilares de nossa civilização, erguidos sobre muitas vidas, sucumbirem por nossas próprias mãos.

Mesmo com todos os percalços, ainda somos seres incríveis. O hominídeo  que lascava pedras evoluiu, passou a polí-las, dominou os metais, criando instrumentos mais resistentes. Da observação das plantas, inventou a Agricultura. Dos excedentes de produção surgiu o escambo, antecessor do comércio. Do convívio com os animais, passou a domesticá-los. O nomadismo deu lugar ao sedentarismo, e as comunidades às cidades. Conquistamos territórios, descobrimos planetas, construímos tecnologias capazes de realizar tarefas inimagináveis. É a nossa essência inventiva, de quem luta diariamente pela sobrevivência.

Continuo aqui, de pé, esperando as horas para o adeus de 2015. O mundo não muda se seus habitantes não se candidatarem à mudança. Minhas crenças? Não são em um ou mais deuses. Vou seguir acreditando nas pessoas. Sonhador? Não, apenas mais um entre milhares que pensam da mesma forma, pois sabe que, no fundo, temos a capacidade de nos transformar para melhor. Que em 2016 aprendamos a conviver com diferentes formas de pensamento, sem delírios religiosos e que os dirigentes de fato passem a dirigir o nosso país para o futuro. Meus mais sinceros votos de paz e prosperidade para os leitores e leitoras do História Inteligente.




CRÉDITO DA IMAGEM:


http://cienciahoje.uol.com.br/colunas/fisica-sem-misterio

quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Historiadores Muçulmanos (séculos IX-XV)

Intelectuais do mundo muçulmano no legaram grandes conhecimentos, seja em Linguística, Botânica, Geografia, Medicina, Comércio etc. No campo historiográfico também foram produzidos trabalhos de excepcional qualidade. Os primeiros historiadores muçulmanos foram pioneiros na busca do tempo histórico.

Inicialmente, a historiografia muçulmana era formada por genealogias, poesias e relatos de batalhas, registrados por escrito ou oralmente. Esses historiadores começaram a busca histórica a partir do momento em se fez necessária a compilação das palavras e feitos de Maomé, principal profeta do Islamismo. Essas informações eram utilizadas para incrementar os hadiths, leis, histórias e ensinamentos desse profeta. As informações dos hadiths eram analisadas de forma crítica através do isnad, isto é, a credibilidade da sucessão de autoridades que os escreveram. Neste texto, apoiado sobre o livro A História dos Homens (2004), do historiador espanhol Josep Fontana, veremos três grandes historiadores muçulmanos: al-Tabari, al-Masudi e Ibn Jaldun.


al-Tabari (839-923).

al-Tabari, exegeta do Alcorão (Tafsir), é considerado o primeiro grande historiador muçulmano. Além de seus estudos sobre os hadiths e Comentário, sobre o Alcorão, escreveu História de profetas e de reis, que cobre o período da fundação do mundo muçulmano até o ano de 915 da nossa era. Bem estruturada cronologicamente, essa obra traz, sem alterações ou pontos de vista do autor, os testemunhos das autoridades muçulmanas. al-Tabari utilizou fontes escritas e também informações transmitidas oralmente. As narrativas contidas em História de profetas e de reis eram bem detalhadas, com ilustrações sobre os acontecimentos memoráveis e histórias agradáveis e instrutivas. Dessas narrativas também eram retirados ensinamentos morais e religiosos.

al-Masudi (896-956).

A historiografia do xiita al-Masudi era mais elaborada. Considerado o Heródoto Árabe, por seu interesse em outras áreas do conhecimento, como botânica, geografia e etnologia, teve uma educação de qualidade e viajou por várias partes do mundo conhecido na época. Escreveu Anales históricos, obra não mais existente e, sua Magnum Opus, Los prados de oro, uma enciclopédia sobre História Universal, carregada de descrições geográficas e culturais dos povos por ele conhecidos durante suas viagens. Quando recebe informações de terceiros, afirma aqueles que conheceram e viram os locais pessoalmente, possuem mais autoridade do que aqueles que permaneciam em seus locais de origem. Reproduz em sua obra textos antigos de escritores locais e informações recolhidas pessoalmente durante suas viagens.

Ibn Jaldun (1332-1406).

Ibn Jaldun foi um historiador completo, nos lembrando, em alguns aspectos, dos historiadores do antigo mundo grego. Tinha suas origens em uma família de classe baixa, oriunda de Andaluzia. Ascendeu servindo em cortes do mundo muçulmano, como no reino de Granada, e exercendo a função de juiz, no Egito. No Egito escreveu sua principal obra, Livro dos acontecimentos que servem de exemplo, cujo primeiro volume era o Discurso sobre a história universal. Jaldun planejava escrever uma história do mundo islâmico da África do Norte, mas, assim como muitos historiadores do mundo Ocidental, como Eusébio ou Beda, dedicou uma parte à história universal. Jaldun inova ao analisar a história universal de diferentes pontos de vista: A organização a partir dos aspectos sociológicos, políticos, religiosos, geográficos e econômicos.



FONTES:

FONTANA, Josep. A História dos Homens. Bauru, SP, EDUSC. Tradução de Heloísa Jochims Reichel e Marcelo Fernando da Costa, 2004.


ZAIDAN, Assaad. Letras & História: mil palavras árabes na Língua Portuguesa. Belém, PA, SECULT, 2005.


CRÉDITO DAS IMAGENS:


www.wikiwand.com
arabsinamerica.unc.edu
centroibnjaldun.com






terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Semelhanças e diferenças entre Eusébio, Gregório e Beda


Eusébio de Cesareia (263 d.C.-339 d.C.); Gregório de Tours (538 d.C.-594 d.C.); Beda, o Venerável (672 d.C.-735 d.C.).

Eusébio inaugura a História da Igreja Cristã, analisa a História universal sob a perspectiva das Sagradas Escrituras e tece uma linha sucessória dos bispados das principais sedes episcopais desde os tempos apostólicos. Gregório de Tours e Beda, também cristãos, escreveram uma História episcopal e mais local, referente aos seus locais de atuação (Gália e Britânia, respectivamente).

Eusébio escreveu uma crônica na qual comparava a história hebreia com a de outros povos. Gregório não dava muita importância para aspectos étnicos da Gália, fazendo apenas algumas digressões necessárias sobre os francos, que governaram a região. Beda apresenta, dentre os três, um maior interesse pelo etnográfico, descrevendo os diferentes povos que habitavam a Britânia, suas línguas e costumes.

Eusébio defendia, de forma parcial, o estabelecimento da ortodoxia e a unidade da Igreja, atacando judeus, pagãos e hereges. Gregório de Tours, ideologicamente, atacava os seguidores da heresia Ariana. Beda criticava, além dos monges irlandeses, a forma como o Cristianismo era praticado em sua terra, sem uma unidade ou cronologia (data fixa para a comemoração da Páscoa).

Quanto à língua, Eusébio escreveu em grego koiné, que mais tarde foi traduzido para o latim. Gregório escreve em um latim simplório, sem estilo e regras gramaticais. Beda, que escreve sobre sua terra natal, também usa o latim.

Eusébio foi considerado um historiador erudito, pois como fonte tinha uma incrível biblioteca composta de escritos do mundo antigo. Gregório não era um grande conhecedor das obras clássicas, mas teve contato com os escritos de Orósio e Eusébio. Beda tinha acesso à biblioteca do mosteiro de Wearmouth-Jarrow, que reunia em sua época um bom número de livros. Teve contato com os escritos de Orósio, Eusébio, Constâncio, Gildas e Gregório de Tours.

Eusébio escreveu em outro gênero, o martirológio (relato sobre os mártires, em especial a perseguição ocorrida em Cesareia). Gregório de Tours escreveu martirológios, biografias dos Patriarcas da Igreja, de São Martinho de Tours, e uma coletânea de Milagres. Sua obra parece ser de caráter homilético, isto é, voltada para a pregação religiosa. Beda escreve gêneros diversos, como a martirologia, hagiografia (estudo da biografia dos santos), cronologia, hinologia (estudo dos cânticos) e poesia.

Eusébio reúne Igreja e Império Romano em um só, pondo fim à ideia de cidade eterna que, dentro de um plano divino, tem um início e um fim determinados. O status de religião oficial do Império permitiu que sua historiografia dominasse por longos séculos o mundo Ocidental. Gregório, na posição de bispo de Tours, reporta-sse à Roma apenas em épocas de conclaves. Beda não possuía grande relação com a cidade de Roma, mas acreditava que o povo inglês era um povo escolhido, pois aquela região era alvo constante de tentativas de cristianização.

Eusébio tentou usar uma cronologia que, de alguma forma, se relacionasse com o relato bíblico. Na Gália, Gregório funde história secular e eclesiástica e, em determinado momento do livro, o vemos utilizando o ano de coroação dos reis como marco cronológico. Ainda assim, este escreve os fatos em ordem embaralhada e confusa. Beda, focado na história eclesiástica, cria a notação cronológica datando os fatos entre antes e depois de Cristo.

No campo social, Eusébio permitia que as personagens de sua obra, fossem eles bons ou maus, se defendessem, ou que, pelo menos, existissem com um nome ou data. Gregório não privilegia fatos ou classes sociais, desde que estas passem ensinamentos morais ou espirituais. Fala sobre reis, bispos, padres, escravos, impostores etc. Beda registra os exemplos notáveis de bondade e maldade. Critica a covardia, a inércia e a delinquência moral dos bretões.

Eusébio tem uma visão providencialista da História, isto é, com Deus como personagem principal e o homem como instrumento do criador. Gregório cria uma história cheia de anedotas e marcada pela curiosidade do social, do vívido em diferentes estratos sociais. Beda conclui sua história com a ideia de povo escolhido: os pictos e os irlandeses se converteram ao Cristianismo, com exceção dos bretões, que preservaram seus hábitos.

Eusébio descreve de forma pitoresca a “vingança de Deus” contra seus perseguidores. Gregório é detalhista, descreve cada ação e sentimentos de suas personagens, como se quisesse se comunicar com os leitores. Beda é autoridade tanto na forma da escrita quanto na apresentação das fontes. Sua obra tem um tom dramático, exemplificado quando este relata vividamente os embates entre cristãos e pagãos.



CRÉDITO DA IMAGEM:


http://congregalupino.blogspot.com.br/

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Gregório de Tours (obra, metodologia e linguagem)

Gravura reproduzindo a aparência de Gregório de Tours, 1835.

A História de mais de um século depois de Eusébio já tinha passado por algumas mudanças significativas. Ela tinha tornado-se universal e, ao mesmo tempo, particular e local. As obras históricas medievais começavam com um esboço de História Universal, que misturava fatos bíblicos com história antiga, extraída de Orósio ou de Santo Isidoro de Sevilha, e das cronologias bíblico-seculares de Eusébio. Após essa breve história universal tinha início a crônica contemporânea, focada no local de origem do escritor.

Era frequente o uso das crônicas dos papas, que abordavam questões locais ligadas ao bispado de Roma. O mundo medieval “recém-nascido” era politicamente fragmentado, tendo como único elo os concílios instalados em diferentes cidades e as alianças entre dinastias, possuía uma história basicamente local. O principal registro de informações era feito através da sucessão de papas, bispos e abades, além do ano litúrgico baseado no calendário lunar, que poderia trazer, vez ou outra, narrativas de breves fatos contemporâneos.

A Magnum Opus de Gregório de Tours são as Histórias, ou História dos francos, constituída de 10 livros. Apresenta, logo no primeiro livro, uma história universal, passando rapidamente para assuntos gerais da Gália após as invasões francas no século V e a uma crônica contemporânea local nos seis últimos livros. A história universal é bem detalhada, a história contemporânea é marcada pela personalidade do autor. O autor escreve em latim simplório, sem regras gramaticais.

Gregório não ordena sua obra com uma cronologia essencialmente cristã, que só viria a ser criada na Britânia, pelo Venerável Beda, misturando, dessa forma, história secular com história eclesiástica. Ele próprio afirma que os fatos escritos em seu livro estão em ordem confusa e embaralhada.

Seu livro, nomeado erroneamente de História dos Francos, nos dá ideia de que ele aborda intensamente esse tema. Mas sobre esse povo, Gregório fazia apenas as digressões necessárias, quase inevitáveis, pois estes governaram a Gália. Os aspectos étnicos da Gália pouco importavam para Gregório. Ele, por exemplo, não cita o fato de que essa região da Europa possuía duas línguas: o latim e o franco. Gregório não era um grande conhecedor de obras clássicas, mas teve contato com os escritos de Orósio e Eusébio.

Acredita-se que a obra de Gregório seja homilética, isto é, voltada para a pregação religiosa, já que suas outras obras são martirológios, biografias dos patriarcas da Igreja, do santo protetor de Tours, São Martinho, e uma coletânea de milagres. A literatura sobre os santos, que vai povoar um bom tempo a Idade Média, relatava o nascimento desses personagens, suas mortes honradas e, rapidamente, passavam para os milagres a eles atribuídos.

Para Gregório, qualquer fato, desde que passasse para seus leitores algum ensinamento moral ou espiritual, merecia ser narrado, não importando se fazia parte da vida pública ou privada. Em seu livro, os homens, sejam eles grandes ou pequenos, exprimem seus sentimentos de raiva, estupidez, vingança e teimosia. Até os santos são passíveis de mostrar seus sentimentos, sejam eles bons ou maus.

O fato mais histórico da obra de Gregório é a conversão de Clóvis, rei dos francos, ao Catolicismo. Essa conversão é comparada ao que aconteceu com Constantino em 312. A conversão de Constantino se tornou uma analogia. Gregório descreve o temperamento forte e violento de Clóvis, que não tinha pena para com seus inimigos. Os reis francos e seus feitos tornaram-se tema recorrente em suas histórias. As ações de Clóvis são justificadas por Gregório como sendo bem vistas por Deus, que possibilitava que Clóvis as fizesse. Ideologicamente, em sua obra vinham críticas ao Arianismo.

Gregório é considerado um exímio contador de histórias, pois traz em sua obra diferentes classes sociais da Gália: escravos, domésticos, artesãos, freiras rebeldes, impostores, reis francos, bêbados e até mesmo alguns bispos e padres. Os milagres também são bastante utilizados em sua obra, e Gregório, mesmo reconhecendo seu caráter divino, algumas vezes não consegue entendê-los. Em sua obra, são contemplados personagens grandes e pequenos, ações boas e más.

Através de sua escrita, Gregório consegue interagir com o leitor, pois este detalha minuciosamente as ações e os sentimentos de suas personagens. As anedotas são bastante utilizadas, detalhes sobre o ambiente, a trama de um assassinato, tudo descrito, menos a aparência física. Gregório é episódico demais, pouco interessado em generalizações e contextos, mas sua História se destaca por sua curiosidade pelas pessoas, a inserção em suas análises de camadas diversas da sociedade da Gália, algo ainda não visto até aquele momento.


FONTES:


BURROW, John. Uma História das Histórias - de Heródoto e Tucídides ao século XX. Rio de Janeiro/São Paulo, Record. Tradução de Nana Vaz de Castro, 2013.


CRÉDITO DA IMAGEM:


www.gravuras-antigas.com




Eusébio de Cesaréia (obras, metodologia e linguagem)

História Eclesiástica, a Magnum Opus de Eusébio. Editora Novo Século, 1999.

Eusébio, bispo de Cesareia, cidade da Palestina, é conhecido por ser o primeiro historiador a discorrer sobre a História da Igreja Cristã. Presenciou boa parte das perseguições aos cristãos, bem como a conversão do imperador Constantino ao Cristianismo. Eusébio foi herdeiro dos ensinamentos de Orígines de Alexandria, apologista grego pioneiro nas leituras simbólicas e tipológicas da Bíblia.

A leitura que Eusébio faz da História é providencialista, isto é, com Deus sendo o protagonista e sujeito da história, sendo o homem apenas um instrumento da força criadora. Sua obra mais conhecida, História Eclesiástica, abrange o período que vai do nascimento de Cristo até a época em que escrevia (320 da nossa era), foi escrita em grego koiné e traduzida mais tarde para o latim. Também escreveu Crônica, um resumo sobre a história dos povos da Antiguidade e dos romanos, sob a cronologia pagã e a hebreia. A obra tem caráter apologético, pois tenta mostrar que a religião dos hebreus é mais antiga que a de outros povos.

Eusébio também escreveu martirológio cristão, gênero que ganharia bastante popularidade no decorrer da expansão do Cristianismo. Esse gênero é um relato da perseguição aos cristãos ocorrida em Cesareia. Os mártires triunfavam na morte, em morrer sem renunciar sua fé. Eusébio descreve com detalhe essas cenas, que em certos casos lembravam das ações de alguns heróis do mundo pagão.

A História de Eusébio era inédita e polêmica. Atacava judeus, pagãos e hereges. Diferente da historiografia clássica, na qual percebemos a imparcialidade em suas obras, Eusébio deixava evidentes seus objetivos: estabelecer e defender a ortodoxia da Igreja. Ao mesmo tempo em que se distancia de alguns aspectos do rigor histórico clássico, a obra de Eusébio, uma defesa religiosa, é produzida através de uma minuciosa escolha e análise das fontes. Sua biblioteca, repleta de clássicos do mundo antigo, possibilitou a escrita de seu livro. Menos historiador que os historiadores clássicos, Eusébio era mais erudito – e mais parcial.

Antes de começar a registrar os fatos de seu tempo contemporâneo, Eusébio tece uma lista sucessória de bispados das principais sedes episcopais dos tempos apostólicos. Esse objetivo é nitidamente apresentado na introdução da obra, e consiste no principal pilar da ortodoxia católica. Outro interesse do autor é o estabelecimento e a justificativa do cânone que compõe as Sagradas Escrituras. Entre a encarnação de Cristo e a conversão de Constantino, são apresentadas na obra apenas os martírios e as renúncias de fé durante as perseguições.

Além do assunto, a originalidade encontrada na obra de Eusébio se refere ao fato de que este registra o que é certo e errado, o aprovável e o e reprovável, deixando que os virtuosos ou errantes justifiquem seus atos, ou que existam como nomes e datas. Boa parte das obras se constitui de citações.

Nos três últimos livros, dedicados aos mártires da Igreja, percebemos a mudança na abordagem de Eusébio, que perde seu caráter complacente e, tomado por uma eloquência religiosa, utilizando citações e alusões, contempla os castigos divinos contra os infiéis e falsos cristãos e da vitória final da Igreja. Descreve também, de forma pitoresca e bem detalhada, as doenças que afligiam aqueles que no passado perseguiram os cristãos. Gibbon afirma que Eusébio faz isso com “uma acuidade singular e aparente prazer”. Constantino, que se converteu ao Cristianismo e tornou essa a religião oficial do Império, é visto por Eusébio como um representante de Deus na terra, e em sua obra é citado sempre em analogia com personagens ou passagens bíblicas. Eusébio combina a redenção da Igreja com unificação do Império. Igreja e Império começavam a tornar-se um só e começava o fim da ideia de Roma como uma cidade eterna, pois para os cristãos existia um fim vindouro.

A oficialização do Cristianismo como religião do Império permitiu que a visão de História providencialista de Eusébio, com centro em Roma, perdurasse por muito tempo. A expressão Sacro Império Romano evidenciava a supremacia da historiografia cristã.

Vamos sintetizar as ideias da obra de Eusébio: visão providencialista, com Deus sendo o principal personagem histórico e o homem um instrumento do criador; Foi escrita em grego koiné, mais tarde traduzida para o latim; possui o gênero martirológico, que trata sobre as perseguições aos cristãos ocorridas em Cesaréia; é apologética, com a defesa da religião cristã; defende o estabelecimento da ortodoxia cristã, sendo uma obra parcial; uso recorrente de analogias e citações bíblicas ou de autores antigos e detalha de forma pitoresca os males que afligem os “inimigos”.



FONTES:


Eusébio de Cesaréia. Veritatis Splendor: Memória e Ortodoxia Cristãs. In: http://www.veritatis.com.br/patristica/biografias/392-eusebio-de-cesareia. Acesso em 14/12/2015.


BURROW, John. Uma História das Histórias - de Heródoto e Tucídides ao século XX. Rio de Janeiro/São Paulo, Record. Tradução de Nana Vaz de Castro, 2013.


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domingo, 13 de dezembro de 2015

Algumas características da Historiografia Cristã Tardia

Eusébio, bispo de Cesareia, pioneiro na história da Igreja Cristã.

A Historiografia do Mundo Clássico, ou Historiografia Pagã, e a Historiografia Cristã, entram em ruptura, guardando-se, no entanto, o latim, já com algumas mudanças, como língua utilizada para a produção escrita. Desde a conversão do imperador Constantino ao Cristianismo, em 312, e ao consequente fim das perseguições a essa religião, uma nova historiografia viria para suplantar a do mundo clássico.

Os historiadores cristãos "ignoravam" os autores clássicos, com algumas exceções, como Salústio, que trazia em sua obra a retórica moralizante; e Suetônio, como modelo para a produção de biografias. Em síntese, as obras clássicas serviam como fonte de anedotas, utilizadas como exemplos morais, adaptadas para milagres cristãos, largamente utilizados nessa nova historiografia.

Para os historiadores cristãos, era necessário inserir a história universal na perspectiva religiosa, a cristã. Para isso foi criada uma cronologia capaz de englobar, sob o relato bíblico, a história dos povos do Oriente Próximo e greco-romanos, a relação dos soberanos assírios ou egípcios, a periodização grega por olimpíadas ou a série dos magistrados romanos. O pioneiro nessa tarefa foi Eusébio, bispo de Cesareia, grego da palestina, autor da História Eclesiástica, primeira sobre a Igreja Cristã, que cobre o período que vai de Jesus Cristo a Constantino.

A Historiografia Cristã não busca a explicações para os fenômenos históricos na sociedade, nas causas naturais ou nas ações do indivíduos, mas em um determinismo divino, que já possui planejado o curso da História. Essa concepção de busca histórica era baseada na História desenvolvida por Santo Agostinho, em A Cidade de Deus e Confissões, onde contrasta a eternidade de Deus com o tempo. As ideias de Santo Agostinho entrariam na historiografia através de seu discípulo, Orósio, autor de Histórias contra os pagãos, livro no qual argumentava que a história era a ação da vontade de Deus na terra, com a premiação das virtudes e o castigo aos vícios, e, finalmente, o Juízo Final.

A veracidade dos fatos relatados pelos autores cristãos era um tema secundário, importando, de fato, o discurso moral e religioso. A história, para eles, servia não para compreender o mundo, mas sim como um preparo para o futuro que, segundo os planos divinos, terminaria com o Juízo Final. É linearidade histórica, com um início e fim determinados.

Voltando à cronologia, temos uma preocupação com a prática litúrgica, principalmente no que diz respeito à fixação de uma data para a comemoração da Páscoa, que daria início a outras festividades religiosas. Isso era um problema, pois, como foi dito, ainda existiam no mundo cristão sistemas de computo temporais oriundos do paganismo. Uma nova datação foi feita pelo abade Dionísio, que, analisando algumas tabelas da Páscoa, fixou como origem da era cristã o ano de 754 da fundação de Roma.

Nas tabelas pascais dos mosteiros, os monges começaram a anotar os acontecimentos mais importantes do ano, como tempestades, colheitas, mortes de pessoas importantes, fenômenos astronômicos; e também foram responsáveis por uma marcação mais exata das horas do dia. Nos séculos VI e IX, surgiriam no mundo bárbaro alguns historiadores cristãos. Entre os bárbaros destaca-se, por exemplo, Beda, o Venerável, monge da Britânia que, diferente de outros autores da época, não realizou uma história universal, mas sim uma História Eclesiástica da Inglaterra.

Portanto, podemos destacar como principais pontos da historiografia cristã: Rejeição pelos autores clássicos, aproveitando-se apenas destes alguns ensinamentos morais ou estilo literário; a História universal era vista e estudada sob a perspectiva bíblica; História com início e fim divinamente determinados; preocupação com os ensinamentos morais e religiosos, estando a veracidade dos fatos em plano secundário; e Cronologia ligada à liturgia.


FONTES:


FONTANA, Josep. A História dos Homens. Bauru, SP, EDUSC. Tradução de Heloísa Jochims Reichel e Marcelo Fernando da Costa, 2004.


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